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Uma visão de ficção científica do amor de um holograma com 318 anos

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    Eu pareço-vos real?
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    Espero que sim.
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    Não sei se estão a ver isto,
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    mas eu vou olhar em frente
    e confiar que vocês estão aí.
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    Desenhei um semicírculo
    na areia à minha frente
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    para não passar deste ponto
    e parecer que estou a flutuar no ar.
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    Agora, eu estou de pé
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    ao ar livre,
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    numa praia debaixo de uma palmeira,
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    no local exato onde o vosso palco
    costumava estar.
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    Eu tenho 12 minutos com vocês.
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    Eu defini um limite.
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    A minha esposa Navid disse
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    que a possibilidade infinita
    é o pior inimigo de um criador.
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    Por exemplo, este vestido:
    Eu pedi-lhe para ela criar algo
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    que um padre poderia ter usado
    no século XXIII, no Cairo.
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    Mas nós só tínhamos três dias
    para o fazer,
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    e o único tecido que tínhamos
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    era uma velha capa de edredão
    que outro residente deixou.
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    Mas ela fê-lo, e ficou perfeito.
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    Ela olhou para ele e disse:
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    "Prova de conceito
    — a criação precisa de restrição."
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    Assim, com estes 12 minutos,
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    vou falar-vos sobre a minha
    maior descoberta.
  • 1:25 - 1:28
    Durante toda a minha vida, a minha
    obsessão tem sido a vida eterna,
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    e sei que para muitos de vocês também.
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    Talvez fiquem felizes em saber que
    a vossa pesquisa vai compensar.
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    Tenho 318 anos.
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    A esperança média de vida humana
    é atualmente de 432 anos,
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    e meu trabalho tem sido alargar
    a vida humana indefinidamente.
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    Eu nunca pus em causa que um dia,
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    vamos chegar a um ponto
    onde estaremos satisfeitos.
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    O contrário continua a acontecer:
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    quanto mais vivemos,
    mais tempo queremos viver,
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    e menos queremos morrer.
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    Quem nos pode culpar?
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    O universo é tão grande.
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    Nunca vai haver coisas demais
    para se ver.
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    Ontem, estava a ler
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    sobre como podemos
    apanhar um barco na Europa
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    e navegar de ilha em ilha
    por todo o planeta,
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    e algumas ilhas têm vilas
    em que podemos ficar e visitar
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    e dormir sob a sombra de Júpiter.
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    E então há uma outra ilha
    onde há apenas um compositor
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    que se senta e toca bandolim
    para o oceano.
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    E depois há outras onde não há ninguém
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    e nunca houve,
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    por isso vamos lá pelo simples prazer
    de tocar com os pés na areia
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    que nenhum pé jamais tocou.
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    Poderíamos passar 400 anos
    a fazer apenas isto.
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    Neste instante, a Lua
    está a nascer no nordeste.
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    Consigo, a olho nu, ver as cidades dela.
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    Elas estão interligadas
    como redes neurais:
  • 3:00 - 3:06
    Mariapolis no Polo Sul,
    e Ramachandran no Equador.
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    E Nova Tehran no Mar da Tranquilidade.
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    Foi lá que a Navid e eu nos conhecemos.
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    Éramos ambas artistas na baixa.
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    No dia em que nos conhecemos,
    cruzámo-nos na Praça Azadi,
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    e esbarrámos uma na outra.
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    Quando me virei para me desculpar,
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    ela, sem dizer "olá",
    sem se apresentar nem nada,
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    disse: "Porque será que não
    passámos uma através da outra?"
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    O meu primeiro pensamento foi:
    "Quem diabo és tu?"
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    Depois, fiquei irritada com a pergunta,
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    pois a resposta era muito simples.
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    Respondi: "Não passámos
    uma através da outra
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    "porque as partículas
    elementares têm massa
  • 3:48 - 3:50
    "e porque o espaço
    entre as partículas elementares
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    "é preenchido com energia de ligação
    que tem propriedades de massa,
  • 3:53 - 3:56
    "e nós já sabemos isto há 800 anos ".
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    Provavelmente, ela estava
    num daqueles dias
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    em que gosta de brincar com estranhos.
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    Ou talvez se estivesse a meter comigo,
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    porque ela olhou para mim e disse:
  • 4:06 - 4:07
    "Achei que ias dizer isso.
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    "Pensa mais fundo".
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    Em seguida, tirou o cinto,
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    este cinto que eu estou a usar agora,
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    e disse:
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    "O nosso universo é construído de modo
    a que as partículas tenham massa.
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    "Sem essa restrição básica,
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    "teríamos acabado de passar através
    uma da outra à velocidade da luz
  • 4:32 - 4:33
    "e nem daríamos por isso."
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    E foi assim que o nosso romance começou.
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    A Navid e eu
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    nunca ficávamos sem assunto.
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    Nunca.
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    Era incrível.
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    Era como se fossemos ambas heroínas
    escalando uma montanha juntas
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    e continuávamos a chegar
    a novos horizontes,
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    e estas constelações de palavras
    novas e perfeitas
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    saiam de nós para descrevê-los.
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    Esquecíamo-nos delas
    assim que as pronunciávamos,
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    deixando-as para trás,
    e seguindo em frente.
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    Uma vez, a Navid comparou as nossas
    conversas a estar sempre a fazer pão,
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    e que estávamos sempre a adicionar
    um pouco mais de farinha,
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    e um pouco mais de água,
  • 5:23 - 5:25
    e dobrando-o e misturando-o
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    e nunca chegando ao ponto de o cozer.
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    Se a minha obsessão era a vida eterna,
    a obsessão da Navid era o toque.
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    Ela era uma autoridade no assunto.
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    O seu trabalho girava em torno disso.
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    O meu corpo era como uma tela para ela,
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    e ela passava a ponta do dedo
    na minha cara, tão lentamente,
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    que eu nem sentia o seu movimento.
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    Ela era obcecada com o exato momento
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    em que eu ia deixar de poder dizer
    a diferença entre o corpo dela e o meu.
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    Ou deitava-se sobre mim
    e encaixava o ombro dela no meu
  • 6:07 - 6:10
    e dizia: "Pilar, porque é
    que isto é tão bom?"
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    Eu respondia: "Não sei!"
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    Ela tinha sempre uma resposta jocosa
    para uma pergunta jocosa,
  • 6:21 - 6:24
    mas a resposta da qual me lembro hoje é:
  • 6:25 - 6:27
    "Isto é bom
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    "porque o universo escolheu
    os seus limites,
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    "e nós somos a sua arte."
  • 6:42 - 6:45
    É engraçado comparar
    como achamos que vai ser o futuro
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    com o que ele acaba por ser.
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    No vosso tempo, pensava-se
    que os seres humanos podiam congelar-se
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    e acordar no futuro.
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    E eles acordaram — mas depois morreram.
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    No vosso tempo, os cientistas achavam
    que a reposição de órgãos humanos
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    prolongaria a vida por centenas de anos.
  • 7:06 - 7:08
    E assim o fizeram,
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    mas, por fim, eles morriam
    de qualquer maneira.
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    No vosso tempo, a Terra
    é o único lugar onde as pessoas vivem.
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    No meu tempo, a Terra é o lugar
    onde as pessoas vêm para morrer.
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    Então, quando a Navid começou
    a mostrar os sinais,
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    os nossos amigos presumiram
    que eu faria o que todos fazem,
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    que é dizer adeus
    e enviá-la para a Terra,
  • 7:35 - 7:38
    para nenhum de nós ter de olhar para ela
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    ou estar perto dela ou pensar nela
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    e no seu fracasso em manter-se viva.
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    Mais do que tudo,
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    eles não queriam estar perto
    do seu corpo físico real.
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    Referiam-se a ele como "decadente",
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    embora ela própria
    estivesse fascinada por ele,
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    pelas mudanças pelas quais ele passava,
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    seguindo as leis da natureza dia após dia,
    independentemente do desejo dela.
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    Eu enviei a Navid para a Terra.
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    Mas eu vim com ela.
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    Lembro-me de uma amiga nossa,
    antes de partirmos, dizer:
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    "Acho isto muito arrogante,
  • 8:21 - 8:25
    "como se as regras não se aplicassem,
    como se o vosso amor fosse especial".
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    Mas eu vim.
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    Então, mesmo aqui na Terra,
  • 8:35 - 8:37
    continuei a trabalhar
    para prolongar a vida.
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    Não me ocorreu
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    que poderia haver outra solução.
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    Continuei a voltar para aquilo
    que a Navid me disse,
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    naquele dia na Praça Azadi,
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    que, sem esta limitação básica
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    — sem um universo
    que conferisse massa à matéria —
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    nós não existiríamos.
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    Esta é uma das regras.
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    Outra regra é que toda massa
    está sujeita à entropia.
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    E não há como existir
    neste universo sem massa.
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    Eu sei, pois eu tentei de tudo.
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    Tentei criar uma caixa de fotões
    em que o campo de Higgs fosse alterado.
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    Tentei gravar todos os movimentos
    subatômicos no meu corpo
  • 9:13 - 9:15
    e reproduzi-los num circuito fechado.
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    Nada funcionou.
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    Mas a minha inovação final
    foi criar uma dimensão em espiral
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    com os limites de um corpo no qual o tempo
    se movesse infinitamente mais devagar,
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    mas cuja projeção pareceria
    mover-se em tempo real.
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    Aquele corpo então apareceria
    no nosso universo como um holograma,
  • 9:43 - 9:45
    está aqui, mas não está.
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    Quando percebi que tinha conseguido,
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    corri para o quarto dela,
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    tão feliz para lhe dizer
    que tinha conseguido,
  • 9:57 - 10:00
    movendo-me pelo espaço parecendo
    quase normal para os olhos,
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    mesmo para os meus olhos.
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    Quando tentei deitar-me perto dela,
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    esqueci-me, e passei através dela.
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    Tinha encontrado uma via
    para a vida eterna,
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    à custa daquilo que a Navid mais amava,
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    tocar e ser tocada.
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    E ela expulsou-me de lá.
  • 10:36 - 10:39
    No entanto, ainda consegui assistir.
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    Agora os seres humanos vivem 400 anos,
  • 10:42 - 10:43
    mas ainda morremos.
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    E, quando a morte chega,
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    o moribundo ainda prefere morrer na cama,
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    e os seus braços irrompem em brotos
    azul e violeta por dentro,
  • 10:57 - 11:00
    e a respiração fica
    cada vez mais espaçada
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    como se estivessem a adormecer.
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    Eu sempre pensei
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    que o sentido da vida estava na aventura.
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    E a morte apenas é um problema
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    para o qual ainda não temos solução.
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    Mas talvez a vida apenas faça
    sentido porque acaba.
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    Talvez seja este o paradoxo:
  • 11:30 - 11:34
    os limites não restringem,
    mas permitem a liberdade perfeita.
  • 11:46 - 11:48
    Houve um temporal aqui hoje de manhã.
  • 11:49 - 11:50
    Há outro previsto para hoje à noite,
  • 11:50 - 11:52
    mas, por agora, o céu está limpo.
  • 11:53 - 11:54
    Aqui não sinto o vento,
  • 11:54 - 11:58
    mas perguntei a uma das cuidadoras
    que estava a passar como é que era,
  • 11:58 - 12:01
    e ela disse-me que era quente,
    como manteiga derretida.
  • 12:03 - 12:06
    Uma resposta à altura da minha esposa.
  • 12:11 - 12:14
    Tenho de encontrar o meu caminho
    de volta para o meu corpo.
  • 12:17 - 12:21
    Até lá, não vou ocupar nenhum espaço,
    exceto o que vocês me deram.
Title:
Uma visão de ficção científica do amor de um holograma com 318 anos
Speaker:
Monica Byrne
Description:

Escritora de ficção científica, Monica Byrne imagina mundos ricos povoados com personagens que desafiam os nossos estereótipos raciais, sociais e de género. Nesta exibição, Byrne aparece como um holograma chamado Pilar, transmitindo uma história de amor e de perda a partir de um futuro próximo, depois de os seres humanos terem colonizado o universo. "É sempre engraçado o que achamos que o futuro vai ser em comparação com o que acaba por ser", diz ela.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
12:38

Portuguese subtitles

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