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O prazer de surfar em águas congeladas

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    Se eu contasse a vocês
    que essa era a cara da pura alegria,
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    vocês me chamariam de doido?
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    Eu não os condenaria,
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    pois sempre que olho para essa selfie
    no Ártico, tremo um pouquinho de frio.
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    Quero contar a vocês
    um pouco sobre essa foto.
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    Eu estava nadando
    pelas Ilhas Lofoten, na Noruega,
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    bem no Círculo Polar Ártico,
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    e a água do mar estava congelante.
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    O ar? Um vento forte de 10°C negativos,
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    e eu pude literalmente sentir o sangue
    tentando sumir das minhas mãos,
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    pés e rosto, e corri
    para proteger os órgãos vitais.
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    Foi o frio mais intenso que já senti.
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    Mas mesmo com lábios inchados,
    olhos fundos e bochechas vermelhas,
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    descobri que esse lugar aqui
    é onde encontro grande alegria.
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    Bem, em relação à dor,
    o psicólogo Brock Bastian
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    provavelmente descreveu
    melhor ao escrever:
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    “A dor é uma espécie de atalho
    à atenção plena.
  • 1:03 - 1:06
    Ela nos faz subitamente conscientes
    de tudo no meio ambiente.
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    Ela brutalmente nos empurra
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    para uma consciência sensorial virtual
    do mundo semelhante à meditação.”
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    Se morrer de frio é uma forma de meditar,
    então me considero um monge. (Risos)
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    Antes de entrarmos no porquê,
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    alguém já desejou surfar
    em água supergelada?
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    Adoraria dar a vocês alguma perspectiva
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    de como pode ser um dia da minha vida.
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    (Música)
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    (Vídeo) Homem: Sei que estávamos
    esperando por boas ondas,
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    mas acho que ninguém pensou
    que isso iria acontecer.
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    Não consigo parar de tremer.
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    Estou com tanto frio.
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    (Música)
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    (Aplausos)
  • 2:36 - 2:40
    Chris Burkard: Então,
    fotógrafo de surfe, certo?
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    Nem sei se isso é nome de uma profissão,
    para ser sincero.
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    Meus pais achavam que não,
  • 2:45 - 2:50
    quando falei aos 19 anos que deixaria
    o emprego por essa profissão tão sonhada:
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    céu azul, praias tropicais,
    e um bronzeado que dura o ano todo.
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    Para mim, era só isso.
    A vida não podia ficar melhor.
  • 2:58 - 3:03
    Suando, fotografando surfistas
    nesses locais turísticos exóticos.
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    Mas só havia um problema.
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    Quanto mais tempo eu gastava viajando
    para esses lugares exóticos,
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    menos gratificante parecia ser.
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    Planejei buscar aventura,
    e só encontrava rotina.
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    Coisas como wi-fi, TV, bom jantar
    e uma conexão constante de celular
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    que para mim eram as armadilhas
    de lugares com muito turismo
  • 3:23 - 3:26
    dentro e fora do mar,
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    e não demorou muito
    para eu começar a me sentir sufocado.
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    Comecei a ansiar por locais selvagens,
    lugares ao ar livre,
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    e então fui em busca de lugares
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    tidos como frios demais, distantes demais
    e perigosos demais para o surfe,
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    e esse desafio me intrigava.
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    Comecei um tipo de cruzada pessoal
    contra o mundano,
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    pois se há uma coisa que percebi,
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    é que em qualquer profissão,
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    mesmo uma como a aparentemente
    glamorosa de fotógrafo de surfe,
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    tem o perigo de se tornar monótona.
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    Assim, na busca por quebrar
    a monotonia, percebi algo:
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    apenas cerca de um terço dos oceanos
    da Terra tem água morna,
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    e é apenas essa estreita faixa
    ao redor do equador.
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    Então se eu fosse encontrar
    ondas perfeitas,
  • 4:12 - 4:15
    provavelmente seria em algum lugar frio,
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    onde os mares são muito violentos
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    e foi exatamente lá que comecei a busca.
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    E foi em minha primeira viagem à Islândia
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    que senti ter encontrado
    exatamente o que procurava.
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    Fiquei impressionado
    com a beleza natural da paisagem,
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    mas o mais importante, eu não acreditava
    que tínhamos encontrado ondas perfeitas
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    em uma parte do mundo tão distante
    e com relevo tão acidentado.
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    Num momento, chegamos à praia
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    e vimos pedaços maciços de gelo
    empilhados à beira do mar.
  • 4:41 - 4:43
    Eles criavam essa barreira
    entre nós e o surfe,
  • 4:43 - 4:46
    e tivemos que remar
    por uma espécie de labirinto
  • 4:46 - 4:48
    para chegar à formação das ondas.
  • 4:48 - 4:52
    E ao chegar lá, empurrávamos de lado
    os pedaços de gelo para pegar as ondas.
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    Foi uma experiência incrível
    que nunca esquecerei,
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    porque no meio dessas condições adversas,
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    senti como se tivesse caído
    em um dos últimos recantos de paz,
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    onde encontrei uma clareza
    e uma conexão com o mundo
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    que nunca pensei encontrar
    em uma praia lotada.
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    Fui fisgado. Fui fisgado. (Risos)
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    Mares gelados estavam constantemente
    em meu pensamento, e dali para frente,
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    meu trabalho focou esse tipo
    de ambiente primitivo e impiedoso,
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    e ele me levou a lugares como Rússia,
    Noruega, Alasca, Islândia, Chile,
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    Ilhas Faroe e muitos outros lugares.
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    E uma das coisas favoritas
    sobre esses lugares
  • 5:31 - 5:34
    era simplesmente o desafio
    e criatividade necessários para chegar lá:
  • 5:34 - 5:37
    horas, dias, semanas gastas
    no Google Earth
  • 5:37 - 5:41
    tentando localizar um trecho distante
    de praia ou recife onde pudéssemos ir.
  • 5:41 - 5:45
    E ao chegarmos lá, os veículos tinham
    que ser igualmente criativos:
  • 5:45 - 5:48
    "snowmobiles", carros soviéticos
    de combate com seis eixos,
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    e uns dois voos de helicóptero
    superrústicos.
  • 5:51 - 5:53
    (Risos)
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    Helicópteros realmente me dão medo,
    por falar nisso.
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    Houve um passeio de barco agitado
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    lá da costa da ilha de Vancouver
    até um local de surfe, meio distante,
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    onde acabamos vendo do mar, indefesos,
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    os ursos saquearem nosso acampamento.
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    Eles foram embora com nossa comida
    e partes da barraca,
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    claramente avisando que estávamos
    na base da cadeia alimentar
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    e que aquele era o espaço deles,
    não o nosso.
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    Mas para mim, aquela viagem
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    foi um testamento à vida selvagem
    que troquei pelas praias turísticas.
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    Agora, só quando viajei para a Noruega...
    (Risos)
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    eu realmente aprendi a apreciar o frio.
  • 6:32 - 6:34
    Esse é o lugar
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    onde algumas das tempestades
    mais fortes e violentas do mundo
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    enviam ondas imensas
    que quebram na linha costeira.
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    Estávamos nesse fiorde estreito,
    distante, no Círculo Polar Ártico.
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    A população de ovelhas
    era maior do que a de pessoas,
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    então, se precisássemos de socorro,
    não haveria onde encontrar.
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    Eu estava no mar fotografando surfistas
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    e começou a nevar.
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    A temperatura começou a cair.
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    E disse a mim mesmo:
    "Sem chance de você sair do mar.
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    Você viajou tudo isso,
    e é exatamente o que você desejava:
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    condições congelantes e ondas perfeitas."
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    E apesar de não sentir o dedo
    para pressionar o disparador,
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    eu sabia que não iria sair.
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    Então fiz o que dava para fazer.
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    Mas foi nesse momento que senti
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    o vento soprar forte
    pelo vale e me atingir,
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    e o que começou como uma neve fina
    logo se tornou uma nevasca,
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    e comecei a perder a percepção
    de onde estava.
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    Não sabia se estava sendo levado
    para alto-mar ou para a costa,
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    e tudo o que eu conseguia perceber
    era o som fraco das gaivotas
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    e ondas quebrando.
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    Eu sabia que esse lugar tinha reputação
    de afundar navios e aviões,
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    e enquanto estava lá boiando
    comecei a ficar um pouco nervoso.
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    Na verdade, estava totalmente em pânico
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    e estava ficando hipotérmico,
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    e meus amigos acabaram tendo
    que me ajudar a sair da água.
  • 8:00 - 8:03
    E não sei se estava delirando ou o quê,
  • 8:03 - 8:05
    mas depois eles me disseram
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    que mantive um sorriso no rosto
    o tempo todo.
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    Bem, foi nessa viagem
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    e provavelmente nessa experiência
    em que comecei realmente a sentir
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    que cada foto era preciosa
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    porque, de repente, naquele momento,
    era algo que fui forçado a conseguir.
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    E percebi, todo esse tremor
    realmente me ensinou algo:
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    na vida não há atalhos para o prazer.
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    Qualquer coisa que valha a pena conquistar
    vai requerer sofrimento,
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    só um pouquinho,
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    e esse pouquinho de sofrimento
    que tive pela fotografia,
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    agregou um valor ao meu trabalho
    muito mais significativo para mim
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    do que apenas preencher
    as páginas das revistas.
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    Vejam, deixei uma parte de mim mesmo
    nesses lugares,
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    e o que levei de lá
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    foi um sentimento de satisfação
    que sempre busquei.
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    Então volto a essa foto.
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    É fácil ver os dedos congelados
    e a roupa de neoprene congelada
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    e até a luta que foi para chegar lá,
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    mas acima de tudo,
    o que vejo é pura alegria.
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    Muito obrigado.
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    (Aplausos)
Title:
O prazer de surfar em águas congeladas
Speaker:
Chris Burkard
Description:

"Tudo que vale a pena conquistar requer o nosso sofrimento, só um pouco", diz o fotógrafo de surf Chris Burkard, ao explicar sua obsessão com as praias mais geladas, violentas e isoladas do mundo. Através de fotos impressionantes e histórias de lugares em que poucos humanos já viram - e menos ainda surfaram - ele nos leva à sua "cruzada pessoal contra o mundano."

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
09:42

Portuguese, Brazilian subtitles

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