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Nossa história de estupro e reconciliação

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    [Linguagem adulta
    e descrição de violência sexual]
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    [Aconselhamos a discrição do espectador]
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    Tom Stranger: Em 1996,
    quando eu tinha 18 anos,
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    tive a oportunidade de ouro de entrar
    em um programa de intercâmbio.
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    Ironicamente, sou um australiano
    que prefere um tempo gélido,
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    então eu estava empolgado e triste,
    quando entrei num avião para a Islândia,
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    logo após ter me despedido
    de meus pais e irmãos.
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    Fui acolhido na casa
    de uma linda família islandesa
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    que me levou para caminhadas
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    e me ajudou a compreender
    a melódica língua islandesa.
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    No início, sofri um pouco
    com saudades de casa.
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    Eu praticava "snowboard" depois da escola
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    e dormia muito.
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    Duas horas de aula de química,
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    em uma língua que você não entende
    completamente, pode ser um ótimo sedativo.
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    (Risos)
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    Meu professor me sugeriu
    tentar o teatro da escola,
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    só pra me tornar mais sociável.
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    No final acabei não fazendo parte da peça,
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    mas através dela conheci Thordis.
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    Vivemos um adorável romance juvenil,
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    nos encontrávamos na hora do almoço
    para andarmos de mãos dadas
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    e passear pelo velho centro de Reykjavík.
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    Eu conheci sua família acolhedora,
    e ela conheceu meus amigos.
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    Estávamos em uma relação crescente
    há pouco mais de um mês,
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    quando se realizou
    o baile de Natal da nossa escola.
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    Thordis Elva: Eu tinha 16 anos
    e estava apaixonada pela primeira vez.
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    Ir juntos para o baile de Natal
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    era a oficialização da nossa relação,
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    e eu me sentia a garota
    mais sortuda do mundo.
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    Não era mais uma garotinha,
    mas uma jovem mulher.
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    No auge da minha nova maturidade,
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    senti que seria natural experimentar rum
    pela primeira vez naquela noite também.
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    Isso foi uma má ideia.
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    Fiquei muito mal,
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    com perdas de consciência
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    entre espasmos de vômito convulsivo.
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    Os seguranças queriam chamar
    uma ambulância para mim,
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    mas Tom agiu como o meu cavaleiro
    de armadura reluzente,
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    e disse a eles que me levaria para casa.
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    Foi como num conto de fadas,
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    seus braços fortes em volta de mim,
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    me deitando na segurança da minha cama.
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    Mas a gratidão que sentia por ele
    logo se tornou horror
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    enquanto ele tirava minhas roupas
    e ficava em cima de mim.
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    Minha mente ficou lúcida,
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    mas meu corpo ainda
    estava muito fraco pra lutar,
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    e a dor era ofuscante.
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    Eu pensei ter sido cortada em dois.
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    Para manter a sanidade,
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    eu silenciosamente contava
    os segundos no meu relógio.
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    E desde aquela noite,
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    eu soube que existem
    7,2 mil segundos em 2 horas.
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    Apesar de ficar mancando por dias
    e chorando por semanas,
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    esse incidente não se encaixava na minha
    ideia sobre estupros, como eu via na TV.
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    Tom não era um lunático armado;
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    ele era meu namorado.
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    E não aconteceu em um beco sem saída,
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    aconteceu na minha própria cama.
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    Naquela época eu não pude identificar
    o que tinha acontecido como estupro,
  • 3:00 - 3:02
    e ele tinha terminado o intercâmbio
  • 3:02 - 3:04
    e partiu para a Austrália.
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    Então eu disse a mim mesma que era
    inútil discutir o que tinha acontecido.
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    E além disso,
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    tinha que ser minha culpa de alguma forma.
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    Fui criada em um mundo
    em que ensinam às garotas
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    que elas são estupradas por uma razão.
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    Sua saia estava muito curta,
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    estavam muito sorridentes,
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    seu hálito cheirava a álcool.
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    E eu era culpada de todas essas coisas,
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    então a culpa tinha que ser minha.
  • 3:32 - 3:33
    Levei anos até perceber
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    que só uma coisa teria evitado
    que eu fosse estuprada aquela noite,
  • 3:37 - 3:39
    e não era minha saia,
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    não era meu sorriso,
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    nem minha confiança infantil.
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    A única coisa que teria evitado
    que eu fosse estuprada naquela noite
  • 3:48 - 3:50
    era o homem que me estuprou;
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    se ele tivesse parado a si mesmo.
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    TS: Tenho vagas memórias do dia seguinte:
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    as sequelas da bebida,
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    um certo vazio que eu tentei esconder.
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    Nada mais.
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    Mas eu não apareci na porta da Thordis.
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    É importante declarar agora
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    que eu não vi minha atitude
    como ela realmente era.
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    A palavra "estupro" não ecoava
    na minha mente como deveria,
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    e eu não estava me martirizando
    com as cenas da noite anterior.
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    Não era uma negação consciente,
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    era como se qualquer conhecimento
    da realidade fosse proibido.
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    Minha definição das minhas ações refutou
    completamente qualquer reconhecimento
  • 4:33 - 4:35
    do imenso trauma que eu causei à Thordis.
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    Para ser honesto,
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    eu repudiei a ação toda nos dias seguintes
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    e quando eu a estava praticando.
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    Eu repudiei a verdade me convencendo
    de que foi sexo e não estupro.
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    E essa é uma mentira
    da qual sinto imensa culpa.
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    Terminei com a Thordis alguns dias depois,
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    e então a vi algumas vezes
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    durante o resto do meu ano na Islândia,
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    sentindo uma punhalada
    no coração toda vez que a via.
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    Lá no fundo, eu sabia que tinha feito
    algo imensuravelmente errado.
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    Mas sem planejar, afoguei as memórias
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    e coloquei uma pedra em cima delas.
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    Seguiu-se um período de nove anos
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    que pode ser intitulado
    de "Negação e Fuga".
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    Quando eu tinha uma chance de identificar
    o tormento real que tinha causado,
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    não ficava parado tempo
    suficiente para fazê-lo.
  • 5:32 - 5:34
    Seja por meio da distração,
  • 5:34 - 5:36
    uso de drogas,
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    busca por adrenalina,
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    ou o policiamento escrupuloso
    da minha fala interior,
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    eu me recusei a estar parado e calado.
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    E com esse ruído,
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    também me apoiei
    em outras partes da minha vida
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    para construir uma imagem de quem eu era.
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    Eu era um surfista,
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    um estudante de ciência social,
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    um bom amigo,
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    um irmão e filho amado,
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    um guia de atividades ao ar livre,
    e, por fim, um jovem trabalhador.
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    Eu me agarrei fortemente à simples noção
    de que eu não era uma má pessoa.
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    Eu não pensava
    que tinha isso dentro de mim.
  • 6:12 - 6:14
    Achava que eu era feito de outra coisa.
  • 6:15 - 6:16
    Na minha formação,
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    minha família amorosa e exemplos a seguir,
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    as pessoas mais próximas
    eram gentis e autênticas
  • 6:22 - 6:24
    com o respeito demonstrado às mulheres.
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    Levou um longo tempo pra que eu olhasse
    esse lado sombrio de mim mesmo,
  • 6:30 - 6:31
    e questioná-lo.
  • 6:34 - 6:36
    TE: Nove anos após o baile de Natal,
  • 6:36 - 6:38
    eu tinha 25 anos,
  • 6:38 - 6:40
    e tive um colapso nervoso.
  • 6:41 - 6:45
    Meu amor-próprio estava enterrado
    sob um silêncio esmagador
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    que me isolou de todos
    com quem eu me importava,
  • 6:48 - 6:51
    e eu era consumida com ódio
    e raiva fora de controle
  • 6:51 - 6:53
    que eu descontava em mim mesma.
  • 6:54 - 6:56
    Um dia, eu saí correndo
    pela porta em lágrimas
  • 6:56 - 6:58
    depois de uma discussão
    com alguém que gostava,
  • 6:58 - 7:00
    e entrei em um café,
  • 7:00 - 7:02
    onde pedi uma caneta à garçonete.
  • 7:03 - 7:04
    Eu sempre tinha um caderno comigo,
  • 7:05 - 7:08
    dizendo que era para anotar ideias
    em momentos de inspiração,
  • 7:08 - 7:13
    mas a verdade era que eu precisava
    estar constantemente inquieta,
  • 7:13 - 7:14
    porque em momentos de imobilidade,
  • 7:14 - 7:17
    me pegava contado os segundos de novo.
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    Mas naquele dia, vi com admiração
    as palavras saírem da minha caneta,
  • 7:23 - 7:26
    formando a carta mais significativa
    que eu já havia escrito,
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    endereçada ao Tom.
  • 7:28 - 7:32
    Junto com o relato da violência
    a que ele me submetera,
  • 7:32 - 7:35
    as palavras "eu quero encontrar perdão"
  • 7:35 - 7:37
    olhavam de volta pra mim,
  • 7:37 - 7:39
    surpreendendo ninguém mais que eu mesma.
  • 7:40 - 7:44
    Mas lá no fundo eu percebi que essa
    era a saída para o meu sofrimento,
  • 7:44 - 7:48
    porque independentemente
    de ele merecer ou não meu perdão,
  • 7:48 - 7:51
    eu merecia paz.
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    Minha era de vergonha havia acabado.
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    Antes de mandar a carta,
  • 7:58 - 8:00
    eu me preparei para todo
    tipo de resposta negativa,
  • 8:00 - 8:04
    ou, o que eu achava mais provável,
    nenhuma resposta.
  • 8:05 - 8:08
    O único resultado para o qual
    eu não estava preparada
  • 8:08 - 8:10
    era o que eu recebi:
  • 8:10 - 8:15
    uma confissão escrita por Tom,
    cheia de remorsos.
  • 8:16 - 8:20
    Acabou que ele também tinha sido
    aprisionado pelo silêncio.
  • 8:20 - 8:24
    E isso marcou o começo
    de oito anos de correspondência
  • 8:24 - 8:27
    que Deus sabe, nunca foi fácil,
  • 8:27 - 8:29
    mas sempre honesta.
  • 8:30 - 8:33
    Eu me livrei do peso que eu tinha
    erroneamente suportado,
  • 8:33 - 8:37
    e ele, em troca, assumiu
    totalmente o que havia feito.
  • 8:37 - 8:39
    As cartas que trocamos
    viraram uma plataforma
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    para dissecar as consequências
    daquela noite,
  • 8:42 - 8:45
    e foram tudo, de algo medonho
  • 8:45 - 8:47
    à cura além das palavras.
  • 8:48 - 8:52
    E ainda assim, isso não trouxe
    um encerramento para mim.
  • 8:52 - 8:56
    Talvez porque e-mails não parecem
    suficientemente pessoais,
  • 8:56 - 8:58
    talvez porque seja mais fácil ser corajoso
  • 8:58 - 9:02
    quando se está escondido atrás de uma tela
    de computador do outro lado do mundo.
  • 9:02 - 9:04
    Mas tínhamos começado um diálogo
  • 9:04 - 9:08
    que eu sentia ser necessário
    explorar ao máximo.
  • 9:08 - 9:10
    Então, após oito anos de escrita,
  • 9:10 - 9:14
    e aproximadamente 16 anos
    após aquela noite terrível,
  • 9:14 - 9:18
    eu uni forças para propor
    uma ideia selvagem:
  • 9:18 - 9:19
    que nos encontrássemos pessoalmente
  • 9:19 - 9:22
    para enfrentar nosso passado
    de uma vez por todas.
  • 9:25 - 9:28
    TS: Islândia e Austrália são
    geograficamente assim.
  • 9:29 - 9:31
    No meio das duas fica a África do Sul.
  • 9:32 - 9:35
    Nós optamos pela cidade de Cape Town,
  • 9:35 - 9:37
    e lá nos encontramos por uma semana.
  • 9:38 - 9:42
    A cidade mostrou ser um ambiente
    poderoso e deslumbrante
  • 9:42 - 9:45
    para enfatizar a reconciliação e o perdão.
  • 9:46 - 9:49
    Em nenhum outro lugar a cura
    e a reaproximação foram testados
  • 9:49 - 9:50
    como na África do Sul.
  • 9:51 - 9:55
    Como uma nação, a África do Sul buscou
    entrar na verdade do seu passado,
  • 9:55 - 9:57
    e ouvir aos detalhes de sua história.
  • 9:59 - 10:03
    Saber disso apenas ampliou o efeito
    que Cape Town teve sobre nós.
  • 10:04 - 10:05
    Durante essa semana,
  • 10:05 - 10:08
    literalmente contamos nossas
    histórias de vida um ao outro,
  • 10:08 - 10:10
    do começo ao fim;
  • 10:11 - 10:14
    o intuito era analisar
    nossa própria história.
  • 10:16 - 10:18
    Seguimos regras rígidas
    de sermos honestos,
  • 10:18 - 10:21
    e isso também trouxe uma certa exposição,
  • 10:21 - 10:23
    e uma vulnerabilidade de coração aberto.
  • 10:24 - 10:26
    Houve confissões pesadas,
  • 10:26 - 10:29
    e momentos em que simplesmente
    não podíamos compreender
  • 10:29 - 10:31
    a experiência do outro.
  • 10:32 - 10:37
    O efeito sísmico da violência sexual
    foi falado em voz alta e sentido,
  • 10:37 - 10:39
    face a face.
  • 10:40 - 10:41
    Em outros momentos, no entanto,
  • 10:42 - 10:44
    nós encontramos
    uma crescente transparência,
  • 10:45 - 10:50
    e até mesmo algumas totalmente
    inesperadas e libertadoras gargalhadas.
  • 10:51 - 10:53
    No fim das contas,
  • 10:53 - 10:56
    fizemos nosso melhor para ouvir
    atentamente um ao outro.
  • 10:57 - 11:03
    E nossas realidades individuais foram
    transmitidas com uma pureza clara
  • 11:03 - 11:06
    que não podia fazer nada menos
    do que limpar a alma.
  • 11:09 - 11:13
    TE: Querer a vingança
    é um sentimento muito humano,
  • 11:13 - 11:14
    até mesmo instintivo.
  • 11:15 - 11:17
    E tudo o que eu quis fazer, durante anos,
  • 11:17 - 11:21
    era machucar Tom tão profundamente
    quanto ele tinha me machucado.
  • 11:22 - 11:25
    Mas se eu não tivesse encontrado
    uma saída para o ódio e a raiva,
  • 11:25 - 11:27
    não sei se estaria em pé aqui hoje.
  • 11:28 - 11:32
    Isso não significa que eu não tive
    minhas dúvidas ao longo do caminho.
  • 11:33 - 11:36
    Quando o avião chegou naquela
    pista de pouso em Cape Town,
  • 11:36 - 11:38
    me lembro de ter pensado:
  • 11:38 - 11:42
    "Porque eu não apenas paguei um terapeuta
    e peguei uma garrafa de vodka para mim
  • 11:42 - 11:44
    como uma pessoa normal faria?"
  • 11:44 - 11:47
    (Risos)
  • 11:47 - 11:51
    Algumas vezes, nossa busca
    por compreensão em Cape Town
  • 11:51 - 11:53
    parecia uma busca impossível,
  • 11:53 - 11:56
    e tudo o que eu queria
    era desistir e ir pra casa,
  • 11:56 - 11:58
    para o meu amado marido,
    Vidir, e nosso filho.
  • 12:00 - 12:02
    Mas, apesar das nossas dificuldades,
  • 12:02 - 12:07
    essa jornada resultou
    em um sentimento vitorioso,
  • 12:07 - 12:10
    de que a luz triunfou sobre as trevas,
  • 12:11 - 12:15
    e que algo positivo podia
    ser construído das ruínas.
  • 12:17 - 12:18
    Eu li em algum lugar
  • 12:18 - 12:22
    que você deve tentar ser a pessoa
    de que você precisava quando era jovem.
  • 12:22 - 12:23
    E quando eu era adolescente
  • 12:23 - 12:27
    eu precisava saber
    que a vergonha não era minha,
  • 12:27 - 12:30
    que há esperança após o estupro,
  • 12:30 - 12:34
    que se pode até encontrar a felicidade,
    como a que divido com meu marido hoje.
  • 12:34 - 12:38
    Essa é a razão de eu começar a escrever
    febrilmente após meu retorno de Cape Town,
  • 12:38 - 12:41
    resultando em um livro
    do qual o Tom foi coautor,
  • 12:41 - 12:44
    que esperamos possa ser útil
    para pessoas de ambos os lados
  • 12:44 - 12:47
    da escala agressor-sobrevivente.
  • 12:47 - 12:49
    No mínimo,
  • 12:49 - 12:53
    é uma história que nós precisávamos
    ouvir quando éramos mais jovens.
  • 12:55 - 12:57
    Dada a natureza da nossa história,
  • 12:57 - 12:59
    eu sei as palavras
    que inevitavelmente a acompanham:
  • 13:00 - 13:02
    vítima, estuprador...
  • 13:03 - 13:05
    os rótulos são maneiras
    de organizar conceitos,
  • 13:05 - 13:09
    mas eles podem também ser
    desumanizadores em suas conotações.
  • 13:10 - 13:12
    Uma vez que alguém é considerado vítima,
  • 13:12 - 13:17
    é muito mais fácil encaixá-lo
    como alguém danificado,
  • 13:17 - 13:19
    desonrado,
  • 13:19 - 13:20
    inferior.
  • 13:21 - 13:23
    Da mesma forma, quando alguém
    é visto como um estuprador,
  • 13:23 - 13:26
    é muito mais fácil chamá-lo de monstro,
  • 13:27 - 13:28
    desumano.
  • 13:29 - 13:32
    Mas como vamos entender o que existe
    nas sociedades humanas,
  • 13:32 - 13:33
    que produz a violência,
  • 13:33 - 13:38
    se nos recusamos a reconhecer
    a humanidade daqueles que a cometem?
  • 13:39 - 13:40
    E como...
  • 13:40 - 13:42
    (Aplausos)
  • 13:42 - 13:44
    E como podemos empoderar os sobreviventes,
  • 13:44 - 13:48
    se fazemos com que eles
    se sintam inferiores?
  • 13:48 - 13:51
    Como podemos discutir soluções
    para uma das maiores ameaças
  • 13:52 - 13:55
    às vidas de mulheres e crianças
    ao redor do mundo,
  • 13:55 - 13:59
    se até mesmo as palavras que usamos
    são parte do problema?
  • 14:02 - 14:04
    TS: Com o que eu aprendi agora,
  • 14:04 - 14:09
    minhas ações naquela noite em 1996
    foram uma ação egocêntrica.
  • 14:10 - 14:12
    Eu me senti merecedor do corpo da Thordis.
  • 14:14 - 14:17
    Eu tive influências sociais
    essencialmente positivas
  • 14:17 - 14:19
    e exemplos de comportamento
    correto ao meu redor.
  • 14:20 - 14:21
    Mas naquela ocasião,
  • 14:21 - 14:23
    eu escolhi me basear nos negativos.
  • 14:24 - 14:27
    Os que veem as mulheres
    com menos valor intrínseco,
  • 14:28 - 14:32
    e homens tendo algumas exigências
    simbólicas e não faladas de seus corpos.
  • 14:34 - 14:37
    Porém, essas influências de que falo,
    são exteriores a mim.
  • 14:38 - 14:40
    E era somente eu naquele quarto
    fazendo escolhas,
  • 14:40 - 14:42
    ninguém mais.
  • 14:43 - 14:45
    Quando você possui algo
  • 14:45 - 14:47
    e realmente encara a sua culpa,
  • 14:48 - 14:51
    acredito que algo surpreendente
    pode acontecer.
  • 14:51 - 14:54
    É o que eu chamo de paradoxo da posse.
  • 14:55 - 14:58
    Pensei que me curvaria
    sob o peso da responsabilidade.
  • 14:58 - 15:01
    Pensei que meu certificado
    de humanidade seria queimado.
  • 15:02 - 15:06
    Mas em vez disso, me foi oferecido
    realmente ser dono que eu havia feito,
  • 15:07 - 15:10
    e descobrir que eu não possuía
    o todo de quem eu sou.
  • 15:11 - 15:13
    Simplificando,
  • 15:13 - 15:17
    algo que você fez não tem
    que fazer parte do que você é.
  • 15:19 - 15:20
    O barulho na minha cabeça diminuiu.
  • 15:21 - 15:25
    A indulgente auto-piedade
    estava com falta de ar,
  • 15:25 - 15:29
    e foi substituída
    pelo ar puro da aceitação;
  • 15:31 - 15:35
    a aceitação de que eu magoei essa pessoa
    maravilhosa que está aqui ao meu lado;
  • 15:35 - 15:41
    a aceitação de que sou parte
    de um grande grupo de homens
  • 15:41 - 15:43
    que foram sexualmente violentos
    com suas parceiras.
  • 15:45 - 15:47
    Não subestime o poder das palavras.
  • 15:48 - 15:53
    Dizer a Thordis que eu a estuprei
    mudou meu acordo comigo mesmo,
  • 15:53 - 15:55
    e meu acordo com ela.
  • 15:56 - 15:57
    Mas mais importante,
  • 15:57 - 16:00
    a culpa foi transferida
    da Thordis para mim.
  • 16:01 - 16:02
    Com muita frequência,
  • 16:03 - 16:07
    a responsabilidade é atribuída
    às sobreviventes da violência sexual,
  • 16:07 - 16:10
    e não aos homens que fizeram isso.
  • 16:11 - 16:12
    Com muita frequência,
  • 16:12 - 16:17
    a negação e a fuga deixa ambas as partes
    muito distantes da verdade.
  • 16:19 - 16:22
    Há um diálogo público ocorrendo agora,
  • 16:22 - 16:25
    e, como um número grande de pessoas,
  • 16:25 - 16:27
    estamos satisfeitos que haja menos recuo
  • 16:27 - 16:30
    nessa difícil mas importante discussão.
  • 16:31 - 16:35
    Eu sinto uma responsabilidade real
    de adicionar nossas vozes a ela.
  • 16:38 - 16:43
    TE: O que fizemos não é uma fórmula
    que estamos prescrevendo aos outros.
  • 16:43 - 16:49
    Ninguém tem o direito de dizer aos outros
    como lidar com sua dor mais profunda
  • 16:49 - 16:50
    ou o seu maior erro.
  • 16:51 - 16:54
    Quebrar o silêncio nunca é fácil,
  • 16:54 - 16:56
    e dependendo do lugar onde vive,
  • 16:56 - 16:59
    pode até ser mortal falar sobre estupro.
  • 17:00 - 17:04
    Eu percebi que mesmo o evento
    mais traumático da minha vida
  • 17:04 - 17:07
    ainda é uma prova do meu privilégio,
  • 17:07 - 17:10
    porque eu posso falar sobre isso
    sem ser excluída,
  • 17:10 - 17:12
    ou mesmo assassinada.
  • 17:12 - 17:15
    Mas, com o privilégio de ter voz,
  • 17:15 - 17:18
    vem a responsabilidade de usá-la.
  • 17:19 - 17:23
    É o mínimo que posso fazer pelas minhas
    companheiras sobreviventes que não podem.
  • 17:25 - 17:28
    A história que acabamos de contar é única,
  • 17:28 - 17:29
    e mesmo assim é muito comum,
  • 17:29 - 17:33
    com a violência sexual
    sendo uma pandemia mundial.
  • 17:33 - 17:35
    Mas não tem que ser desse jeito.
  • 17:36 - 17:39
    Uma das coisas que achei ser útil,
    na minha jornada pela cura,
  • 17:39 - 17:41
    foi aprender sobre violência sexual.
  • 17:41 - 17:44
    E como resultado eu tenho lido, escrito
  • 17:44 - 17:47
    e falado sobre esse assunto
    por mais de uma década,
  • 17:47 - 17:49
    participando de conferências mundo afora.
  • 17:49 - 17:51
    E na minha experiência,
  • 17:51 - 17:56
    as pessoas que participam desses eventos
    são quase exclusivamente mulheres.
  • 17:57 - 18:04
    É hora de parar de tratar a violência
    sexual como questão feminina.
  • 18:04 - 18:09
    (Aplausos)
  • 18:17 - 18:21
    A maior parte da violência sexual
    contra mulheres e homens
  • 18:21 - 18:23
    é causada por homens.
  • 18:23 - 18:27
    E ainda assim suas vozes são seriamente
    pouco representadas nessa discussão.
  • 18:29 - 18:33
    Mas todos nós somos necessários aqui.
  • 18:34 - 18:38
    Apenas imaginem todo o sofrimento
    que poderíamos aliviar
  • 18:38 - 18:42
    se ousarmos enfrentar esse assunto juntos.
  • 18:43 - 18:44
    Obrigada.
  • 18:44 - 18:48
    (Aplausos)
Title:
Nossa história de estupro e reconciliação
Speaker:
Thordis Elva, Tom Stranger
Description:

Em 1996, Thordis Elva dividiu um romance adolescente com Tom Stranger, um estudante de intercâmbio da Austrália. Após um baile na escola, Tom estuprou Thordis, e depois disso seus caminhos se distanciaram por muitos anos. Nesta palestra extraordinária, Elva e Stranger discorrem sobre uma cronologia de diversos anos de vergonha e silêncio, e nos convidam a discutir o assunto globalmente onipresente da violência sexual de uma maneira nova e honesta.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
22:48

Portuguese, Brazilian subtitles

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