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Quando a espiral de humilhações online sai do controlo

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    Nos seus primórdios, o Twitter era como
    um lugar de des-humilhação radical.
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    As pessoas confessavam segredos
    constrangedores sobre si mesmas,
  • 0:09 - 0:12
    e outras pessoas diziam:
    "Meu Deus, eu também sou assim!"
  • 0:13 - 0:17
    Pessoas sem voz perceberam
    que agora tinham uma voz,
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    e que ela era poderosa e eloquente.
  • 0:19 - 0:24
    Se um jornal publicava uma coluna
    racista ou homofóbica,
  • 0:24 - 0:26
    descobríamos que podíamos
    fazer algo a respeito.
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    Podíamos apanhá-los.
  • 0:28 - 0:31
    Podíamos atingi-los com uma arma
    que nós conhecíamos, mas eles não:
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    a humilhação nas redes sociais.
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    Os anunciantes acabavam
    por retirar os seus anúncios.
  • 0:37 - 0:40
    Quando as pessoas poderosas
    abusavam do seu privilégio,
  • 0:40 - 0:42
    nós íamos atrás delas.
  • 0:42 - 0:45
    Era uma espécie
    de democratização da justiça.
  • 0:45 - 0:48
    As hierarquias estavam a ser niveladas.
  • 0:48 - 0:50
    Nós íamos melhorar as coisas.
  • 0:51 - 0:55
    Depois disso, um desgraçado escritor
    de ciência popular chamado Jonah Lehrer
  • 0:55 - 0:58
    foi apanhado a fazer plágio
    e a falsificar citações,
  • 0:58 - 1:02
    e ficou cheio de vergonha
    e arrependimento, como me disse.
  • 1:02 - 1:03
    Teve a oportunidade
  • 1:03 - 1:07
    de fazer um pedido de desculpas público
    durante um almoço da fundação.
  • 1:08 - 1:10
    Este iria ser o discurso
    mais importante da sua vida.
  • 1:10 - 1:13
    Talvez até fosse a sua salvação.
  • 1:13 - 1:15
    Ele sabia, antes de chegar.
  • 1:15 - 1:18
    que a fundação ia transmitir
    o evento ao vivo,
  • 1:18 - 1:20
    mas o que ele não sabia, até lá chegar,
  • 1:20 - 1:24
    era que tinham colocado um ecrã gigante
    com o "feed" do Twitter ao seu lado.
  • 1:25 - 1:26
    (Risos)
  • 1:26 - 1:29
    E outro num monitor
    no seu campo de visão.
  • 1:29 - 1:32
    Eu acho que a fundação não fez isso
    por serem pessoas horríveis.
  • 1:32 - 1:35
    Acho que não tinham a menor ideia:
    acho que foi um momento único
  • 1:35 - 1:38
    em que a bela ingenuidade do Twitter
  • 1:38 - 1:42
    chocou com a nossa realidade
    cada vez mais horrível.
  • 1:42 - 1:45
    E aqui temos alguns "tweets" que
    apareciam no seu campo de visão,
  • 1:45 - 1:47
    enquanto ele tentava pedir desculpa:
  • 1:47 - 1:50
    "Jonah Lehrer, aborrecendo-nos
    para que o possamos perdoar"
  • 1:50 - 1:52
    (Risos)
  • 1:52 - 1:56
    E, "Jonah Lehrer ainda não provou
    que é capaz de sentir vergonha".
  • 1:57 - 2:00
    Este deve ter sido escrito pelo
    melhor psiquiatra de sempre,
  • 2:00 - 2:04
    por saber tanto sobre
    uma pequena figura atrás do púlpito.
  • 2:04 - 2:08
    E, "Jonah Lehrer é apenas
    um maldito sociopata."
  • 2:08 - 2:13
    Este último é tipicamente humano:
    desumanizar as pessoas que magoamos.
  • 2:13 - 2:18
    Porque queremos destruir as pessoas,
    mas sem nos sentirmos mal por isso.
  • 2:19 - 2:22
    Imaginem que isto era um tribunal,
  • 2:21 - 2:24
    e o acusado estava às escuras
    a suplicar por uma nova oportunidade
  • 2:24 - 2:26
    e o júri gritava:
  • 2:26 - 2:28
    "Chato! Sociopata!"
  • 2:28 - 2:30
    (Risos)
  • 2:30 - 2:33
    Sabem, quando vemos dramas,
    tendemos a identificarmo-nos
  • 2:33 - 2:36
    com o advogado de defesa bonzinho,
  • 2:36 - 2:39
    mas deem-nos o poder,
    e tornamo-nos em juízes ferozes.
  • 2:40 - 2:42
    O poder muda depressa.
  • 2:42 - 2:47
    Estávamos a perseguir o Jonah
    por ter abusado do seu privilégio,
  • 2:47 - 2:50
    mas o Jonah já estava no chão,
    e nós continuávamos a pontapeá-lo,
  • 2:50 - 2:54
    e a congratularmo-nos por o esmurrarmos.
  • 2:54 - 2:59
    E começou a ficar estranho e chato
    quando não havia uma pessoa poderosa
  • 2:58 - 3:01
    que tivesse abusado dos seus privilégios
    para podermos perseguir.
  • 3:01 - 3:04
    Um dia sem envergonharmos ninguém
  • 3:04 - 3:08
    começava a ser um dia sem graça,
    muito aborrecido.
  • 3:09 - 3:11
    Deixem-me contar-vos uma história.
  • 3:12 - 3:14
    É sobre uma mulher
    chamada Justine Sacco.
  • 3:15 - 3:19
    Era relações-públicas de Nova Yorque
    com 170 seguidores no Twitter
  • 3:19 - 3:22
    e escrevia umas piadas
    para os seus seguidores,
  • 3:22 - 3:25
    como esta num avião
    de Nova Iorque para Londres:
  • 3:25 - 3:29
    ["Alemão Esquisito: Estás em 1ª classe.
    É 2014. Usa algum desodorizante!"
  • 3:29 - 3:32
    ["Monólogo interior enquanto respira BO.
    Benditos fármacos.]
  • 3:32 - 3:35
    A Justine riu-se sozinha e carregou
    em enviar, não teve resposta,
  • 3:35 - 3:38
    e sentiu aquela tristeza
    que todos nós sentimos
  • 3:38 - 3:41
    quando a Internet não nos congratula
    por sermos engraçados.
  • 3:41 - 3:42
    (Risos)
  • 3:43 - 3:46
    Silêncio negro quando a Internet
    não nos responde.
  • 3:46 - 3:49
    Depois, quando chegou a Heathrow,
    e teve um tempinho livre
  • 3:49 - 3:54
    antes do seu último voo,
    ela pensou numa outra piada amarga:
  • 3:54 - 3:58
    [Indo para a África. Espero não apanhar
    SIDA. Estou a brincar. Sou branca!]
  • 3:58 - 4:04
    Riu-se, carregou em enviar,
    entrou no avião, não obteve resposta,
  • 4:05 - 4:07
    desligou o telemóvel, e adormeceu,
  • 4:07 - 4:09
    acordou 11 horas depois,
  • 4:09 - 4:13
    ligou o telemóvel enquanto o avião
    andava na pista
  • 4:13 - 4:15
    e imediatamente havia
    uma mensagem de alguém
  • 4:15 - 4:18
    com quem ela não falava
    desde o secundário, que dizia:
  • 4:19 - 4:22
    "Estou chocada ao ver
    o que está a acontecer contigo".
  • 4:23 - 4:26
    Então uma outra mensagem
    do melhor amigo:
  • 4:26 - 4:28
    "Tens de me ligar imediatamente.
  • 4:29 - 4:32
    "Tu és o número um
    de partilhas no Twitter."
  • 4:33 - 4:34
    (Risos)
  • 4:34 - 4:38
    O que aconteceu foi que um dos seus
    170 seguidores mandou o "tweet"
  • 4:38 - 4:43
    para um jornalista do Gawker, e este
    partilhou com os seus 15 mil seguidores:
  • 4:44 - 4:46
    [E agora, uma piada da
    relações-públicas do IAC]
  • 4:46 - 4:48
    E depois foi como um trovão.
  • 4:48 - 4:50
    Algumas semanas depois,
    conversei com o jornalista.
  • 4:50 - 4:54
    Num e-mail, perguntei-lhe qual tinha sido
    a sensação, e ele disse: "Deliciosa".
  • 4:54 - 4:57
    E acrescentou: "Mas tenho
    a certeza de que ela está bem".
  • 4:58 - 5:01
    Mas ela não estava nada bem,
    porque, enquanto dormia,
  • 5:01 - 5:06
    o Twitter tomou controlo da sua vida
    e desmontou-a pedaço a pedaço.
  • 5:07 - 5:09
    Primeiro vieram os filantropos:
  • 5:10 - 5:12
    [Se a piada infeliz de @JustineSacco
    te incomodou,
  • 5:12 - 5:14
    [junta-te a mim a dar apoio
    à @CARE em África.]
  • 5:14 - 5:18
    [Em face ao... repugnante tweet racista,
    hoje estou a doar para a @care]
  • 5:18 - 5:20
    Depois vieram os superchocados:
  • 5:20 - 5:23
    [...sem palavras para este tweet
    racista horrível de Justine Sacco.
  • 5:23 - 5:24
    [Estou mais que chocado.]
  • 5:24 - 5:27
    Alguém aqui esteve no Twitter
    naquela noite? Alguns.
  • 5:27 - 5:31
    A piada de Justine encheu o "feed"
    do vosso Twitter como fez com o meu?
  • 5:31 - 5:34
    Encheu o meu, e pensei o que
    toda a gente pensou naquela noite:
  • 5:35 - 5:37
    "Uau, alguém fez asneira!
  • 5:37 - 5:39
    "A vida de alguém está
    prestes a ficar horrível!"
  • 5:39 - 5:41
    E sentei-me na minha cama,
  • 5:41 - 5:44
    pus a almofada atrás da cabeça,
    e depois pensei:
  • 5:45 - 5:48
    Não sei se a intenção
    da piada era ser racista.
  • 5:48 - 5:51
    Talvez, em vez de alegremente
    ostentar o seu privilégio,
  • 5:51 - 5:55
    ela estivesse a gozar com
    a ostentação do privilégio.
  • 5:54 - 5:56
    Há uma tradição cómica deste tipo,
  • 5:56 - 5:59
    como em South Park
    ou Colbert, ou Randy Newman.
  • 6:00 - 6:04
    Talvez o crime da Justine tenha sido
    não ser tão boa quanto o Randy Newman.
  • 6:04 - 6:07
    De facto, quando conheci a Justine
    umas semanas depois num bar
  • 6:07 - 6:10
    ela estava simplesmente destruída.
  • 6:10 - 6:12
    Pedi-lhe então para explicar a piada
    e ela disse:
  • 6:13 - 6:15
    "Morar nos EUA coloca-nos numa bolha
  • 6:15 - 6:18
    "quando se trata do que acontece
    no Terceiro Mundo.
  • 6:18 - 6:20
    "Eu estava a gozar com essa bolha".
  • 6:21 - 6:25
    Naquela noite no Twitter, Helen Lewis,
    redatora do "New Statesman",
  • 6:25 - 6:28
    e revisora do meu livro sobre humilhação
    pública, escreveu que "tweetou" assim:
  • 6:28 - 6:32
    "Não tenho a certeza de que a piada
    tivesse a intenção de ser racista",
  • 6:32 - 6:35
    e imediatamente choveram
    "tweets" furiosos a dizer:
  • 6:35 - 6:37
    "Tu também não passas
    de uma cabra privilegiada."
  • 6:37 - 6:39
    E, para sua vergonha
    — ela escreveu isso —
  • 6:39 - 6:44
    calou a boca e assistiu à vida
    de Justine a ser destruída.
  • 6:46 - 6:48
    E a coisa começou a ficar mais feia:
  • 6:48 - 6:50
    [Que toda a gente denuncie
    esta puta @JustineSacco].
  • 6:50 - 6:53
    Depois vieram os pedidos
    para ela ser despedida.
  • 6:53 - 6:56
    [Boa sorte em achar emprego
    no novo ano. #SendoDespedida].
  • 6:56 - 6:58
    Milhares de pessoas de todo o mundo
  • 6:58 - 7:01
    decidiram que era o seu dever
    fazê-la ser demitida.
  • 7:01 - 7:05
    [@JustineSacco último tweet
    da tua carreira. #ComPenaSemPena.]
  • 7:05 - 7:08
    Envolveram-se empresas, na esperança
    de vender os seus produtos
  • 7:08 - 7:11
    à custa da aniquilação de Justine:
  • 7:11 - 7:14
    [Da próxima vez que desejar tweetar
    algo estúpido antes de descolar,
  • 7:14 - 7:17
    [assegure-se de que está
    num @voo da Gogo!]
  • 7:17 - 7:18
    (Risos)
  • 7:19 - 7:21
    Muitas empresas ganharam
    bom dinheiro naquela noite.
  • 7:21 - 7:25
    Normalmente o nome de Justine era
    pesquisado no Google 40 vezes por mês.
  • 7:25 - 7:28
    Naquele mês, entre dia 20 de dezembro
    e o fim de dezembro,
  • 7:29 - 7:34
    o seu nome foi pesquisado
    1 220 000 vezes.
  • 7:34 - 7:37
    Um economista da Internet disse-me
    que a Google, provavelmente,
  • 7:37 - 7:42
    ganhou algo entre os 120 mil
    e os 468 mil dólares
  • 7:42 - 7:44
    com a aniquilação de Justine,
  • 7:44 - 7:48
    enquanto nós, os causadores reais
    da humilhação, não ganhámos nada.
  • 7:48 - 7:49
    (Risos)
  • 7:49 - 7:53
    Parecíamos estagiários da humilhação,
    não remunerados, da Google.
  • 7:53 - 7:55
    (Risos)
  • 7:56 - 7:58
    Depois vieram os "trolls":
  • 7:58 - 8:01
    [Estou mesmo à espera que
    Justine Sacco apanhe sida? lol]
  • 8:01 - 8:02
    Uma outra pessoa escreveu,
  • 8:02 - 8:05
    "Um seropositivo devia violar esta cabra
  • 8:05 - 8:07
    "para sabermos se a cor da pele
    a protege da SIDA".
  • 8:08 - 8:10
    E esta pessoa safou-se.
  • 8:10 - 8:12
    Ninguém foi atrás desta pessoa.
  • 8:12 - 8:15
    Estávamos todos tão eufóricos
    a destruir a Justine,
  • 8:15 - 8:18
    com os nossos cérebros
    humilhadores tão focados
  • 8:18 - 8:20
    que não conseguíamos
    também destruir alguém
  • 8:20 - 8:23
    que estava a destruir Justine
    de modo inapropriado.
  • 8:24 - 8:27
    A Justine estava realmente a unir
    muitos grupos distintos naquela noite,
  • 8:27 - 8:30
    de filantropos a "violem esta cabra".
  • 8:31 - 8:34
    [@JustineSacco espero que sejas
    despedida! Sua cabra demente...
  • 8:35 - 8:38
    [Deixa só o mundo saber que tu planeias
    fazer sexo desprotegido em África.]
  • 8:38 - 8:40
    Com as mulheres é sempre pior.
  • 8:40 - 8:43
    Quando se humilha um homem, é,
    "Vou fazer-te perder o emprego".
  • 8:43 - 8:45
    Quando uma mulher é humilhada, é,
  • 8:45 - 8:50
    "Vou te fazer perder o emprego, ser
    violada e tirar-te o útero".
  • 8:50 - 8:52
    E os patrões de Justine envolveram-se:
  • 8:52 - 8:56
    [IAC sobre o tweet de @JustineSacco:
    Comentário revoltante e ofensivo.
  • 8:56 - 8:58
    [Referida funcionária de momento
    inacessível em voo.]
  • 8:58 - 9:00
    E foi aí que a raiva
    se tornou euforia:
  • 9:00 - 9:03
    [Tudo o que quero neste Natal
    é ver a cara da @JustineSacco
  • 9:03 - 9:06
    [quando o avião aterrar e ela vir
    as mensagens. #despedida]
  • 9:06 - 9:09
    [Oh meu, @justinesacco vai ter
    a mais dolorosa hora
  • 9:09 - 9:11
    [ao ligar o telemóvel
    quando o avião aterrar]
  • 9:11 - 9:14
    [Estamos prestes a ver a @JustineSacco
    ser despedida. Ao VIVO.
  • 9:14 - 9:16
    [Antes de ela SABER
    que vai ser despedida.]
  • 9:16 - 9:18
    Tivemos aqui um delicioso arco narrativo.
  • 9:18 - 9:20
    Sabíamos algo que a Justine não sabia.
  • 9:20 - 9:23
    Conseguem imaginar algo
    menos imparcial que isto?
  • 9:23 - 9:26
    A Justine estava a dormir num avião,
    impossibilitada de se explicar,
  • 9:26 - 9:30
    e isso foi responsável por grande
    parte da graça da coisa toda.
  • 9:31 - 9:35
    Naquela noite no Twitter éramos como
    crianças a brincar com uma arma.
  • 9:36 - 9:39
    Descobriram o voo exato
    em que ela ia e colocaram uma ligação
  • 9:39 - 9:41
    para um sítio de rastreamento de voos.
  • 9:42 - 9:45
    [Voo da British Airways nº 43.
    Chega em 1 hora e 34 min.]
  • 9:45 - 9:47
    Uma "hashtag" espalhou-se pelo mundo:
  • 9:47 - 9:49
    #aJustineJáAterrou?
  • 9:49 - 9:51
    [É meio louco ver alguém autodestruir-se
  • 9:51 - 9:53
    [e nem fazer ideia disso.
    #aJustineJáAterrou?]
  • 9:53 - 9:57
    [A sério. Eu quero ir para casa dormir,
    mas toda a gente no bar
  • 9:57 - 10:00
    [está obcecada com #aJustineJáAterrou?
    Não dá para ir embora.]
  • 10:00 - 10:04
    [#aJustineJáAterrou? é a melhor coisa
    que aconteceu à minha sexta-feira.]
  • 10:03 - 10:06
    [Alguém da Cidade do Cabo vai
    ao aeroporto twittar a chegada dela?
  • 10:06 - 10:08
    [Vá lá Twitter! Queremos fotos!]
  • 10:08 - 10:09
    E adivinhem? Havia fotos.
  • 10:09 - 10:12
    [@JustineSacco ATERROU mesmo
    na Cidade do Cabo.]
  • 10:12 - 10:14
    E, se quiserem saber como é descobrir
  • 10:14 - 10:17
    que acabaram de ser destruídos
    por uma piada liberal mal-interpretada,
  • 10:18 - 10:21
    não por "trolls",
    mas por boas pessoas como nós,
  • 10:21 - 10:23
    é assim:
  • 10:23 - 10:26
    [... Ela decidiu usar
    óculos de sol para disfarçar.]
  • 10:26 - 10:28
    Afinal, porque fizemos isto?
  • 10:28 - 10:31
    Acho que algumas pessoas
    estavam genuinamente chateadas,
  • 10:31 - 10:33
    mas penso que, para outras,
  • 10:33 - 10:36
    é porque o Twitter é basicamente
    uma máquina de aprovação mútua.
  • 10:36 - 10:38
    Cercamo-nos de pessoas
    que se sentem como nós,
  • 10:38 - 10:40
    validamo-nos uns aos outros,
  • 10:40 - 10:42
    e é uma sensação realmente boa.
  • 10:42 - 10:44
    E, se alguém se meter no nosso
    caminho, nós eliminamo-lo.
  • 10:44 - 10:46
    E sabem qual é o oposto disto?
  • 10:46 - 10:48
    O oposto disto é a democracia.
  • 10:48 - 10:53
    Queríamos mostrar que nos importamos
    com quem morre de SIDA em África.
  • 10:53 - 10:55
    O nosso desejo de sermos vistos
    como compassivos
  • 10:55 - 11:00
    é o que nos leva a cometer estes atos
    sem qualquer compaixão.
  • 11:00 - 11:03
    Como Meghan O'Gieblyn
    escreveu no "Boston Review":
  • 11:03 - 11:07
    "Isto não é justiça social.
    É uma alternativa catártica".
  • 11:08 - 11:09
    Nos últimos três anos,
  • 11:09 - 11:12
    tenho viajado pelo mundo conhecendo
    pessoas como Justine Sacco
  • 11:12 - 11:15
    e, acreditem, existem muitas
    pessoas como a Justine Sacco.
  • 11:15 - 11:17
    Há mais gente a cada dia.
  • 11:17 - 11:20
    E queremos pensar que elas
    estão bem, mas não estão.
  • 11:20 - 11:22
    As pessoas que conheci estavam destruídas.
  • 11:22 - 11:24
    Falaram-me de depressão,
  • 11:24 - 11:28
    de ansiedade, de insónias
    e de pensamentos suicidas.
  • 11:28 - 11:33
    Conversei com uma mulher que,
    por causa de uma piada que caiu mal,
  • 11:33 - 11:35
    passou um ano e meio dentro de casa.
  • 11:35 - 11:40
    Antes disto, trabalhava com adultos
    com dificuldades de aprendizagem,
  • 11:40 - 11:43
    e aparentemente era boa no que fazia.
  • 11:43 - 11:47
    Claro, Justine foi despedida porque
    as redes sociais assim o exigiram.
  • 11:48 - 11:49
    Mas foi pior que isso.
  • 11:49 - 11:51
    Ela começou a perder-se a si mesma.
  • 11:51 - 11:55
    Ela acordava no meio da noite
    sem saber quem era.
  • 11:56 - 12:00
    Foi perseguida por acharem que
    estava a abusar do seu privilégio.
  • 12:00 - 12:04
    E, é claro, é muito melhor perseguir
    as pessoas por isso do que por coisas
  • 12:04 - 12:07
    como ter filhos fora do casamento,
    como costumávamos fazer.
  • 12:07 - 12:10
    Mas o "abuso do privilégio"
    está a tornar-se num livre-trânsito
  • 12:10 - 12:13
    para destruir quase qualquer
    um que decidamos destruir.
  • 12:13 - 12:15
    Está-se a tornar um termo vulgar,
  • 12:16 - 12:19
    e a fazer-nos perder
    a nossa capacidade de ter empatia
  • 12:19 - 12:23
    e de distinguir entre
    transgressões graves e leves.
  • 12:24 - 12:28
    Justine tinha 170 seguidores no Twitter
    e, para fazer isto funcionar,
  • 12:28 - 12:30
    ela tinha de passar a ser uma ficção.
  • 12:31 - 12:35
    Havia o boato de que era filha
    do multimilionário Desmond Sacco.
  • 12:35 - 12:38
    [Não se enganem com a #JustineSacco
    o pai dela é multimilionário.
  • 12:38 - 12:40
    [Ela não está arrependida.
    Nem o pai dela.]
  • 12:40 - 12:42
    Eu pensava que era verdade,
  • 12:42 - 12:45
    até a encontrar num bar
    e perguntar pelo pai multimilionário,
  • 12:45 - 12:47
    e ela disse: "O meu pai vende carpetes".
  • 12:47 - 12:50
    Penso nos primeiros dias do Twitter,
  • 12:50 - 12:53
    quando as pessoas confessavam
    segredos constrangedores,
  • 12:53 - 12:55
    e as outras pessoas diziam:
    "Meu Deus, eu também sou assim!".
  • 12:56 - 13:00
    Hoje em dia, a caça é pelos segredos
    constrangedores das pessoas.
  • 13:00 - 13:02
    Podem levar uma vida boa, com ética,
  • 13:02 - 13:06
    mas uma frase infeliz no Twitter
    pode acabar com tudo,
  • 13:06 - 13:10
    e tornar-se numa prova
    de um secreto demónio interior.
  • 13:10 - 13:12
    Talvez haja dois tipos
    de pessoas no mundo:
  • 13:12 - 13:16
    aquelas que preferem
    os seres humanos à ideologia,
  • 13:16 - 13:19
    e aquelas que preferem
    a ideologia aos seres humanos.
  • 13:19 - 13:22
    Eu prefiro os seres humanos à ideologia,
  • 13:22 - 13:25
    mas, agora, os ideólogos estão a ganhar,
  • 13:25 - 13:29
    e eles estão a criar um palco
    para altos dramas artificiais,
  • 13:29 - 13:32
    onde todos se tornam
    ou num herói magnífico
  • 13:32 - 13:33
    ou num vilão doentio,
  • 13:33 - 13:37
    mesmo quando sabemos que os nossos
    companheiros humanos não são assim.
  • 13:37 - 13:40
    A verdade é que somos
    inteligentes e burros;
  • 13:40 - 13:44
    a verdade é que temos áreas cinzentas.
  • 13:44 - 13:48
    O melhor das redes sociais
    foi ter dado voz às pessoas sem voz,
  • 13:48 - 13:51
    mas agora estamos a criar
    uma sociedade de patrulha,
  • 13:51 - 13:55
    em que a forma mais inteligente
    de sobreviver é voltar a não ter voz.
  • 13:55 - 13:57
    Não façamos isso.
  • 13:58 - 13:58
    Obrigado.
  • 13:58 - 14:01
    (Aplausos)
  • 14:09 - 14:11
    Bruno Giussani: Obrigado, Jon.
  • 14:11 - 14:12
    Jon Ronson: Obrigado, Bruno.
  • 14:12 - 14:14
    BG: Não te vás embora.
  • 14:15 - 14:17
    O que me impressiona
    na história da Justine
  • 14:17 - 14:19
    é que, se hoje procurarmos
    o nome dela no Google,
  • 14:19 - 14:22
    esta história aparece nas primeiras
    100 páginas de resultados
  • 14:22 - 14:24
    e não há mais nada sobre ela.
  • 14:24 - 14:27
    No teu livro, mencionas outro caso
  • 14:27 - 14:31
    de uma outra vítima, que acabou
    por contratar uma consultora de imagem,
  • 14:31 - 14:37
    e que ao criar blogs e postar histórias
    inocentes sobre o seu amor por gatos
  • 14:37 - 14:39
    e férias, e tal,
    conseguiram tirar a história
  • 14:39 - 14:43
    das duas primeiras páginas de resultados
    do Google, mas isto não durou muito.
  • 14:44 - 14:48
    Duas semanas depois, o caso começou
    a voltar ao topo dos resultados.
  • 14:48 - 14:50
    Será que é uma batalha perdida?
  • 14:50 - 14:53
    Jon Ronson: Penso que o melhor
    que podemos fazer,
  • 14:53 - 14:58
    quando vemos qualquer coisa
    injusta ou uma humilhação ambígua,
  • 14:58 - 15:01
    é falar, pois acho que a pior
    coisa que aconteceu com a Justine
  • 15:01 - 15:04
    foi que ninguém a apoiou
    — toda a gente estava contra ela,
  • 15:04 - 15:06
    e isto é profundamente traumatizante
  • 15:06 - 15:10
    ouvir de dezenas de milhares de pessoas
    que tu tens de te ir embora.
  • 15:10 - 15:14
    Mas, se acontece uma humilhação
    e se levantam vozes, como numa democracia,
  • 15:14 - 15:17
    em que as pessoas discutem,
    acho que é muito menos nocivo.
  • 15:17 - 15:19
    Penso que seja este o caminho,
  • 15:19 - 15:21
    mas é difícil, pois,
    se começamos a defender alguém,
  • 15:22 - 15:23
    é incrivelmente desagradável.
  • 15:23 - 15:26
    BG: Conta-nos a tua experiência,
  • 15:25 - 15:27
    pois foi o que fizeste
    ao escrever este livro.
  • 15:27 - 15:30
    Já agora, é leitura obrigatória
    para toda a gente, ok?
  • 15:30 - 15:34
    Defendeste as pessoas, pois o livro
    põe quem humilha no centro das atenções.
  • 15:34 - 15:37
    E suponho que as reações no Twitter
    não sejam apenas positivas.
  • 15:37 - 15:40
    JR: É, não caiu muito bem
    com algumas pessoas.
  • 15:40 - 15:41
    (Risos)
  • 15:41 - 15:43
    Quero dizer, não nos vamos
    focar só nisto,
  • 15:43 - 15:46
    pois muita gente percebeu,
    e foram muito simpáticas sobre o livro.
  • 15:46 - 15:50
    Mas, sim, há 30 anos que escrevo
    histórias sobre abusos de poder,
  • 15:50 - 15:53
    e, quando falo dos poderosos
    do meio militar
  • 15:53 - 15:56
    ou da indústria farmacêutica,
    toda a gente bate palmas.
  • 15:57 - 16:00
    Mas basta eu dizer: "Agora nós somos
    os poderosos a abusar do poder",
  • 16:00 - 16:03
    vem gente dizer:
    "Ah, tu também deves ser racista."
  • 16:03 - 16:06
    BG: Ontem, estávamos a jantar,
  • 16:06 - 16:08
    e estavam a ocorrer duas discussões.
  • 16:08 - 16:11
    Numa, conversavas
    com as pessoas à mesa,
  • 16:11 - 16:13
    e a discussão foi ótima, construtiva.
  • 16:13 - 16:15
    Na outra, sempre que olhavas
    para o telefone,
  • 16:15 - 16:17
    havia uma enxurrada de insultos.
  • 16:17 - 16:20
    JR: Sim. Isso aconteceu ontem à noite.
    Tivemos um jantar do TED.
  • 16:20 - 16:24
    Estávamos a conversar e decidi ver
    o que se passava no Twitter.
  • 16:24 - 16:26
    Alguém disse:
    "Tu és um branco supremacista."
  • 16:26 - 16:29
    Então voltei para a mesa e tive
    uma conversa ótima com alguém,
  • 16:29 - 16:31
    e depois voltei ao Twitter.
  • 16:31 - 16:34
    Alguém dizia que a minha existência
    fazia do mundo um lugar pior.
  • 16:34 - 16:37
    O meu amigo Adam Curtis diz
  • 16:37 - 16:41
    que talvez a Internet seja como um filme
    do John Carpenter dos anos 80,
  • 16:41 - 16:44
    em que toda a gente vai acabar
    a gritar com toda a gente,
  • 16:44 - 16:46
    e a disparar uns contra os outros,
  • 16:46 - 16:48
    e todos vão acabar por fugir
    para um lugar mais seguro,
  • 16:48 - 16:52
    e estou a começar a achar que
    esta é uma opção realmente boa.
  • 16:52 - 16:54
    BG: Jon, obrigado.
    JR: Obrigado, Bruno.
  • 16:54 - 16:57
    (Aplausos)
Title:
Quando a espiral de humilhações online sai do controlo
Speaker:
Jon Ronson
Description:

O Twitter dá uma voz a quem não a tem, uma maneira de falar e de reagir à injustiça percebida. Mas às vezes, diz Jon Ronson, as coisas vão longe demais. Numa história de como um "tweet" sem piada arruinou a vida e a carreira de uma mulher, Ronson mostra como os comentadores online podem acabar por se comportar como uma multidão enfurecida — e diz que é hora de repensar a forma como interagimos online.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
18:16

Portuguese subtitles

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