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Como um verme marinho me revelou o segredo do sangue universal | Franck Zal | TEDxParis

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    Segundo a Organização Mundial da Saúde,
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    faltam 100 milhões de litros
    de sangue, no mundo,
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    para satisfazer as necessidades
    da população mundial.
  • 0:20 - 0:23
    O Instituto Francês do Sangue
    informa-nos
  • 0:23 - 0:29
    que 90% dos franceses sabem
    que doar sangue pode salvar vidas.
  • 0:30 - 0:32
    Apesar deste número,
  • 0:32 - 0:36
    só 4% realizam este gesto,
    todos os anos.
  • 0:38 - 0:42
    Este cenário reproduz-se
    na maioria dos países industrializados.
  • 0:43 - 0:48
    Perante esta discrepância
    entre a doação de sangue humano
  • 0:48 - 0:51
    e as necessidades da população mundial,
  • 0:51 - 0:55
    é preciso encontrar
    uma alternativa a esta prática,
  • 0:55 - 0:58
    a fim de responder a este problema
    de saúde pública.
  • 1:01 - 1:06
    Por muito estranho que possa parecer,
    talvez tenha encontrado uma das soluções.
  • 1:08 - 1:11
    Encontrei essa solução
    numa praia na Bretanha.
  • 1:13 - 1:17
    Já em pequeno, me sentia fascinado
    pelos oceanos
  • 1:17 - 1:21
    e penso que as emissões
    do comandante Cousteau
  • 1:21 - 1:23
    contribuíram para isso.
  • 1:23 - 1:27
    Portanto, muito naturalmente,
    decidi seguir esta profissão
  • 1:27 - 1:29
    e sou doutorado em biologia marinha.
  • 1:30 - 1:34
    Houve um ambiente que
    cedo atraiu a minha atenção
  • 1:34 - 1:39
    porque esse ambiente era colonizado
    por organismos muito antigos.
  • 1:39 - 1:41
    Esse ambiente é o interestual,
  • 1:41 - 1:44
    ou seja, um nome científico
    para um ambiente que devem apreciar,
  • 1:44 - 1:46
    porque é a praia.
  • 1:47 - 1:52
    A praia na Bretanha é coberta,
    duas vezes por dia, pela maré.
  • 1:53 - 1:59
    A areia dessa praia abriga
    organismos muito antigos
  • 1:59 - 2:02
    que certamente conhecem,
  • 2:02 - 2:06
    pelos vestígios que esses organismos
    deixam na areia,
  • 2:06 - 2:08
    quando lá colocam as toalhas.
  • 2:09 - 2:14
    Esses vestígios testemunham
    a presença de um organismo marinho
  • 2:14 - 2:19
    a que chamamos a arenícola.
  • 2:19 - 2:21
    A arenícola
  • 2:21 - 2:26
    é o nome de um verme marinho
    muito conhecido nas praias da Bretanha,
  • 2:26 - 2:29
    e o seu nome em bretão é "buzuc".
  • 2:29 - 2:32
    Eu interessei-me por este verme marinho
  • 2:32 - 2:36
    para responder a questões
    de ecofisiologia respiratória.
  • 2:36 - 2:38
    O que é que isto quer dizer?
  • 2:38 - 2:41
    É simples, interessava-me
    pela respiração deste verme marinho.
  • 2:41 - 2:44
    Tentava perceber como
    é que esse verme respirava
  • 2:44 - 2:47
    entre a maré alta e a maré baixa.
  • 2:48 - 2:51
    Para responder a esta pergunta
    de investigação fundamental,
  • 2:51 - 2:52
    (Risos)
  • 2:52 - 2:56
    interessei-me pelo sangue do animal.
  • 2:57 - 3:02
    O sangue é um fluido biológico
    extremamente interessante.
  • 3:02 - 3:06
    Faz a interface entre
    a fisiologia de um organismo
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    e o seu ambiente.
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    O sangue é formado
    por diferentes células,
  • 3:16 - 3:19
    mas a molécula que transporta o oxigénio,
  • 3:20 - 3:23
    o oxigénio indispensável
    a todos os organismos vivos,
  • 3:23 - 3:28
    é um pouco — se eu usar
    um exemplo ligado à mecânica —
  • 3:28 - 3:33
    o oxigénio é como o carburante
    que metemos no nosso carro.
  • 3:34 - 3:36
    Sem carburante, é a paragem total.
  • 3:36 - 3:39
    Sem oxigénio, é morte garantida.
  • 3:40 - 3:41
    Com efeito,
  • 3:41 - 3:47
    o sangue contém um tipo de células
    a que chamamos os glóbulos vermelhos.
  • 3:47 - 3:50
    Os glóbulos vermelhos
    são um pequeno veículo
  • 3:50 - 3:53
    que vai encaminhar o gás
    para as células do organismo.
  • 3:54 - 3:55
    Para ser mais preciso,
  • 3:55 - 4:00
    essa molécula contém uma proteína
    a que chamamos hemoglobina.
  • 4:01 - 4:05
    A hemoglobina é uma molécula
    capaz de ligar o oxigénio reversivamente.
  • 4:07 - 4:09
    Qual não foi a minha surpresa
  • 4:09 - 4:13
    descobrir que o sangue
    deste verme marinho, aqui presente,
  • 4:13 - 4:15
    não tinha glóbulos vermelhos.
  • 4:16 - 4:18
    Tenho de ser honesto,
  • 4:18 - 4:22
    No início da minha descoberta,
    ignorava a amplitude deste trabalho.
  • 4:22 - 4:25
    Mas a minha descoberta
    chegou aos ouvidos de um clube de sábios,
  • 4:25 - 4:27
    que se chama Clube do Glóbulo Vermelho.
  • 4:27 - 4:29
    (Risos)
  • 4:29 - 4:34
    Portanto, fui convidado a Paris,
    a um hospital parisiense,
  • 4:34 - 4:37
    para apresentar os meus trabalhos
    de investigação
  • 4:37 - 4:40
    perante uma plateia de médicos,
    de hematologistas.
  • 4:40 - 4:44
    No fim da minha conferência científica,
  • 4:45 - 4:47
    vários deles desceram ao anfiteatro
  • 4:47 - 4:50
    e fizeram-me estas perguntas:
  • 4:50 - 4:53
    "Mas não encontrou esta molécula,
    que tem esta estrutura,
  • 4:53 - 4:55
    "que tem esta função?"
  • 4:55 - 4:56
    "Encontrei, sim".
  • 4:57 - 4:59
    "Mas andamos à procura
    dessa molécula há mais de 40 anos
  • 4:59 - 5:02
    "para fazer um substituto
    universal de sangue!"
  • 5:03 - 5:10
    Todos nós temos
    um grupo sanguíneo A, ou B, ou O.
  • 5:10 - 5:13
    Rhesus positivo ou Rhesus negativo.
  • 5:14 - 5:18
    Só o O negativo é do tipo
    de doador universal.
  • 5:19 - 5:21
    A ausência de glóbulos vermelhos
    neste animal
  • 5:22 - 5:25
    conferia a esta molécula
    um carácter universal.
  • 5:28 - 5:32
    Quando voltei ao laboratório,
    a fim de testar esta hipótese,
  • 5:32 - 5:37
    apressei-me a ir à praia
    apanhar umas centenas de arenícolas,
  • 5:38 - 5:41
    para experimentar apanhar
    a hemoglobina
  • 5:41 - 5:44
    contida no sistema circulatório,
  • 5:45 - 5:48
    Depois da purificação dessa molécula
  • 5:48 - 5:51
    por técnicas clássicas de laboratório,
  • 5:51 - 5:54
    apressei-me a fazer transfusões
    em roedores.
  • 5:55 - 5:58
    Qual não foi a minha surpresa,
  • 5:58 - 6:02
    depois de extrair mais de 80%
    de sangue a esses animais,
  • 6:03 - 6:06
    fiz a transfusão dessa molécula
    nesses animais
  • 6:08 - 6:10
    e não aconteceu nada.
  • 6:10 - 6:11
    (Risos)
  • 6:11 - 6:14
    Os organismos daqueles roedores,
  • 6:14 - 6:17
    viviam com a hemoglobina
    do verme marinho.
  • 6:18 - 6:20
    Uma descoberta fantástica
  • 6:20 - 6:23
    e hoje uma esperança enorme
    para a medicina.
  • 6:23 - 6:26
    Um gesto de desdém para os céticos
    que me perguntaram:
  • 6:26 - 6:29
    "Mas para que serve estudar
    a respiração dum verme marinho?"
  • 6:29 - 6:31
    (Risos)
  • 6:31 - 6:35
    "Não tens outras coisas a fazer
    num laboratório do CNRS?"
  • 6:35 - 6:37
    (Risos)
  • 6:38 - 6:42
    Para acompanhar
    estes trabalhos de investigação,
  • 6:42 - 6:48
    fui obrigado a deixar o CNRS,
    para criar uma sociedade de biotecnologia
  • 6:48 - 6:53
    que se encarregará
    de desenvolver estas moléculas
  • 6:53 - 6:55
    para aplicações médicas.
  • 6:57 - 7:01
    Bastam umas centenas
    de gramas de arenícolas
  • 7:01 - 7:06
    para fazer uma bolsa de tipo globular.
  • 7:07 - 7:11
    As aplicações desta molécula
    são numerosas.
  • 7:12 - 7:13
    Porquê?
  • 7:13 - 7:16
    Simplesmente porque o oxigénio
  • 7:16 - 7:20
    está no centro de todos os processos
    biológicos e fisiológicos
  • 7:21 - 7:24
    ou seja, em última análise, da vida.
  • 7:25 - 7:30
    Passei os primeiros anos
    da criação desta sociedade
  • 7:30 - 7:35
    a desenvolver um processo industrial
  • 7:35 - 7:37
    de produção dos meus vermes marinhos.
  • 7:37 - 7:39
    Enquanto biólogo,
  • 7:39 - 7:43
    estava fora de questão eu ir dar cabo
    da fauna de todas as praias da Bretanha.
  • 7:43 - 7:48
    Hoje, estes vermes são criados
    em aquacultura
  • 7:48 - 7:52
    num ambiente totalmente
    controlado e acompanhado.
  • 7:52 - 7:55
    Na aquacultura, produzem-se
  • 7:55 - 7:58
    várias centenas de toneladas deste animal.
  • 7:58 - 8:02
    Pondo o verme de parte,
    a matéria-prima, a biomassa,
  • 8:02 - 8:06
    era preciso também encontrar
    um sistema de produção industrial
  • 8:06 - 8:09
    de extração das moléculas
    em condições farmacêuticas.
  • 8:10 - 8:12
    Hoje, temos todo um processo
  • 8:12 - 8:17
    que permite extrair
    as moléculas da biomassa,
  • 8:18 - 8:23
    A partir deste processo industrial,
    e da produção de vermes marinhos,
  • 8:23 - 8:26
    as aplicações são extremamente numerosas.
  • 8:27 - 8:30
    Vou citar apenas três,
    mas são imensas.
  • 8:30 - 8:32
    Primeiro, é a transfusão de sangue.
  • 8:32 - 8:35
    Quando damos o nosso sangue,
  • 8:35 - 8:39
    uma bolsa de sangue pode
    ser conservada durante 42 dias,
  • 8:39 - 8:42
    porque os glóbulos vermelhos
    são perecíveis.
  • 8:42 - 8:48
    Além disso, tem de se manter
    no frio, a 4º Celsius.
  • 8:49 - 8:53
    Lembro-vos que esta molécula
    não está contida num glóbulo vermelho.
  • 8:53 - 8:59
    É assim possível obter sangue liofilizado,
  • 8:59 - 9:01
    ou seja, sangue em pó,
  • 9:01 - 9:05
    que podemos voltar a pôr numa solução
    graças à água farmacêutica.
  • 9:05 - 9:08
    Portanto, deixa de haver
    o problema de armazenamento.
  • 9:08 - 9:11
    Deixa de haver o problema
    de conservação a 4º C.
  • 9:11 - 9:15
    Este produto pode estar disponível
    rapidamente em zonas de urgência,
  • 9:15 - 9:17
    em zonas de cataclismos,
  • 9:17 - 9:19
    onde há grande necessidade
    de transfusões de sangue.
  • 9:20 - 9:23
    Este produto está hoje
    em desenvolvimento,
  • 9:23 - 9:26
    graças a uma parceria que temos
    com o exército americano.
  • 9:27 - 9:32
    A segunda aplicação é a cicatrização
  • 9:32 - 9:34
    para qualquer tipo de ferida.
  • 9:34 - 9:38
    Feridas que encontramos em pessoas
    que sofrem de diabetes,
  • 9:38 - 9:40
    a que chamamos a síndroma
    do pé diabético,
  • 9:40 - 9:44
    pessoas que sofrem de escaras,
    de grandes queimaduras,
  • 9:44 - 9:47
    todas essas feridas têm
    a característica de cicatrizarem mal.
  • 9:47 - 9:48
    Porquê?
  • 9:48 - 9:52
    Porque a circulação de sangue
    é deficiente.
  • 9:53 - 9:54
    Infelizmente,
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    as feridas que encontramos
    nas pessoas que sofrem de diabetes
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    acabam geralmente mal
  • 10:01 - 10:04
    porque a maioria dessas pessoas
    são amputadas.
  • 10:04 - 10:08
    Isto abrange 20 milhões de pessoas
    em todo o mundo.
  • 10:09 - 10:14
    Demonstrámos que pensos
    impregnados com esta molécula
  • 10:14 - 10:18
    podiam fornecer oxigénio
    a nível dos pés,
  • 10:18 - 10:23
    ao nível dessas feridas,
    e, portanto, evitar a amputação.
  • 10:24 - 10:29
    A terceira destas aplicações
    que é hoje a mais bem conseguida,
  • 10:29 - 10:32
    porque, no fim do ano
    vai haver uma experiência num homem,
  • 10:32 - 10:34
    é o transplante de órgãos.
  • 10:34 - 10:40
    Em França, morrem por ano
    500 pessoas, por falta de transplantes
  • 10:40 - 10:43
    numa lista de espera de 19 000 doentes.
  • 10:44 - 10:45
    Porquê?
  • 10:46 - 10:50
    Porque as soluções que se utilizam
    atualmente nas clínicas
  • 10:50 - 10:57
    são compostas só por água e sal,
    sem qualquer transportador de oxigénio.
  • 10:57 - 11:00
    Quando se retira um órgão a um doador,
  • 11:00 - 11:04
    ele fica imediatamente privado
    da circulação sanguínea.
  • 11:04 - 11:09
    Pudemos demonstrar que,
    utilizando esta molécula,
  • 11:09 - 11:12
    era possível aumentar
    consideravelmente
  • 11:13 - 11:15
    o tempo de conservação dum transplante.
  • 11:15 - 11:17
    Atualmente, o prazo de um coração
    é de quatro horas
  • 11:17 - 11:21
    entre a recolha no doador e o momento
    em que vai se colocado no recetor.
  • 11:21 - 11:22
    Num rim, é de 12 horas.
  • 11:22 - 11:24
    Com esta molécula, atualmente,
  • 11:24 - 11:28
    podemos duplicar o tempo
    de conservação destes órgãos
  • 11:28 - 11:31
    e multiplicar por quatro
    o tempo de conservação de um rim.
  • 11:31 - 11:34
    Portanto, atualmente, podemos aumentar
  • 11:34 - 11:37
    a bolsa de enxertos disponíveis
    para transplante.
  • 11:38 - 11:40
    A investigação avança
  • 11:40 - 11:44
    mas não avança tão depressa
    como desejaríamos.
  • 11:44 - 11:46
    Porquê?
  • 11:46 - 11:49
    Porque o ciclo do medicamento é longo,
  • 11:49 - 11:50
    muito longo,
  • 11:50 - 11:52
    muito, muito longo.
  • 11:52 - 11:56
    Enquanto esperamos que seja posto
    no mercado o nosso produto
  • 11:56 - 12:01
    que poderá salvar milhões
    de vidas em todo o mundo,
  • 12:01 - 12:04
    só posso incitar-vos a dar sangue.
  • 12:04 - 12:07
    Sejam generosos para salvar vidas.
  • 12:07 - 12:11
    E um conselho entre amigos,
    façam-no depressa
  • 12:11 - 12:13
    porque, amanhã, poderá ser
    um gesto já ultrapassado.
  • 12:14 - 12:15
    Obrigado.
  • 12:15 - 12:18
    (Aplausos)
Title:
Como um verme marinho me revelou o segredo do sangue universal | Franck Zal | TEDxParis
Description:

Foi ao estudar o sistema de respiração dum verme marinho que coloniza as praias da Bretanha que o doutor Zal descobriu, quase por acaso, um substituto sanguíneo universal que pode substituir os 100 milhões de litros de sangue em falta todos os anos.

Esta palestra foi feita num evento TEDx usando o formato de palestras TED, mas organizado independentemente por uma comunidade local. Saiba mais em http://ted.com/tedx

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Video Language:
French
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
12:22

Portuguese subtitles

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