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O que os veterinários sabem que os médicos não sabem

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    Há dez anos,
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    recebi uma chamada
    que mudou a minha vida.
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    Na altura, eu era cardiologista
    na Universidade de Los Angeles,
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    a especializar-me nas técnicas
    de imagiologia cardíaca.
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    A chamada era de um veterinário
    do Zoo de Los Angeles.
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    Uma chimpanzé idosa
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    tinha acordado com uma paralisia facial
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    e os veterinários receavam
    que ela tivesse tido um acidente vascular.
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    Perguntaram se eu podia ir ao zoo
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    e fazer uma TAC ao coração do animal
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    para procurar uma possível causa cardíaca.
  • 0:37 - 0:40
    É bom saber que os zoos norte-americanos
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    têm equipas de veterinários
    altamente qualificados e certificados
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    que cuidam excelentemente
    dos seus animais doentes.
  • 0:50 - 0:54
    De vez em quando, contactam
    a comunidade médica dos seres humanos,
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    principalmente para certas
    consultas da especialidade.
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    Eu fui um dos médicos privilegiados
    convidados para os ajudar.
  • 1:04 - 1:10
    Tive a sorte de impedir
    um acidente cardíaco nesta chimpanzé
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    e garantir que aquela gorila
    não tinha uma aorta danificada.
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    Observei esta arara
    que tinha um sopro cardíaco,
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    Verifiquei que o pericárdio
    deste leão marinho da Califórnia
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    não estava inflamado.
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    Nesta foto, estou a auscultar
    o coração de um leão,
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    depois dum procedimento
    que lhe salvou a vida
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    em conjunto com veterinários e médicos
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    em que drenámos 700 cm3 de fluido
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    do saco que envolvia o coração deste leão.
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    Este procedimento foi idêntico
    ao que tenho feito a doentes humanos,
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    com exceção daquela pata
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    e daquela cauda.
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    (Risos)
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    A maior parte do tempo,
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    eu trabalhava, com médicos,
    no Centro Médico da Universidade,
  • 2:09 - 2:14
    a discutir sintomas,
    diagnósticos e tratamentos
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    para os meus doentes humanos.
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    Mas parte do tempo,
    trabalhava no Zoo de Los Angeles
  • 2:21 - 2:26
    com veterinários, a discutir
    sintomas, diagnósticos e tratamentos
  • 2:26 - 2:28
    para os seus animais doentes.
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    De vez em quando, no mesmo dia,
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    eu fazia rondas
    no Centro Médico da Universidade
  • 2:38 - 2:40
    e no Zoo de Los Angeles.
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    E uma coisa começou
    a tornar-se muito clara para mim.
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    Os médicos e os veterinários
    estavam, essencialmente,
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    a tratar das mesmas doenças
    nos seus doentes animais e humanos:
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    insuficiência cardíaca congestiva,
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    tumores cerebrais,
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    leucemia,
  • 3:03 - 3:08
    diabetes, artrite,
    esclerose amiotrófica, cancro da mama
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    e mesmo síndromas psiquiátricos,
    como a depressão,
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    a ansiedade, compulsões,
  • 3:16 - 3:20
    perturbações da alimentação
    e automutilação.
  • 3:21 - 3:23
    E tenho que fazer uma confissão.
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    Apesar de eu ter estudado
    fisiologia comparativa
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    e biologia evolutiva
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    quando estudante
  • 3:33 - 3:36
    — até escrevi a minha tese
    sobre a teoria de Darwin —
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    aprender a sobreposição significativa
  • 3:40 - 3:43
    das doenças dos animais
    e dos seres humanos,
  • 3:43 - 3:48
    constituiu para mim
    um despertar muito necessário.
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    Perante todas essas sobreposições,
    comecei a pensar:
  • 3:53 - 3:58
    Porque é que eu nunca tinha pensado
    pedir a um veterinário
  • 3:58 - 4:01
    — ou consultar a literatura veterinária —
  • 4:01 - 4:04
    a sua opinião sobre um
    dos meus doentes humanos?
  • 4:05 - 4:08
    Porque é que nem eu
  • 4:08 - 4:13
    nem nenhum dos meus amigos
    e colegas médicos, a quem perguntei,
  • 4:13 - 4:16
    nunca tínhamos assistido
    a uma conferência veterinária?
  • 4:18 - 4:24
    Já agora, porque é que isso
    havia de ser uma surpresa?
  • 4:24 - 4:31
    Todos os médicos aceitam
    uma certa ligação biológica
  • 4:31 - 4:33
    entre animais e seres humanos.
  • 4:33 - 4:38
    Toda a medicação
    que receitamos ou que tomamos,
  • 4:38 - 4:41
    ou que damos à nossa família
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    foi testada primeiro num animal.
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    Mas é uma coisa muito diferente
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    dar a um animal um medicamento
    ou uma doença humana
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    e o animal contrair
    um acidente cardíaco congestivo
  • 4:57 - 5:01
    ou diabetes ou cancro da mama.
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    Ora bem, talvez a surpresa
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    venha da crescente
    separação do nosso mundo
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    entre o urbano e o não urbano.
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    Ouvimos falar desses miúdos citadinos
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    que julgam que a lã cresce nas árvores
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    ou que o queijo provém duma planta.
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    Atualmente,
    os hospitais dos seres humanos
  • 5:27 - 5:33
    estão a transformar-se cada vez mais
    em reluzentes catedrais de tecnologia.
  • 5:34 - 5:40
    Isso cria uma distância psicológica
    entre os doentes humanos
  • 5:40 - 5:41
    que ali são tratados
  • 5:41 - 5:45
    e os doentes animais
    que vivem nos oceanos,
  • 5:46 - 5:49
    nas quintas e na selva.
  • 5:50 - 5:53
    Mas eu acho que há
    uma razão ainda mais profunda.
  • 5:55 - 6:00
    Médicos e cientistas,
    aceitamos intelectualmente
  • 6:00 - 6:05
    que a nossa espécie, o Homo sapiens,
    é simplesmente uma espécie,
  • 6:05 - 6:09
    que não é mais única nem mais especial
    do que qualquer outra.
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    Mas, no íntimo, não acreditamos
    totalmente nisso.
  • 6:17 - 6:20
    Eu própria o sinto, quando escuto Mozart
  • 6:21 - 6:26
    ou olho para as fotos da Sonda Marte
    no meu MacBook.
  • 6:26 - 6:31
    Sinto que isso é uma prova
    do excecionalismo humano,
  • 6:32 - 6:36
    apesar de reconhecer
    o custo cientificamente isolador
  • 6:36 - 6:42
    de nos considerarmos
    como uma espécie superior, aparte.
  • 6:43 - 6:45
    Mas agora ando a tentar.
  • 6:46 - 6:50
    Agora, quando vejo um doente humano,
    pergunto sempre:
  • 6:50 - 6:55
    O que é que os médicos dos animais
    sabem sobre este problema, que eu não sei?
  • 6:55 - 7:01
    Estaria a tratar melhor
    o meu doente humano
  • 7:01 - 7:06
    se o visse como um doente animal humano?
  • 7:08 - 7:12
    Eis alguns exemplos de ligações excitantes
  • 7:12 - 7:15
    a que este tipo de raciocínio me levou.
  • 7:17 - 7:19
    Acidente cardíaco provocado pelo medo.
  • 7:19 - 7:21
    Por volta de 2000,
  • 7:21 - 7:25
    os cardiologistas dos humanos
    "descobriram"
  • 7:25 - 7:29
    o acidente cardíaco
    provocado emocionalmente.
  • 7:29 - 7:34
    Foi descrito num pai jogador
    que perdeu todas as suas poupanças
  • 7:34 - 7:37
    com um par de dados,
  • 7:37 - 7:41
    numa noiva que ficou abandonada no altar.
  • 7:42 - 7:46
    Mas acontece que
    este diagnóstico humano "novo"
  • 7:46 - 7:50
    não era novo, nem era apenas humano.
  • 7:51 - 7:57
    Os veterinários já tinham diagnosticado,
    tratado e até prevenido
  • 7:57 - 8:01
    sintomas provocados
    emocionalmente em animais,
  • 8:01 - 8:03
    desde macacos a flamingos,
  • 8:04 - 8:06
    de veados a coelhos,
  • 8:07 - 8:10
    desde os anos 70.
  • 8:11 - 8:14
    Quantas vidas humanas
    podiam ter sido salvas
  • 8:14 - 8:18
    se este conhecimento veterinário
    tivesse sido posto nas mãos
  • 8:18 - 8:22
    de médicos e cardiologistas,
    nas urgências?
  • 8:23 - 8:25
    Automutilação.
  • 8:26 - 8:29
    Há doentes humanos que se magoam.
  • 8:30 - 8:33
    Uns arrancam punhados de cabelo,
  • 8:34 - 8:36
    outros cortam-se com facas.
  • 8:38 - 8:41
    Há animais doentes que também se magoam.
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    Há aves que arrancam as penas.
  • 8:46 - 8:50
    Há garanhões que mordem
    repetidamente os flancos
  • 8:51 - 8:52
    até sangrarem.
  • 8:53 - 8:59
    Mas os veterinários têm formas
    muito específicas e eficazes
  • 8:59 - 9:03
    de tratar e mesmo de prevenir
    a automutilação
  • 9:03 - 9:06
    nos animais que se automutilam.
  • 9:07 - 9:10
    Esse conhecimento veterinário
    não devia ser posto nas mãos
  • 9:10 - 9:14
    dos psicoterapeutas,
    dos pais e dos doentes
  • 9:14 - 9:16
    que se debatem com a automutilação?
  • 9:18 - 9:21
    Depressão pós-parto e psicose pós-parto.
  • 9:22 - 9:26
    Por vezes, logo a seguir ao parto,
  • 9:26 - 9:28
    algumas mulheres entram em depressão.
  • 9:28 - 9:32
    Por vezes, ficam gravemente
    deprimidas e até psicóticas.
  • 9:33 - 9:36
    Podem negligenciar o recém-nascido
  • 9:36 - 9:37
    e, em casos extremos,
  • 9:37 - 9:39
    até fazem mal à criança.
  • 9:40 - 9:44
    Os veterinários de cavalos também sabem
    que, de vez em quando,
  • 9:44 - 9:47
    uma égua, logo a seguir ao parto,
  • 9:47 - 9:51
    negligencia o potro,
    recusando-se a alimentá-lo,
  • 9:51 - 9:55
    e, em certas alturas,
    escouceiam o potro, até à morte.
  • 9:57 - 10:00
    Mas os veterinários arranjaram
  • 10:00 - 10:05
    uma intervenção para tratar
    desse síndroma de rejeição do potro
  • 10:05 - 10:10
    que envolve o aumento
    da oxitocina na égua.
  • 10:10 - 10:13
    A oxitocina é a hormona de ligação,
  • 10:13 - 10:16
    e leva a um interesse renovado,
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    por parte da égua, pelo potro.
  • 10:19 - 10:21
    Estas informação não devia
  • 10:21 - 10:25
    ser posta nas mãos
    dos obstetras/ginecologistas,
  • 10:25 - 10:27
    dos médicos de família e dos doentes
  • 10:28 - 10:32
    que se debatem com a depressão
    e a psicose pós-parto?
  • 10:35 - 10:38
    Apesar de tudo o que isto promete,
  • 10:38 - 10:44
    o golfo entre os nossos campos,
    infelizmente, mantém-se enorme.
  • 10:45 - 10:50
    Para o explicar, receio ter que lavar
    alguma roupa suja.
  • 10:51 - 10:55
    Há médicos muito "snobs"
  • 10:55 - 10:58
    quanto a profissionais
    que não são licenciados em medicina.
  • 10:58 - 11:03
    Falo dos dentistas,
    optometristas e psicólogos
  • 11:04 - 11:08
    mas, em especial, dos médicos de animais.
  • 11:08 - 11:12
    Claro que a maior parte dos médicos
    não fazem ideia de que, hoje em dia,
  • 11:12 - 11:16
    é mais difícil entrar em veterinária
    do que em medicina
  • 11:16 - 11:19
    e que, quando vamos para medicina,
  • 11:19 - 11:21
    aprendemos tudo o que há para saber
  • 11:21 - 11:24
    sobre uma espécie, o Homo sapiens,
  • 11:24 - 11:29
    mas os veterinários têm que aprender
    sobre a saúde e as doenças
  • 11:29 - 11:32
    de mamíferos, anfíbios,
    répteis, peixes e aves.
  • 11:34 - 11:39
    Por isso eu não censuro os veterinários
    se eles se sentem ofendidos
  • 11:39 - 11:44
    com a condescendência e a ignorância
    dos da minha profissão.
  • 11:44 - 11:47
    Esta é uma piada dos veterinários:
  • 11:47 - 11:51
    Como é que se chama a um veterinário
  • 11:51 - 11:53
    que só sabe tratar duma espécie?
  • 11:57 - 11:59
    Um médico.
  • 11:59 - 12:00
    (Risos)
  • 12:00 - 12:05
    Fechar o fosso tornou-se
    para mim uma paixão.
  • 12:06 - 12:09
    Vou fazê-lo através de programas
  • 12:09 - 12:12
    como Darwin on Rounds
    na Universidade de Los Angeles,
  • 12:12 - 12:17
    onde vamos levar especialistas em animais
    e biólogos evolucionistas
  • 12:17 - 12:21
    e incorporá-los nas nossas equipas médicas
  • 12:21 - 12:25
    com os nossos internos
    e os nossos residentes.
  • 12:25 - 12:28
    Através das conferências Zoobiquity,
  • 12:29 - 12:33
    onde juntamos escolas de medicina
    com escolas de veterinária
  • 12:33 - 12:36
    para discussões de colaboração
  • 12:36 - 12:38
    das doenças e perturbações comuns
  • 12:38 - 12:41
    de doentes animais e humanos.
  • 12:42 - 12:44
    Nas conferências Zoobiquity,
  • 12:45 - 12:49
    os participantes aprendem como
    tratar o cancro da mama num tigre
  • 12:51 - 12:53
    pode ajudar-nos a tratar melhor
  • 12:53 - 12:55
    o cancro da mama
    numa educadora de infância.
  • 12:57 - 13:01
    Como compreender ovários policísticos
    numa vaca Holstein
  • 13:02 - 13:04
    nos pode ajudar a tratar melhor
  • 13:04 - 13:07
    duma professora de dança
    com períodos dolorosos.
  • 13:09 - 13:13
    Como compreender melhor
    o tratamento da ansiedade da separação
  • 13:13 - 13:15
    numa cadela puro sangue
  • 13:16 - 13:18
    pode ajudar crianças ansiosas
  • 13:19 - 13:21
    que se debatem
    nos primeiros dias da escola.
  • 13:24 - 13:28
    Nas conferências Zoobiquity nos EUA
    e, agora, internacionalmente,
  • 13:28 - 13:32
    médicos e veterinários conferem
  • 13:32 - 13:36
    as suas atitudes
    e os seus preconceitos, à entrada
  • 13:36 - 13:40
    e acabam por se juntar como colegas,
  • 13:41 - 13:45
    como pares, como médicos.
  • 13:48 - 13:51
    Afinal de contas, nós humanos
    também somos animais,
  • 13:52 - 13:55
    e já é tempo que nós, médicos,
  • 13:55 - 14:00
    assumamos a natureza animal
    dos nossos doentes e a nossa
  • 14:00 - 14:03
    e nos juntemos aos veterinários
  • 14:03 - 14:06
    numa abordagem à saúde,
    que abranja todas as espécies
  • 14:08 - 14:10
    Porque acontece
  • 14:10 - 14:15
    que alguma da melhor
    e mais humanista medicina
  • 14:15 - 14:19
    é praticada por médicos
    cujos doentes não são humanos.
  • 14:20 - 14:24
    Uma das melhores formas de tratarmos
  • 14:24 - 14:29
    do doente humano é prestando muita atenção
  • 14:29 - 14:33
    a como todos os outros doentes do planeta
  • 14:33 - 14:38
    vivem, crescem, adoecem e se curam.
  • 14:39 - 14:41
    Obrigada.
  • 14:42 - 14:44
    (Aplausos)
Title:
O que os veterinários sabem que os médicos não sabem
Speaker:
Barbara Natterson-Horowitz
Description:

Como é que se chama um veterinário que trata de uma só espécie? Um médico. Numa palestra fascinante, Barbara Natterson-Horowitz defende como uma abordagem à saúde, que abranja todas as espécies, pode melhorar o tratamento médico do animal humano — em especial no que se refere à saúde mental.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
14:57

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