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E se vivêssemos sem dinheiro? | Benjamin Lesage | TEDxBordeaux

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    E se vivêssemos sem dinheiro?
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    E se pudéssemos, por um golpe de magia,
    suprimir a moeda,
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    viver num mundo em que partilhássemos
    os recursos que a Terra nos dá?
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    Gostariam disso?
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    Público: Sim.
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    Sentem-se tentados?
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    Comecei a fazer esta pergunta
    nos Países Baixos.
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    Estava a estudar "marketing"
    na Universidade de Haia.
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    Do "marketing" até à ideia de viver
    sem dinheiro, vai uma grande distância
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    ou talvez não.
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    De certa forma, eu tinha-me
    apercebido daquele mundo
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    que Frédéric Beigbeder descreve
    no seu livro "99 francs",
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    o mundo da publicidade
    e do "marketing" que consiste
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    em desculpabilizar o consumidor,
    para lhe vender produtos
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    que não são bons para ele
    nem para o ambiente.
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    Foi aí que comecei seriamente a duvidar.
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    Eu era uma pessoa normal.
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    Gostava de noitadas,
    bem regadas, jogos de futebol.
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    Eu estava ao corrente
    do que se passava no mundo
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    mas não me afetavam muito.
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    Depois, comecei a ver
    uma série de documentários
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    que me abriram os olhos,
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    e compreendi que o meu dia-a-dia,
    as minhas compras, o que eu fazia
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    tinham um impacto direto no mundo,
    criavam injustiças.
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    Aí, pensei: "Ben, tens que mudar".
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    Tinha dois amigos, Raphael e Nicolas.
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    Em conjunto, começámos
    a proceder a uma série de mudanças.
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    Passámos a ser vegetarianos.
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    Começámos a boicotar certos produtos,
    nem éticos nem ecológicos.
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    Prestámos atenção ao consumo da água
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    e, sobretudo, pusemo-nos a fazer
    auto-stop para nos deslocarmos.
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    Uma tarde, encontrávamo-nos
    numa bomba de abastecimento,
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    em plena noite, bloqueados,
    não havia muito trânsito.
  • 1:34 - 1:38
    O local não era especialmente bucólico
    mas sentíamo-nos bem.
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    Até tivemos uma ideia.
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    "Seria fantástico partir assim,
    à aventura,
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    "viajarmos livres, sem dinheiro".
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    Eis-nos, seis meses depois,
    um alemão, um francês, um italiano,
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    na berma duma estrada
    para os Países Baixos.
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    Isto começa com uma brincadeira,
    mas é uma história séria.
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    Aliás, a ideia tinha evoluído.
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    Tínhamos comprado mochilas solares
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    para fazer uma viagem até ao México
    à boleia, de carro e de barco.
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    Também queríamos fazer um documentário.
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    Tínhamos dois objetivos principais:
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    uma viagem com uma pegada ecológica
    o mais baixa possível,
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    e sem dinheiro, para só consumir
    o que já lá havia.
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    As primeiras 24 horas foram intensas.
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    Fizemos menos de 50 km.
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    Encontrámo-nos num vão de escada,
    a tremer de frio, até ao dia seguinte.
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    Lá fora, fazia 10º C negativos.
    Partir em janeiro não é boa ideia.
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    Mas, sobretudo, estávamos esfomeados.
    No dia seguinte, esperamos quatro horas.
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    Ninguém nos dá boleia
    e começamos a ter dúvidas.
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    Queríamos ser espertos mas, talvez,
    não fôssemos capazes.
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    Felizmente, uma viatura para,
    o destino ajudou-nos.
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    Continuamos, atravessamos
    a Bélgica, a França.
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    De uma autoestrada para outra,
  • 2:45 - 2:47
    aproveitamos os restos
    das bandejas de refeições,
  • 2:47 - 2:50
    e chegamos, cinco dias depois,
    a Barcelona.
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    É uma primeira etapa importante.
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    Encontramos um grupo de destituídos
    que chegam de vários lados
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    e vivem sem dinheiro, ou quase,
    em apartamentos
  • 2:58 - 3:00
    ou edifícios abandonados,
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    e nos iniciam na arte da recuperação.
  • 3:02 - 3:05
    Aprendemos a vasculhar e a pedir
    no fim dos mercados,
  • 3:05 - 3:08
    nos restaurantes, nas padarias,
    para nos alimentarmos.
  • 3:08 - 3:09
    Descobrimos a enormidade
    dos desperdícios
  • 3:10 - 3:13
    e que comer sem dinheiro,
    infelizmente, não é um problema.
  • 3:13 - 3:15
    De seguida, continuamos
    até ao sul de Espanha.
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    Encontramos a boleia com os camionistas
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    que têm o direito de ter
    com eles um copiloto.
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    Assim, podemos embarcar
    no "ferry" para África.
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    Damos os primeiros passos em Marrocos,
    é um verdadeiro choque cultural.
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    Nesta altura, parecemos mesmo vagabundos.
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    Cheiramos mal, não há que enganar.
  • 3:33 - 3:35
    Depressa aprendemos a explicar
    aos marroquinos o que fazemos
  • 3:35 - 3:38
    com duas palavras muito simples:
    "waluf fluze".
  • 3:39 - 3:41
    Aí, abrem-se as portas,
    as pessoas compreendem-nos
  • 3:41 - 3:44
    e descobrimos uma generosidade sem igual.
  • 3:44 - 3:48
    Moussa, por exemplo, encontra-nos
    na berma da estrada, em plena noite.
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    Detém-se sem medo e insiste
    para nos levar a casa dele.
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    Quer que fiquemos três dias,
    porque está escrito no Corão:
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    quando se encontra um viajante,
    é preciso dar-lhe abrigo e comida.
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    O melhor foi que, na manhã do quarto dia,
  • 4:01 - 4:04
    entra no quarto e diz:
    "Pronto, já sou pai!"
  • 4:04 - 4:08
    Leva-nos ao hospital, insiste
    para que peguemos no bebé,
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    e falamos em alemão,
    em italiano e em francês.
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    Diz-nos que somos como os três reis magos
  • 4:13 - 4:15
    que viemos anunciar a chegada
    do seu filho.
  • 4:15 - 4:16
    (Risos)
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    Chama-lhe Iahia, o eleito
  • 4:18 - 4:22
    Esta generosidade repete-se durante
    as seis semanas que passámos em Marrocos,
  • 4:23 - 4:26
    durante as quais procuramos
    uma embarcação para as Ilhas Canárias.
  • 4:26 - 4:29
    Por fim, encontramos um belga em Agadir,
    com um pequeno veleiro de 10 m,
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    que aceita levar-nos.
  • 4:31 - 4:33
    Claro, damos saltos de alegria.
  • 4:33 - 4:36
    Para nós, é o primeiro
    obstáculo ultrapassado.
  • 4:36 - 4:40
    Mas a alegria é de curta duração.
    Trinta minutos depois, saímos do porto.
  • 4:40 - 4:44
    Aquilo baloiça em demasia e ficamos
    aos vómitos até ao dia seguinte.
  • 4:44 - 4:46
    Não é muito agradável, mas não é grave.
  • 4:46 - 4:50
    Chegamos às Canárias
    e passamos lá cerca de mês e meio.
  • 4:50 - 4:54
    Todas as manhãs, vamos ao porto
    procurar marinheiros, capitães,
  • 4:54 - 4:58
    tentar que nos aceitem,
    encontrar um barco para as Américas.
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    Vivemos numa casa abandonada,
    aperfeiçoamos a arte da recuperação
  • 5:01 - 5:03
    e esperamos.
  • 5:03 - 5:06
    Por fim, encontramos dois italianos,
    Marco e Francesco
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    que tinham posto um anúncio na capitania.
  • 5:08 - 5:12
    Procuravam duas raparigas,
    de preferência loiras, para a travessia.
  • 5:12 - 5:15
    Como já compreenderam,
    não as encontraram
  • 5:15 - 5:17
    e aceitaram levar-nos, em vez delas.
  • 5:17 - 5:21
    O acordo era simples: limpamos,
    cozinhamos, fazemos quartos,
  • 5:21 - 5:23
    e nós ensinamos-lhes francês e espanhol.
  • 5:23 - 5:25
    E lá partimos à aventura.
  • 5:25 - 5:29
    Para nós, é ótimo, é o pior
    obstáculo que vai ao ar.
  • 5:29 - 5:31
    A bordo, é uma experiência magnífica.
  • 5:31 - 5:35
    Sobretudo, é uma oportunidade
    para nos distanciarmos desta viagem,
  • 5:35 - 5:39
    porque muitos nos repetem
    — e vocês talvez pensem o mesmo —
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    e o capitão todas as manhãs nos diz:
  • 5:41 - 5:44
    "Vocês não viajam sem dinheiro,
    viajam com o dinheiro dos outros".
  • 5:44 - 5:46
    De certa forma, não está errado.
  • 5:46 - 5:50
    A gasolina, a eletricidade, as coisas
    recuperadas são produzidas com dinheiro.
  • 5:51 - 5:53
    Mas a nossa viagem passa para além
    desse aspeto material.
  • 5:53 - 5:57
    A ideia é aprender a não controlar nada,
  • 5:57 - 6:00
    a viver do que a vida nos dá,
    do que as pessoas nos trazem,
  • 6:00 - 6:02
    de deixar andar.
  • 6:02 - 6:06
    É também a descoberta de um outro mundo,
    de uma outra realidade.
  • 6:07 - 6:13
    Criamos um elo mais humano
    com as pessoas que encontramos,
  • 6:13 - 6:16
    é isso que nos anima e começamos
    a sonhar com um mundo melhor.
  • 6:16 - 6:19
    A travessia dura três semanas
    até ao Brasil.
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    Aí, é mais um choque.
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    Encontramo-nos com centenas
    de irmãos desafortunados
  • 6:24 - 6:27
    que também vivem sem dinheiro,
    só que não por escolha própria.
  • 6:27 - 6:30
    É difícil arranjar comida.
    Vasculhamos alguns restos
  • 6:30 - 6:32
    mas não conseguimos encher o estômago.
  • 6:33 - 6:36
    Para Nicolas, é difícil.
    Está farto desta viagem masoquista.
  • 6:36 - 6:39
    Não está nada convencido
    com esta ideia do dinheiro.
  • 6:39 - 6:42
    Para ele, é um utensílio
    que pode ser utilizado de forma útil.
  • 6:42 - 6:44
    Não compreende a nossa busca como nós.
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    Mas Raphael e eu somos casmurros,
    descobrimos a pobreza
  • 6:48 - 6:50
    e temos vontade de a experimentar
    até ao fim.
  • 6:50 - 6:52
    Por isso, decidimos continuar.
  • 6:52 - 6:55
    Separamo-nos e Raphael e eu
    voltamos à estrada.
  • 6:55 - 6:58
    Ficamos bloqueados durante três dias
    numa bomba de abastecimento.
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    Na manhã do quarto dia, acordo em pânico.
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    Todas as minhas coisas desapareceram,
    a minha mochila, a câmara, tudo.
  • 7:05 - 7:06
    É uma coisa terrível.
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    Imagino que já aconteceu
    a alguns aqui, em viagem,
  • 7:10 - 7:11
    faz parte da viagem.
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    Mas eu não sabia o que fazer.
  • 7:13 - 7:16
    A mochila, ou seja, o computador
  • 7:16 - 7:18
    e muitas coisas para fazer o documentário.
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    A escova de dentes e essas pequenas
    coisas importantes do quotidiano.
  • 7:21 - 7:23
    O passaporte e o cartão do banco
  • 7:23 - 7:26
    que eu guardava escondidos no saco,
    para uma eventualidade.
  • 7:27 - 7:29
    Difícil, mas rapidamente, percebo
  • 7:29 - 7:32
    que é talvez o destino
    que me dá um empurrãozinho.
  • 7:32 - 7:35
    Há meses que me gabava
    da ideia de uma viagem sem dinheiro,
  • 7:35 - 7:38
    que discutia com toda a gente
    a importância do que fazíamos.
  • 7:38 - 7:41
    Talvez fosse importante que o fizesse
    sem a segurança do cartão do banco.
  • 7:41 - 7:45
    A partir daí, eu era o que pretendia ser,
    um viajante sem dinheiro.
  • 7:45 - 7:50
    Retomámos a estrada e Niévès,
    a namorada de Raphael, veio ter connosco.
  • 7:50 - 7:53
    Com as suas belas pernas, o seu sorriso,
    tudo se tornou mais fácil.
  • 7:53 - 7:55
    Curiosamente, já não
    ficávamos à espera, na estrada.
  • 7:55 - 7:59
    Era fácil encontrar alojamento
    e tínhamos sempre o estômago cheio.
  • 7:59 - 8:03
    Isso permitiu-nos ver outra coisa,
    outros aspetos da viagem,
  • 8:03 - 8:06
    especialmente as injustiças
    que marcavam o caminho.
  • 8:07 - 8:09
    Por exemplo, campos de ananases
    poluídos de pesticidas
  • 8:09 - 8:11
    para responder à procura europeia,
  • 8:11 - 8:15
    hangares enormes a abarrotar
    de milhares de galinhas poedeiras,
  • 8:15 - 8:18
    "maquilas", ou "sweat-shops",
    essas empresas sem impostos
  • 8:18 - 8:21
    que produzem "jeans" a preços baixos
    para as grandes marcas
  • 8:21 - 8:23
    e cancros dos trabalhadores
    que são ignorados.
  • 8:23 - 8:26
    Outros tantos encontros
    que confirmam a nossa escolha.
  • 8:26 - 8:28
    Esta ideia de viver sem dinheiro,
  • 8:28 - 8:31
    de pôr em causa este sistema
    financeiro, não é em vão.
  • 8:31 - 8:32
    Decidimos ser veganos
  • 8:32 - 8:35
    para maior coerência,
    para consumir o menos possível
  • 8:35 - 8:37
    e voltamos a partir.
  • 8:37 - 8:41
    Chegamos ao México,
    onze meses depois da partida:
  • 8:41 - 8:44
    25 000 quilómetros percorridos,
    centenas de encontros
  • 8:44 - 8:46
    e, sobretudo, um sonho persistente:
  • 8:47 - 8:49
    E se pudéssemos viver sem dinheiro?
  • 8:49 - 8:52
    Claro, esta viagem não foi
    totalmente sem dinheiro.
  • 8:52 - 8:54
    Até utilizámos 70 euros
    para refazer o meu passaporte,
  • 8:54 - 8:57
    e pagar taxas nas fronteiras.
  • 8:57 - 8:59
    Mas descobrimos uma outra realidade,
  • 8:59 - 9:01
    um mundo feito de partilha, de entreajuda,
  • 9:01 - 9:05
    em que as pessoas dão
    ou trocam os recursos disponíveis.
  • 9:06 - 9:08
    É o que nos leva a regressar à Europa.
  • 9:08 - 9:12
    Para mim, o regresso a França
    é sinónimo de regresso à realidade.
  • 9:12 - 9:15
    Toma a forma de uma dor lancinante
    a nível dos molares.
  • 9:15 - 9:21
    Tenho 22 cáries, certamente graças ao chá
    que os marroquinos oferecem a toda a hora.
  • 9:21 - 9:22
    (Risos)
  • 9:23 - 9:26
    Vocês vão dizer que vaguear
    sem dinheiro é uma coisa,
  • 9:26 - 9:28
    mas, para nos tratarmos, como é?
  • 9:28 - 9:31
    Confesso que nem quis acreditar
    quando a minha irmã me leva à dentista
  • 9:31 - 9:33
    que sabia da minha aventura
    e que me diz:
  • 9:33 - 9:35
    "Ok, podemos fazer um acordo
    não monetário".
  • 9:35 - 9:37
    Trata-me dos dentes, porque era urgente
  • 9:37 - 9:40
    e, em compensação,
    arranja um acordo com a mãe dela.
  • 9:40 - 9:43
    Eis-me fazer companhia
    a uma senhora de 84 anos,
  • 9:43 - 9:46
    a tratar do jardim,
    a fazer pequenas reparações
  • 9:46 - 9:48
    e, sobretudo, a escutá-la.
  • 9:48 - 9:50
    Isso dura um mês e meio.
  • 9:50 - 9:52
    É uma experiência muito rica
    e, para mim, uma confirmação.
  • 9:53 - 9:55
    Imagino um mundo onde houvesse
    pessoas com necessidades
  • 9:55 - 9:59
    e outras pessoas com recursos
    e tudo se equilibrasse.
  • 9:59 - 10:01
    Eu precisava de tratamento,
    uma dentista ajudou-me.
  • 10:01 - 10:04
    Uma idosa precisava de companhia,
    e eu pude oferecer-lha.
  • 10:04 - 10:06
    Digo-me que, afinal, é possível.
  • 10:06 - 10:09
    Um único problema,
    um verdadeiro problema,
  • 10:09 - 10:10
    é que não é legal.
  • 10:11 - 10:13
    É trabalho de mercado negro.
  • 10:13 - 10:15
    Não entra no quadro jurídico legal.
  • 10:15 - 10:19
    Em Franças, é legal vender armas
    mas, dar uma ajuda, não.
  • 10:19 - 10:20
    Portanto, temos um problema real.
  • 10:20 - 10:24
    No entanto, estou convencido
    de que a economia da doação é possível
  • 10:24 - 10:26
    e é uma alternativa económica real
    para este sistema.
  • 10:27 - 10:30
    Certos economistas defendem-na:
    Bernard Maris, Jean-Michel Cornu
  • 10:30 - 10:32
    e mesmo Charles Eisenstein, nos EUA.
  • 10:33 - 10:35
    Estipulam que esta economia
    é uma das únicas
  • 10:35 - 10:38
    que permitem uma distribuição
    equitativa das riquezas
  • 10:38 - 10:40
    segundo as necessidades de cada um.
  • 10:40 - 10:42
    A grande vantagem é que
    a doação dá felicidade
  • 10:42 - 10:45
    tanto a quem dá como a quem recebe.
  • 10:45 - 10:47
    O problema é a contabilização.
  • 10:47 - 10:50
    Podemos contabilizar a economia da doação?
  • 10:50 - 10:51
    Não. É impossível.
  • 10:51 - 10:54
    Aliás, é contrária ao princípio de base,
    a não condicionalidade.
  • 10:54 - 10:58
    Que fazer? Como legalizá-la?
  • 10:58 - 11:01
    Uma única ideia e uma pista:
    pô-la em prática.
  • 11:01 - 11:05
    Foi aí que o nosso projeto
    de ecovilas tomou sentido.
  • 11:05 - 11:08
    Queremos abrir um espaço,
    uma espécie de laboratório vivo,
  • 11:08 - 11:10
    para experimentar a economia da doação,
  • 11:10 - 11:13
    doar o nosso tempo,
    a nossa energia, os nossos excedentes,
  • 11:13 - 11:17
    sem nada esperar em troca
    — copiar o modelo natural,
  • 11:17 - 11:20
    a árvore que dá os seus frutos.
  • 11:20 - 11:23
    Concretamente, daremos cestos de frutos
    e de legumes biológicos
  • 11:23 - 11:25
    a quem não pode comprá-los.
  • 11:25 - 11:28
    Daremos cursos de francês,
    de espanhol, de música, de ortofonia,
  • 11:28 - 11:32
    de arquitetura natural,
    organizaremos conferências, palestras TED,
  • 11:32 - 11:34
    oficinas para construir painéis solares
  • 11:34 - 11:37
    ou todo o tipo de máquinas
    sem eletricidade.
  • 11:37 - 11:39
    Participaremos na vida das comunidades,
  • 11:39 - 11:42
    ajudá-las-emos a orientarem-se
    para uma política de desperdício zero,
  • 11:42 - 11:44
    passaremos tempo com as pessoas idosas,
  • 11:44 - 11:47
    criaremos todo o tipo de atividades
    e, sobretudo, abriremos o espaço
  • 11:47 - 11:50
    para que outros venham
    experimentar connosco,
  • 11:50 - 11:53
    para aprender a receber porque,
    afinal, é o que é mais difícil
  • 11:53 - 11:57
    — dar é fácil, mas receber é difícil,
    devido ao sentimento de inferioridade —
  • 11:57 - 12:01
    aprender a receber para, depois,
    poder dar com humildade.
  • 12:02 - 12:04
    Não será perfeito,
  • 12:04 - 12:07
    Daremos em função dos nossos recursos
  • 12:07 - 12:09
    e quando precisarmos
    de alguma coisa, pedi-la-emos.
  • 12:10 - 12:13
    Funciona como o karma.
    Acreditamos nisso.
  • 12:14 - 12:16
    Pode parecer uma utopia
  • 12:16 - 12:19
    mas é por isso mesmo
    que o projeto se chama "Eotopia",
  • 12:19 - 12:23
    porque a utopia é, tal como o horizonte,
    um objetivo para o qual temos que avançar,
  • 12:23 - 12:26
    Também haverá que pagar taxas e impostos
  • 12:26 - 12:28
    e outros encargos, obviamente.
  • 12:28 - 12:30
    Faremos apelo a doações financeiras
  • 12:30 - 12:32
    que utilizaremos com toda a transparência.
  • 12:32 - 12:34
    Utilizaremos dinheiro, no início
  • 12:34 - 12:37
    e depois havemos de encontrar forma
    de passar sem ele.
  • 12:37 - 12:41
    Aliás, estamos convencidos
    de que podemos passar sem ele.
  • 12:41 - 12:45
    Será necessário encontrar o meio
    de mostrar este protótipo,
  • 12:45 - 12:47
    de nos orientarmos
    para uma sociedade nova,
  • 12:47 - 12:51
    para que a sociedade se force
    a definir um quadro legal
  • 12:51 - 12:54
    porque a economia da doação
    é uma coisa que existe.
  • 12:55 - 12:58
    Sete mil milhões de seres humanos
    utilizam-no quotidianamente.
  • 12:58 - 13:00
    Vocês mesmos, vocês dão.
  • 13:00 - 13:03
    Levante a mão quem dá
    quotidianamente tempo e energia.
  • 13:03 - 13:06
    Estão a ver? Toda a gente.
    Toda a gente faz doações.
  • 13:06 - 13:10
    Mas a doação não é
    uma economia legal, reconhecida.
  • 13:11 - 13:17
    O que podemos fazer
    para que esta economia retome o seu lugar?
  • 13:17 - 13:20
    Antigamente, era o único sistema
    económico natural que existia,
  • 13:21 - 13:23
    Podemos experimentar,
  • 13:23 - 13:26
    criar espaços de gratuitidade,
    ecovilas como a Eotopia,
  • 13:26 - 13:30
    doar simplesmente, doar hoje.
  • 13:31 - 13:34
    continuar a alimentar essa economia
    para que, pouco a pouco,
  • 13:34 - 13:37
    ela cresça e ocupe lugar
    em relação à economia financeira.
  • 13:38 - 13:41
    Se, tal como eu, estão convencidos
    de que a economia atual
  • 13:41 - 13:44
    baseada na moeda e nas finanças,
    cria desigualdades,
  • 13:45 - 13:47
    e gostariam de a mudar,
  • 13:47 - 13:50
    mas dizem que é impossível,
    que somos impotentes,
  • 13:50 - 13:53
    não tenho grandes teorias
    — lamento, bem gostaria —
  • 13:53 - 13:57
    mas faço um simples convite:
    dar, dar um pouco todos os dias,
  • 13:57 - 14:01
    fortalecer esta economia da doação,
    esta economia paralela,
  • 14:01 - 14:04
    para que ela, pouco a pouco,
    abafe a outra economia.
  • 14:04 - 14:06
    Tenho a certeza de que
    podemos chegar, um dia,
  • 14:06 - 14:09
    a responder a todas as necessidades
    com a doação,
  • 14:09 - 14:11
    se nos dedicarmos todos a isso.
  • 14:11 - 14:13
    É assim, demos porque a Natureza dá,
  • 14:13 - 14:16
    demos porque isso nos faz felizes
    hoje e amanhã.
  • 14:16 - 14:17
    Obrigado.
  • 14:17 - 14:21
    (Aplausos)
Title:
E se vivêssemos sem dinheiro? | Benjamin Lesage | TEDxBordeaux
Description:

É uma pergunta que muitos economistas, antropólogos e filósofos têm feito. A economia da doação existe e é possível. Baseia-se no conceito da gratuitidade, na doação sem reciprocidade, "na compreensão de que a generosidade está no coração da natureza humana e na convicção de que dar é receber", como diz Charles Eisenstein. Benjamim acredita que, se todos nos dedicarmos, se todos dermos ativamente, é todo o rosto da nossa sociedade que pode mudar.
no
Nascido em Besançon, no Franco-Condado, Benjamin Lesage parte para os Países Baixos, aos 21 anos, para estudar e abrir-se ao mundo. Três anos depois, na companhia de dois amigos, inicia uma viagem ecológica sem um cêntimo, à boleia de carro e de barco, que o leva dos Países Baixos ao México. Durante essa viagem, descobre toda uma outra economia, baseada na entreajuda e na partilha, destituída de trocas monetárias. Contente com essa experiência, continua o seu percurso iniciático no México, nos EUA e, de seguida, na Europa, promovendo aquilo a que se chama "a economia da doação", em toda a parte onde vai. De regresso a França, publica o livro "Sans un sou en poche". Reúne-se com outras pessoas para criar um projeto de local ecológico, baseado na economia da doação, no estilo de vida vegano e na permacultura: a Eotopia.

Esta palestra foi feita num evento TEDx usando o formato de palestras TED, mas organizado independentemente por uma comunidade local. Saiba mais em http://ted.com/tedx

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Video Language:
French
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
14:34

Portuguese subtitles

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