A mudança de poder global
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0:01 - 0:03Há um poema escrito
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0:03 - 0:05por um poeta inglês muito famoso,
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0:05 - 0:07no final do séc. XIX.
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0:07 - 0:09Segundo dizem, terá feito eco
na mente de Churchill -
0:09 - 0:11nos anos 30.
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0:11 - 0:13E o poema diz:
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0:13 - 0:15"Na ociosa colina do verão,
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0:15 - 0:18"indolente com o correr dos riachos,
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0:18 - 0:20"atento ouço um tambor distante,
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0:20 - 0:22"tocando como um som em sonhos,
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0:22 - 0:25"longe e perto e baixo e mais alto
nas estradas da Terra passam, -
0:25 - 0:28"queridos dos amigos e alimento para o pó,
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0:28 - 0:30"os soldados marchando,
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0:30 - 0:32"prestes a morrer."
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0:32 - 0:34Para aqueles que se interessam por poesia,
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0:34 - 0:37o poema é " Um Rapaz de Shropshire",
escrito por A. E. Housman. -
0:37 - 0:39Mas o que Housman compreendeu,
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0:39 - 0:42e que também escutamos
nas sinfonias de Nielsen, -
0:42 - 0:46foi que os verões longos,
quentes e bucólicos -
0:46 - 0:49da estabilidade do séc. XIX
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0:49 - 0:51estavam a chegar ao fim,
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0:51 - 0:52e que estávamos prestes a entrar
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0:52 - 0:55num daqueles períodos
terríveis da História -
0:55 - 0:57em que o poder muda.
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0:57 - 0:59São sempre períodos, senhoras e senhores,
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0:59 - 1:02acompanhados de turbulência
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1:02 - 1:04e, com demasiada frequência, de sangue.
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1:04 - 1:06A minha mensagem para vós
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1:06 - 1:08é que acredito que estamos condenados
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1:08 - 1:11a viver precisamente
num desses momentos da História, -
1:11 - 1:13em que, basicamente,
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1:13 - 1:16a ordem estabelecida do poder
está a começar a mudar -
1:16 - 1:18e o novo aspeto do mundo,
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1:18 - 1:20os novos poderes que existem no mundo,
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1:20 - 1:22começam a tomar forma.
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1:22 - 1:25E estes são
— hoje vemo-lo muito claramente — -
1:25 - 1:29quase sempre, tempos de grande turbulência,
extremamente difíceis, -
1:29 - 1:31e demasiado frequentemente tempos
muito sangrentos. -
1:31 - 1:34Isto acontece aproximadamente
uma vez em cada século. -
1:34 - 1:36Podem alegar que a última vez
que aconteceu -
1:36 - 1:39— foi o que Housman sentiu aproximar-se
e o que Churchill também sentiu — -
1:39 - 1:42foi quando o poder passou
das antigas nações, -
1:42 - 1:44os antigos poderes da Europa,
-
1:44 - 1:48através do Atlântico,
para o novo poder emergente dos EUA -
1:48 - 1:50o início do século americano.
-
1:50 - 1:54Claro, para o vácuo onde os demasiado
velhos poderes europeus -
1:54 - 1:55costumavam estar,
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1:55 - 1:59foram jogadas as duas catástrofes
sangrentas do século passado -
1:59 - 2:02— uma, na primeira parte
e uma na segunda parte: -
2:02 - 2:03as duas Grandes Guerras Mundiais.
-
2:03 - 2:06Mao Tsé-Tung costumava referi-las
como as guerras civis europeias, -
2:06 - 2:09e provavelmente é uma maneira
mais precisa de as descrever. -
2:09 - 2:11Senhoras e senhores,
-
2:11 - 2:13vivemos numa dessas épocas.
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2:13 - 2:16Mas, entre nós, hoje quero falar
sobre três fatores. -
2:16 - 2:18Os dois primeiros deles
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2:18 - 2:21são sobre uma mudança de poder.
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2:21 - 2:24O segundo é sobre uma nova dimensão
de que vos quero falar, -
2:24 - 2:27que nunca aconteceu da forma
como está a acontecer agora. -
2:27 - 2:30Mas falemos das mudanças de poder
que estão a ocorrer no mundo. -
2:30 - 2:32O que está a acontecer atualmente,
-
2:32 - 2:34num certo sentido, é assustador,
-
2:34 - 2:36porque nunca aconteceu antes.
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2:36 - 2:39Temos visto mudanças de poder laterais
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2:39 - 2:41— o poder da Grécia passou para Roma
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2:41 - 2:44e as mudanças de poder que ocorreram
-
2:44 - 2:46durante as civilizações europeias —
-
2:46 - 2:49mas estamos a assistir a uma coisa
levemente diferente. -
2:49 - 2:52Porque o poder não está apenas
a deslocar-se lateralmente -
2:52 - 2:53de nação para nação.
-
2:53 - 2:55Está também a deslocar-se verticalmente.
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2:55 - 2:58Hoje, o poder que estava encerrado,
submetido à responsabilidade -
2:58 - 3:01dos titulares dos cargos
e ao Estado de Direito, -
3:01 - 3:04no interior da instituição
do estado nação, -
3:04 - 3:07migrou agora, em grande medida,
para um nível global. -
3:07 - 3:09A globalização do poder
-
3:09 - 3:11— falamos da globalização dos mercados,
-
3:11 - 3:14mas, na realidade, trata-se
da globalização do poder real. -
3:15 - 3:16E onde, ao nível do estado nação,
-
3:16 - 3:19esse poder é submetido
à responsabilidade dos titulares, -
3:19 - 3:21sujeito ao Estado de Direito,
-
3:21 - 3:24no cenário internacional não o é.
-
3:24 - 3:27O cenário internacional e o cenário global
onde o poder reside agora -
3:27 - 3:30— o poder da Internet, o poder
das emissoras por satélite, -
3:30 - 3:32o poder dos cambistas —
-
3:32 - 3:36essa vasta rotação do dinheiro,
que circula agora -
3:36 - 3:40num valor correspondente
a 32 vezes o necessário ao negócio -
3:40 - 3:42que supostamente está a ser financiado
-
3:42 - 3:44— os cambistas, se quiserem —
-
3:44 - 3:46os especuladores financeiros
-
3:46 - 3:49que nos subjugaram a todos nós,
muito recentemente, -
3:49 - 3:51o poder das empresas multinacionais
-
3:51 - 3:53que agora apresentam orçamentos
-
3:53 - 3:56frequentemente maiores do que
os de países de tamanho médio. -
3:56 - 3:58Todos estes vivem num espaço global
-
3:58 - 4:00em grande parte não regulado,
-
4:00 - 4:03não sujeito ao Estado de Direito,
-
4:03 - 4:05e no qual as pessoas
podem atuar sem restrições. -
4:05 - 4:08Isso tem sido conveniente aos poderosos,
-
4:08 - 4:10até certa altura.
-
4:10 - 4:13É sempre conveniente àqueles
que têm mais poder -
4:13 - 4:16operar em espaços sem restrições,
-
4:16 - 4:19mas a lição da História é que,
mais cedo ou mais tarde, -
4:19 - 4:21o espaço não regulado
-
4:21 - 4:23— o espaço não sujeito
ao Estado de Direito — -
4:23 - 4:26passa a ser ocupado, não apenas
pelas coisas que queremos -
4:26 - 4:28— comércio internacional, Internet, etc. —
-
4:28 - 4:30mas também por coisas que não queremos
-
4:30 - 4:32— criminalidade internacional,
terrorismo internacional. -
4:33 - 4:35A revelação do 11 de setembro
-
4:35 - 4:39foi que, mesmo que se seja
a nação mais poderosa da Terra, -
4:40 - 4:42apesar disso,
-
4:42 - 4:45os que habitam aquele espaço
podem atacar-nos, -
4:45 - 4:47até na nossa cidade mais emblemática,
-
4:47 - 4:49numa manhã luminosa de setembro.
-
4:49 - 4:51Dizem que algo como 60%
-
4:51 - 4:54dos 4 milhões de dólares
que financiaram o 11 de setembro -
4:54 - 4:57passaram através
das instituições das Twin Towers, -
4:57 - 4:59que o 11 de setembro destruiu.
-
4:59 - 5:01Os nossos inimigos também usam este espaço
-
5:01 - 5:04— o espaço das viagens em massa,
da Internet, dos emissores por satélite — -
5:04 - 5:07para poderem lançar o seu veneno,
-
5:07 - 5:10para destruírem os nossos sistemas
e o nosso estilo de vida. -
5:10 - 5:12Mais cedo ou mais tarde,
-
5:12 - 5:13mais cedo ou mais tarde,
-
5:13 - 5:15segundo a lei da História,
-
5:15 - 5:19a governação deve seguir
para onde vai o poder. -
5:20 - 5:23E, se for o caso, como acredito que é,
-
5:23 - 5:25de um dos fenómenos do nosso tempo
-
5:25 - 5:27ser a globalização do poder,
-
5:27 - 5:29o que se segue é que
um dos desafios da nossa época -
5:29 - 5:32será levar a governação
para o espaço global. -
5:32 - 5:35E eu acredito que as próximas décadas
-
5:35 - 5:40serão mais ou menos turbulentas
na medida em que -
5:40 - 5:43formos mais ou menos capazes
de atingir esse objetivo: -
5:43 - 5:45levar a governação para o espaço global.
-
5:45 - 5:47Reparem, não estou a falar em governo.
-
5:47 - 5:51Não estou a falar em instituir
qualquer instituição democrática global. -
5:51 - 5:53Na minha perspetiva, senhoras e senhores,
-
5:53 - 5:56é improvável que isso seja feito
-
5:56 - 5:58desovando mais instituições
das Nações Unidas. -
5:58 - 6:00Se não tivéssemos a ONU,
tínhamos que inventá-la. -
6:00 - 6:02O mundo precisa de um fórum internacional.
-
6:02 - 6:06Precisa de um meio de legitimação
da ação internacional. -
6:06 - 6:08Mas quando se trata de governação
do espaço global, -
6:08 - 6:11o meu palpite é que
isto que não vai acontecer -
6:11 - 6:13através da criação
de mais instituições da ONU. -
6:13 - 6:16Acontecerá, realmente,
através da poderosa união -
6:16 - 6:18e dos sistemas baseados
na feitura de tratados, -
6:18 - 6:20acordos baseados em tratados,
-
6:20 - 6:22para governar esse espaço global.
-
6:22 - 6:25Se observarem, podem vê-los a acontecer,
começando já a surgir. -
6:25 - 6:28A Organização Mundial do Comércio:
uma organização baseada em tratados, -
6:28 - 6:30inteiramente baseada
em tratados, e contudo, -
6:30 - 6:33suficientemente poderosa para impor,
mesmo aos poderosos EUA, -
6:33 - 6:35a prestação de contas, se necessário.
-
6:35 - 6:39Quioto: o início da luta para criar
uma organização baseada em tratados. -
6:39 - 6:40O G-20.
-
6:40 - 6:43Sabemos agora que temos
que nos organizar numa instituição -
6:43 - 6:45que seja capaz de trazer a governação
-
6:45 - 6:48àquele espaço financeiro
para especulação financeira. -
6:48 - 6:51É isso que o G-20 é,
uma instituição baseada em tratados. -
6:51 - 6:53Mas há ali um problema,
-
6:53 - 6:55ao qual voltaremos muito em breve,
-
6:55 - 6:58que consiste no facto de que,
se juntarmos os mais poderosos -
6:58 - 7:01para fazerem as regras de instituições
baseadas em tratados, -
7:01 - 7:03para preencher
aquele espaço de governação, -
7:03 - 7:06que acontecerá aos mais fracos
que são deixados de fora? -
7:06 - 7:08Trata-se de um grande problema,
-
7:08 - 7:10ao qual voltaremos dentro em pouco.
-
7:10 - 7:12Portanto, a minha
primeira mensagem é que, -
7:12 - 7:15se vamos passar
por estes tempos turbulentos -
7:15 - 7:18mais ou menos turbulentamente,
-
7:18 - 7:20o sucesso com que o faremos
-
7:20 - 7:22dependerá, em larga medida,
da nossa capacidade -
7:22 - 7:25de trazer governação sensível
ao espaço global. -
7:26 - 7:28Vejam isso a começar a acontecer.
-
7:28 - 7:30O meu segundo ponto
-
7:30 - 7:33— e eu sei que não tenho que falar
a um público como este -
7:33 - 7:35sobre uma coisa destas —
-
7:35 - 7:38é que o poder não está apenas
a mudar verticalmente, -
7:38 - 7:40está também a mudar horizontalmente.
-
7:40 - 7:43Podem argumentar que a história,
a História das civilizações, -
7:43 - 7:46tem sido feita de civilizações
reunidas à volta de mares -
7:46 - 7:49com as primeiras à volta do Mediterrâneo,
-
7:49 - 7:52as mais recentes, na origem
do poder ocidental, à volta do Atlântico. -
7:53 - 7:55Parece-me que agora estamos a assistir
-
7:55 - 7:58a uma transferência fundamental
do poder, em termos gerais, -
7:58 - 8:00das nações reunidas à volta
das costas do Atlântico -
8:00 - 8:03para as nações reunidas
à volta da orla do Pacífico. -
8:03 - 8:05Isto começa com o poder económico,
-
8:05 - 8:07mas é assim que começa sempre.
-
8:07 - 8:10Já começamos a ver o desenvolvimento
de políticas externas, -
8:10 - 8:12o crescimento dos orçamentos militares
-
8:12 - 8:15a ocorrer nos outros poderes
em crescimento no mundo. -
8:15 - 8:18Na verdade, penso
que não é tanto uma mudança -
8:18 - 8:19do Ocidente para o Oriente;
-
8:19 - 8:21está a acontecer uma coisa diferente.
-
8:21 - 8:23A minha opinião, valha o que valer,
-
8:23 - 8:25é que os EUA vão manter-se
-
8:25 - 8:27como a nação mais poderosa da Terra
-
8:27 - 8:29durante os próximos 10, 15 anos,
-
8:29 - 8:32mas o contexto em que detêm o seu poder
-
8:32 - 8:36alterou-se agora radicalmente,
mudou radicalmente. -
8:36 - 8:38Estamos a sair de 50 anos,
-
8:38 - 8:40anos extraordinários, de História,
-
8:40 - 8:43em que tivemos um mundo
totalmente monopolar, -
8:43 - 8:45no qual todas as agulhas das bússolas
-
8:45 - 8:47pró e contra
-
8:47 - 8:50têm de ser referenciadas pela sua posição
relativamente a Washington -
8:50 - 8:53— o mundo montado num único colosso.
-
8:53 - 8:55Mas não é um caso vulgar na História.
-
8:55 - 8:58De facto, o que está agora a emergir
-
8:58 - 9:00é um caso muito mais normal na História.
-
9:00 - 9:03Começamos a ver a emergência
de um mundo multipolar. -
9:04 - 9:06Até agora, os EUA têm sido
-
9:06 - 9:09o traço dominante do nosso mundo.
-
9:09 - 9:11Continuarão a ser a nação mais poderosa,
-
9:11 - 9:13mas serão a nação mais poderosa
-
9:13 - 9:15num mundo crescentemente multipolar.
-
9:15 - 9:18E começamos a ver os centros alternativos
de poder a edificarem-se -
9:18 - 9:20— na China, claro, embora
a minha opinião pessoal seja -
9:20 - 9:23que a ascensão da China como potência
não vai ser suave. -
9:23 - 9:25Vai ser até bastante difícil
-
9:25 - 9:27quando a China começar
a democratizar a sua sociedade -
9:27 - 9:29depois de liberalizar a economia.
-
9:29 - 9:31Mas isso é tema
para uma discussão diferente. -
9:31 - 9:33Vemos a Índia, vemos o Brasil.
-
9:33 - 9:36Vemos, crescentemente,
que para nós, europeus, -
9:36 - 9:39o mundo agora parece-se muito mais
-
9:39 - 9:42com a Europa do séc. XIX.
-
9:42 - 9:46Lord Canning, um grande ministro
dos negócios estrangeiros inglês, -
9:46 - 9:49descrevia a Europa do século XIX,
como o "concerto de poderes europeu." -
9:49 - 9:52Havia um equilíbrio,
uma balança de cinco pratos. -
9:52 - 9:54A Grã-Bretanha pesava sempre na balança.
-
9:54 - 9:56Se Paris se juntava a Berlim,
-
9:56 - 9:59a Grã-Bretanha juntava-se a Viena
e a Roma para contrabalançar. -
9:59 - 10:00Agora reparem,
-
10:00 - 10:03num período dominado
por um mundo monopolar, -
10:03 - 10:05as alianças são fixas
-
10:05 - 10:07a NATO, o Pacto de Varsóvia.
-
10:07 - 10:10Uma polaridade de poder fixa
significa alianças fixas. -
10:10 - 10:13Mas uma polaridade de poder múltipla
-
10:13 - 10:15significa trocar e mudar de alianças.
-
10:15 - 10:17E esse é o mundo em que vamos entrar,
-
10:17 - 10:19no qual veremos crescentemente
-
10:19 - 10:21que as nossas alianças não são fixas.
-
10:21 - 10:24Canning, o ministro britânico
dos negócios estrangeiros, disse: -
10:24 - 10:26"A Grã-Bretanha tem um interesse comum,
-
10:26 - 10:27mas não tem aliados comuns."
-
10:27 - 10:29E veremos crescentemente
-
10:29 - 10:31que mesmo nós, no Ocidente,
-
10:31 - 10:33vamos estender-nos,
temos que nos estender, -
10:33 - 10:36para além do círculo de conforto
dos poderes atlânticos, -
10:36 - 10:37para fazer alianças com outros,
-
10:37 - 10:40se queremos conseguir que as coisas
se concretizem no mundo. -
10:40 - 10:42Quando fomos para a Líbia,
-
10:42 - 10:44o Ocidente não conseguiu
fazê-lo fizesse sozinho, -
10:44 - 10:46tivemos que nos juntar a outros.
-
10:46 - 10:49Neste caso, tivemos
que nos juntar à Liga Árabe. -
10:49 - 10:52Acho que o Iraque e o Afeganistão
foram as últimas vezes -
10:52 - 10:54em que o Ocidente tentou atuar sozinho,
-
10:54 - 10:56e não teve sucesso.
-
10:56 - 10:58Acho que estamos a chegar
-
10:58 - 11:01ao princípio do fim de 400 anos
-
11:01 - 11:04— digo 400 anos porque me refiro
ao fim do Império Otomano — -
11:04 - 11:06de hegemonia do poder ocidental,
-
11:06 - 11:09das instituições ocidentais
e dos valores ocidentais. -
11:10 - 11:13Até agora, se o Ocidente
atuasse em conjunto, -
11:13 - 11:15podia pôr e dispor
-
11:15 - 11:16em todos os cantos do mundo.
-
11:17 - 11:19Mas isso já não acontece.
-
11:19 - 11:21Vejam a última crise financeira
-
11:21 - 11:23após a Segunda Guerra Mundial.
-
11:23 - 11:25O Ocidente uniu-se
-
11:25 - 11:28— as instituições de Bretton Woods,
o Banco Mundial, o FMI — -
11:28 - 11:30problema resolvido.
-
11:30 - 11:32Agora temos que chamar outros.
-
11:32 - 11:34Agora temos que criar o G-20.
-
11:34 - 11:36Agora temos que ir
além do círculo de conforto -
11:36 - 11:38dos nossos amigos ocidentais.
-
11:38 - 11:40Vou fazer uma previsão,
-
11:40 - 11:42que provavelmente é ainda mais chocante.
-
11:42 - 11:45Eu suspeito que estamos
agora a chegar ao fim -
11:45 - 11:50de 400 anos em que
o poder occidental era suficiente. -
11:50 - 11:51As pessoas dizem-me:
-
11:51 - 11:54"Os chineses nunca se deixarão envolver
-
11:54 - 11:56"na pacificação multilateral
em todo o mundo." -
11:56 - 11:58Ah, sim? Porque não?
-
11:58 - 12:00Quantas tropas chinesas estão hoje
-
12:00 - 12:02a servir como boinas azuis,
a servir a bandeira azul, -
12:02 - 12:04a servir sob o comando da ONU, no mundo?
-
12:04 - 12:06São 3700.
-
12:06 - 12:08Quantas tropas americanas?
Onze. -
12:08 - 12:11Qual é o maior contingente naval
-
12:11 - 12:13a combater o problema dos piratas somali?
-
12:13 - 12:16O contingente naval chinês.
-
12:16 - 12:18Claro que estão,
são uma nação mercantilista. -
12:18 - 12:20Querem manter as rotas marítimas abertas.
-
12:20 - 12:23Cada vez mais, teremos que negociar
-
12:23 - 12:26com pessoas com as quais
não partilhamos valores, -
12:26 - 12:29mas com quem, de momento,
partilhamos interesses comuns. -
12:29 - 12:31É uma forma totalmente diferente
-
12:31 - 12:34de olhar o mundo que está agora a emergir.
-
12:34 - 12:36E aqui está o terceiro fator,
-
12:36 - 12:38que é totalmente diferente.
-
12:38 - 12:41Hoje, no nosso mundo moderno,
-
12:41 - 12:42por causa da Internet,
-
12:42 - 12:45por causa do tipo de coisas
de que as pessoas falaram hoje aqui, -
12:45 - 12:48tudo está ligado a tudo.
-
12:49 - 12:51Somos agora interdependentes.
-
12:51 - 12:53Estamos agora interligados,
-
12:53 - 12:55como nações, como indivíduos,
-
12:55 - 12:58de uma maneira
como nunca antes aconteceu, -
12:58 - 13:00nunca antes aconteceu.
-
13:00 - 13:03A inter-relação das nações
-
13:03 - 13:04é uma coisa que sempre existiu.
-
13:04 - 13:07A diplomacia trata da gestão
da inter-relação das nações. -
13:07 - 13:10Mas agora estamos
intimamente interligados, -
13:10 - 13:12Se apanharmos gripe suína no México,
-
13:12 - 13:15isso é um problema
para o aeroporto Charles de Gaulle -
13:15 - 13:1624 horas mais tarde.
-
13:16 - 13:19A Lehman Brothers abre falência,
todo o conjunto colapsa. -
13:19 - 13:21Há incêndios nas estepes da Rússia,
-
13:21 - 13:24distúrbios alimentares em África.
-
13:24 - 13:27Agora, estamos todos
profundamente interligados. -
13:28 - 13:34Isso significa que a ideia
de um estado nação a atuar sozinho, -
13:34 - 13:36sem ligação com os outros,
-
13:36 - 13:38sem trabalhar com os outros,
-
13:38 - 13:41já não é uma proposição viável,
-
13:41 - 13:43Porque as ações de um estado nação
-
13:43 - 13:45não só não estão confinadas ao mesmo,
-
13:45 - 13:47como não são suficientes
para que o estado em si -
13:47 - 13:50controle o seu próprio território,
-
13:50 - 13:53porque os efeitos do que acontece
fora do estado nação -
13:53 - 13:56começam agora a afetar
o que acontece no seu interior, -
13:56 - 13:57Eu fui um jovem soldado
-
13:57 - 14:01na última das pequenas guerras
do império da Grã-Bretanha. -
14:01 - 14:04Nesse tempo, a defesa do meu país
-
14:04 - 14:06tinha que ver com uma coisa
e uma coisa apenas: -
14:06 - 14:09quão forte era o nosso exército,
a nossa força aérea, -
14:09 - 14:12quão forte era a nossa marinha
e quão fortes eram os nossos aliados. -
14:12 - 14:14Isso era quando o inimigo estava
fora das muralhas. -
14:14 - 14:16Agora o inimigo está dentro das muralhas.
-
14:16 - 14:19Agora, se quero falar
sobre a defesa do meu país, -
14:19 - 14:21tenho que falar com o Ministro da Saúde
-
14:21 - 14:23porque as pandemias
são uma ameaça à minha segurança. -
14:23 - 14:26Tenho que falar
com o Ministro da Agricultura -
14:26 - 14:28porque a segurança alimentar
é uma ameaça à minha segurança. -
14:28 - 14:32Tenho que falar
com o Ministro da Indústria -
14:32 - 14:35porque a fragilidade da nossa estrutura
de alta tecnologia -
14:35 - 14:37é agora um alvo para os nosso inimigos
-
14:37 - 14:39— como vemos pela guerra cibernética.
-
14:39 - 14:41Tenho que falar com o Ministro do Interior
-
14:41 - 14:44porque quem entrou no meu país,
-
14:44 - 14:47quem vive naquela casa com terraço
naquela cidade do interior -
14:47 - 14:49tem um efeito direto
sobre o que acontece no meu país, -
14:49 - 14:52como nós vimos em Londres,
nos atentados de 7 de Julho. -
14:53 - 14:55A segurança de um país já não é apenas
-
14:55 - 14:58um assunto para os seus soldados
e o seu Ministro da Defesa. -
14:58 - 15:02Reside na sua capacidade
para interligar as instituições. -
15:02 - 15:04Isto diz-nos algo de muito importante.
-
15:04 - 15:06Diz-nos que, de facto,
-
15:06 - 15:09os nossos governos,
construídos verticalmente, -
15:09 - 15:12construídos no modelo económico
da Revolução Industrial -
15:12 - 15:15— hierarquia vertical,
especialização de tarefas, -
15:15 - 15:16estruturas de comando —
-
15:16 - 15:19têm as estruturas completamente erradas.
-
15:19 - 15:20Nos negócios, nós sabemos
-
15:20 - 15:24que a estrutura paradigma do nosso tempo
é a rede de trabalho. -
15:24 - 15:27É a nossa capacidade de trabalhar
esses assuntos em rede que importa, -
15:27 - 15:30tanto no interior do governo
como externamente. -
15:30 - 15:32Esta é a terceira lei de Ashdown.
-
15:32 - 15:35Não me perguntem pela primeira
e pela segunda lei de Ashdown -
15:35 - 15:36porque ainda não as inventei.
-
15:36 - 15:39Soa sempre melhor
se houver uma terceira lei, não é? -
15:39 - 15:42A terceira lei de Ashdown é que,
na era moderna, -
15:42 - 15:44em que tudo está ligado a tudo,
-
15:44 - 15:46a coisa mais importante
sobre o que podemos fazer -
15:46 - 15:49é o que podemos fazer com os outros.
-
15:49 - 15:51A parte mais importante da nossa estrutura
-
15:51 - 15:54— quer seja um governo, quer seja
um regimento do exército, -
15:54 - 15:55quer seja um negócio —
-
15:55 - 15:57são os pontos de ancoragem,
as inter-relações, -
15:57 - 16:00a capacidade de trabalhar
em rede com outros. -
16:00 - 16:03A indústria compreende isso,
os governos não. -
16:03 - 16:06Mas, agora, uma última coisa.
-
16:06 - 16:08Se for o caso, senhoras e senhores — e é —
-
16:08 - 16:10de estarmos todos interligados
-
16:10 - 16:13de uma tal forma
como nunca antes aconteceu, -
16:13 - 16:16acontece também que partilhamos
um destino entre nós. -
16:16 - 16:19De repente, e pela primeira vez,
-
16:19 - 16:22a defesa coletiva,
aquilo que nos tem dominado -
16:22 - 16:25como o conceito de segurança das nações,
-
16:25 - 16:26já não é suficiente.
-
16:26 - 16:28Costumava acontecer que,
-
16:28 - 16:31se a minha tribo era mais poderosa
do que a deles, eu estava seguro, -
16:31 - 16:33se o meu país era mais poderoso,
eu estava seguro; -
16:33 - 16:37se a minha aliança, como a NATO,
era mais poderosa do que a deles, -
16:37 - 16:38eu estava seguro.
-
16:38 - 16:39Já não é assim.
-
16:39 - 16:42O advento da interligação
-
16:42 - 16:44e das armas de destruição maciça
-
16:44 - 16:47significa que, cada vez mais,
partilho um destino com o meu inimigo. -
16:47 - 16:49Quando fui diplomata,
-
16:49 - 16:52e negociei os tratados de desarmamento
com a União Soviética -
16:52 - 16:55em Genebra, na década de 70,
-
16:55 - 16:56tivemos êxito porque compreendemos
-
16:56 - 16:59que partilhávamos um destino com eles.
-
16:59 - 17:01Segurança coletiva não é o suficiente.
-
17:01 - 17:04A paz chegou à Irlanda do Norte
porque ambos os lados -
17:04 - 17:07compreenderam que o jogo
de soma zero não funcionava. -
17:07 - 17:10Eles partilhavam um destino
com os seus inimigos. -
17:10 - 17:12Um dos grandes entraves à paz
no Médio Oriente -
17:12 - 17:16é que ambos os lados, tanto Israel,
como, parece-me, os palestinianos, -
17:16 - 17:19não compreendem que partilham
um destino coletivo. -
17:19 - 17:22E assim, de repente, senhoras e senhores,
-
17:22 - 17:26o que foi o projeto de visionários
e poetas, ao longo dos tempos -
17:26 - 17:29torna-se em algo que temos
de considerar seriamente -
17:29 - 17:31como uma questão de política pública.
-
17:31 - 17:34Comecei com um poema,
vou terminar com outro. -
17:34 - 17:36O grande poema de John Donne,
-
17:37 - 17:40"Não perguntes por quem os sinos dobram."
-
17:41 - 17:43O poema intitula-se
"Nenhum Homem é uma Ilha." -
17:43 - 17:45E diz o seguinte:
-
17:45 - 17:47"A morte de cada homem afetou-me,
-
17:47 - 17:50"pois com a humanidade me confundo.
-
17:50 - 17:52"Não mandes perguntar
-
17:52 - 17:54"por quem os sinos dobram,
-
17:54 - 17:56"eles dobram por ti."
-
17:56 - 17:59Para John Donne,
uma recomendação de moralidade. -
18:00 - 18:01Para nós, penso eu,
-
18:01 - 18:04parte da equação
para a nossa sobrevivência. -
18:04 - 18:05Muito obrigado.
-
18:06 - 18:09(Aplausos)
- Title:
- A mudança de poder global
- Speaker:
- Paddy Ashdown
- Description:
-
Paddy Ashdown defende que estamos a viver num momento da História em que o poder está a mudar de uma maneira nunca antes ocorrida. Numa palestra fascinante, proferida no TEDxBrussels, ele traça um esboço das três grandes mudanças globais que vê aproximarem-se.
- Video Language:
- English
- Team:
- closed TED
- Project:
- TEDTalks
- Duration:
- 18:09
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for The global power shift | ||
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Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for The global power shift | ||
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Ilona Bastos added a translation |