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Ninguém devia morrer por viver longe de um médico

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    Quero partilhar convosco
    uma coisa que o meu pai me ensinou:
  • 0:05 - 0:08
    "Nenhuma situação é permanente".
  • 0:09 - 0:12
    É uma lição que ele me ensinou
    vezes e vezes sem conta
  • 0:12 - 0:16
    e eu aprendi que era verdade
    da maneira mais difícil.
  • 0:17 - 0:20
    Aquele sou eu no 4.º ano,
  • 0:20 - 0:23
    Esta é a fotografia do livro de curso
    tirada na minha turma da escola,
  • 0:23 - 0:25
    em Monróvia, na Libéria.
  • 0:26 - 0:30
    Os meus pais emigraram da Índia
    para a África Ocidental nos anos 70
  • 0:30 - 0:33
    e eu tive o privilégio de crescer ali.
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    Tinha nove anos.
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    Adorava andar aos pontapés a uma bola
  • 0:37 - 0:39
    e era fanático por matemática e ciências.
  • 0:39 - 0:43
    Vivia o tipo de vida
    com que qualquer criança sonharia.
  • 0:45 - 0:48
    Mas nenhuma situação é permanente.
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    Na véspera do Natal, em 1989,
  • 0:51 - 0:54
    rebentou a guerra na Libéria.
  • 0:55 - 0:57
    A guerra começou na zona rural,
  • 0:57 - 1:00
    e, em poucos meses, os exércitos rebeldes
    avançaram até à nossa cidade.
  • 1:01 - 1:02
    A minha escola foi encerrada
  • 1:02 - 1:06
    e, quando os exércitos rebeldes
    tomaram o único aeroporto internacional,
  • 1:06 - 1:09
    as pessoas entraram em pânico
    e começaram a fugir.
  • 1:10 - 1:12
    Um dia, a minha mãe
    bateu à porta e disse:
  • 1:12 - 1:14
    "Raj, arranja as tuas coisas,
    temos que ir".
  • 1:15 - 1:17
    Fomos levados à pressa
    para o centro da cidade
  • 1:17 - 1:21
    e ali, no meio da estrada,
    fomos divididos em duas filas.
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    Eu fiquei com a minha família
    numa das filas
  • 1:25 - 1:28
    e enfiaram-nos pela porta do porão
  • 1:28 - 1:29
    de um avião de resgate.
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    Fiquei ali, sentado num banco,
    com o coração aos pulos.
  • 1:32 - 1:35
    Olhei pela porta aberta
  • 1:35 - 1:38
    e vi centenas de libérios na outra fila,
  • 1:38 - 1:41
    as crianças atadas às costas.
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    Quando tentaram embarcar
    para o pé de nós,
  • 1:43 - 1:46
    vi que os soldados os impediam.
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    Não lhes permitiam fugir.
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    Nós éramos os que tínhamos sorte.
  • 1:51 - 1:53
    Perdemos tudo o que tínhamos,
  • 1:53 - 1:56
    mas fomos enviados para os EUA,
  • 1:56 - 1:59
    e, enquanto imigrantes, beneficiámos
    da comunidade de apoiantes
  • 1:59 - 2:00
    que se reuniram à nossa volta.
  • 2:02 - 2:04
    Levaram a minha família
    para casa deles,
  • 2:04 - 2:06
    tomaram conta de mim.
  • 2:06 - 2:08
    Ajudaram o meu pai
    a iniciar uma loja de vestuário.
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    Eu visitava o meu pai
    aos fins-de-semana, em adolescente,
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    para ajudá-lo a vender ténis e "jeans".
  • 2:13 - 2:15
    Sempre que os negócios corriam mal,
  • 2:15 - 2:18
    ele recordava-me aquele mantra:
  • 2:18 - 2:20
    "Nenhuma situação é permanente".
  • 2:21 - 2:22
    Aquele mantra, a persistência dos meus pais
    e aquela comunidade de apoiantes
  • 2:25 - 2:28
    tornaram possível
    que eu fosse para a universidade
  • 2:28 - 2:30
    e conseguir entrar
    na faculdade de medicina.
  • 2:30 - 2:33
    As minhas esperanças tinham sido
    despedaçadas por uma guerra
  • 2:34 - 2:35
    mas, graças a eles,
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    tive a sorte de concretizar
    o meu sonho de ser médico.
  • 2:39 - 2:41
    A minha situação tinha mudado.
  • 2:43 - 2:45
    Tinham passado 15 anos
    desde que fugira naquele aeroporto
  • 2:45 - 2:48
    mas a recordação daquelas duas filas
    não me saía da cabeça.
  • 2:48 - 2:51
    Eu era estudante de medicina
    com vinte e tal anos
  • 2:51 - 2:52
    e queria voltar lá
  • 2:52 - 2:55
    para ver se podia servir
    as pessoas que tinham ficado para trás.
  • 2:56 - 2:59
    Mas quando lá voltei,
    só encontrei uma destruição total.
  • 2:59 - 3:01
    A guerra tinha-nos deixado
    apenas com 51 médicos,
  • 3:01 - 3:03
    para servir um país
    de quatro milhões de pessoas.
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    Seria como se San Francisco
    só tivesse 10 médicos.
  • 3:07 - 3:10
    Se adoecermos na cidade
    em que restam esses poucos médicos,
  • 3:10 - 3:13
    podemos ter uma hipótese
  • 3:12 - 3:16
    mas. se adoecermos numa comunidade
    distante, no meio da floresta tropical,
  • 3:16 - 3:18
    onde estamos a dias de distância
    da clínica mais próxima
  • 3:18 - 3:23
    — eu via os meus doentes a morrer
    com situações em que ninguém devia morrer,
  • 3:22 - 3:24
    tudo porque vinham ter comigo
    tarde demais.
  • 3:24 - 3:28
    Imaginem que têm uma criança de dois anos
    que acorda uma manhã com febre
  • 3:28 - 3:30
    e percebem que ela pode estar com malaria.
  • 3:30 - 3:33
    Sabem que a única forma
    de lhe arranjar o remédio que ela precisa
  • 3:33 - 3:35
    será ir até ao rio,
  • 3:35 - 3:37
    meter-se numa canoa,
    remar até à outra margem
  • 3:37 - 3:40
    e depois caminhar pela floresta
    durante dois dias
  • 3:40 - 3:42
    para chegar à clínica mais próxima.
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    Mil milhões de pessoas vivem
    nas comunidades mais distantes do mundo
  • 3:45 - 3:49
    e, apesar dos avanços que fizemos
    na medicina moderna e na tecnologia,
  • 3:49 - 3:52
    as nossas inovações não chegam lá.
  • 3:52 - 3:54
    Estas comunidades foram abandonadas
  • 3:54 - 3:56
    porque é demasiado difícil lá chegar
  • 3:56 - 3:59
    e demasiado difícil prestar-lhes serviços.
  • 3:58 - 4:00
    A doença é universal,
  • 4:00 - 4:02
    mas o acesso aos cuidados de saúde não é.
  • 4:02 - 4:05
    Quando percebi isso,
    acendeu-se uma chama na minha alma.
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    Ninguém devia morrer
  • 4:06 - 4:09
    por viver demasiado longe
    de um médico ou de uma clínica.
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    Nenhuma situação devia ser permanente.
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    Neste caso, a ajuda não veio do exterior,
  • 4:16 - 4:18
    veio do interior.
  • 4:18 - 4:21
    Veio das próprias comunidades.
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    Apresento-vos Musu.
  • 4:22 - 4:23
    Algures, na Libéria rural,
  • 4:23 - 4:27
    onde a maior parte das raparigas
    não tem hipótese de acabar a escola,
  • 4:27 - 4:29
    Musu foi persistente.
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    Aos 18 anos, completou o secundário
  • 4:32 - 4:35
    e regressou à sua comunidade.
  • 4:35 - 4:37
    Viu que nenhuma das crianças
    estava a receber tratamento
  • 4:37 - 4:40
    para doenças que necessitavam
    de tratamento
  • 4:40 - 4:42
    — doenças mortais, como a malária
    e a pneumonia.
  • 4:42 - 4:45
    Então, inscreveu-se como voluntária.
  • 4:46 - 4:50
    Há milhões de voluntários, como Musu,
    em zonas rurais em todo o mundo.
  • 4:50 - 4:51
    E começámos a pensar:
  • 4:51 - 4:55
    Membros da comunidade, como Musu,
    podiam ajudar-nos a resolver o problema.
  • 4:56 - 4:59
    O nosso sistema de saúde
    está estruturado de tal modo
  • 4:59 - 5:03
    que o trabalho de diagnosticar
    uma doença e receitar medicamentos
  • 5:03 - 5:06
    está limitado a uma equipa
    de enfermeiros e médicos como eu.
  • 5:06 - 5:09
    Mas os enfermeiros e os médicos
    estão concentrados nas cidades,
  • 5:09 - 5:13
    e as comunidades rurais
    como a de Musu ficaram esquecidas.
  • 5:13 - 5:15
    Começámos a fazer perguntas.
  • 5:15 - 5:17
    E se pudéssemos reorganizar
    o sistema de saúde?
  • 5:17 - 5:20
    E se os membros
    da comunidade, como Musu,
  • 5:20 - 5:24
    fizessem parte ou estivessem mesmo
    no centro da nossa equipa médica?
  • 5:24 - 5:28
    E se Musu nos ajudasse a trazer os cuidados
    de saúde das clínicas nas cidades
  • 5:28 - 5:30
    até à porta dos seus vizinhos?
  • 5:31 - 5:34
    Musu tinha 48 anos,
    quando a conheci.
  • 5:34 - 5:37
    Apesar do seu espantoso talento e genica,
  • 5:37 - 5:40
    nunca tivera um trabalho remunerado,
    durante 30 anos.
  • 5:41 - 5:45
    E se a tecnologia pudesse ajudá-la?
  • 5:44 - 5:48
    E se pudéssemos investir nela
    com uma boa formação,
  • 5:49 - 5:51
    equipá-la com medicamentos reais
  • 5:52 - 5:55
    e dar-lhe um trabalho de verdade?
  • 5:56 - 6:01
    Em 2007, eu estava a tentar
    responder a estas perguntas
  • 6:01 - 6:04
    e a minha mulher e eu
    tínhamo-nos casado nesse ano.
  • 6:04 - 6:09
    Pedimos aos nossos parentes
    que esquecessem os presentes de casamento
  • 6:09 - 6:10
    e, em vez deles, nos dessem dinheiro
  • 6:10 - 6:14
    para podermos fundar uma organização
    sem fins lucrativos.
  • 6:14 - 6:17
    Garanto, sou muito mais
    romântico do que isto.
  • 6:17 - 6:18
    (Risos)
  • 6:18 - 6:20
    Acabámos por juntar 6000 dólares,
  • 6:20 - 6:23
    em conjunto com alguns libérios
    e norte-americanos
  • 6:23 - 6:26
    e criámos uma organização
    chamada Last Mile Health.
  • 6:26 - 6:28
    O nosso objetivo era pôr
    um trabalhador da saúde
  • 6:28 - 6:30
    ao alcance de toda a gente,
    em qualquer lugar.
  • 6:30 - 6:32
    Concebemos um processo em três fases
  • 6:32 - 6:34
    — formação, equipamento e pagamento —
  • 6:34 - 6:37
    para investir mais profundamente
    em voluntários como Musu,
  • 6:37 - 6:39
    para se tornarem para-profissionais,
  • 6:39 - 6:41
    trabalhadores de saúde da comunidade.
  • 6:41 - 6:46
    Primeiro treinámos Musu para a prevenção,
    o diagnóstico e o tratamento
  • 6:46 - 6:50
    das 10 principais doenças
    que afligiam as famílias da aldeia.
  • 6:50 - 6:54
    Um enfermeiro supervisor visitava-a
    todos os meses, para a ensinar.
  • 6:54 - 6:56
    Equipámo-la com a tecnologia
    médica moderna,
  • 6:56 - 7:00
    como este teste rápido
    para a malária, por um dólar,
  • 7:00 - 7:04
    e demos-lhe uma mochila, como esta,
    cheia de medicamentos
  • 7:04 - 7:06
    para tratar infeções como a pneumonia,
  • 7:07 - 7:08
    e, importantíssimo,
  • 7:08 - 7:12
    um Smartphone, para a ajudar
    a despistar e relatar epidemias.
  • 7:13 - 7:16
    Por fim, reconhecemos
    a dignidade do trabalho de Musu.
  • 7:16 - 7:19
    Criámos um contrato
    com o governo da Libéria,
  • 7:19 - 7:20
    pagámos-lhe
  • 7:20 - 7:22
    e demos-lhe a oportunidade
    de ter um trabalho real.
  • 7:22 - 7:24
    Ela é espantosa.
  • 7:24 - 7:27
    Musu aprendeu mais
    de 30 competências médicas,
  • 7:27 - 7:30
    desde a despistagem
    de subnutrição nas crianças
  • 7:30 - 7:33
    até diagnosticar a causa da tosse
    de uma criança com um Smartphone,
  • 7:33 - 7:36
    apoiar pessoas com VIH
  • 7:36 - 7:40
    e prestando cuidados de acompanhamento
    a doentes que perderam os membros.
  • 7:42 - 7:44
    No trabalho em conjunto
    com a nossa equipa,
  • 7:44 - 7:46
    como para-profissionais,
  • 7:46 - 7:48
    os trabalhadores de saúde
    podem garantir
  • 7:48 - 7:50
    que muito do que um médico
    de família faria
  • 7:50 - 7:55
    chega aos locais onde
    muitos médicos de família nunca iriam.
  • 7:54 - 7:57
    Uma das coisas de que mais gosto
    é cuidar de doentes
  • 7:57 - 7:59
    com trabalhadores da saúde.
  • 7:59 - 8:01
    No ano passado, fui visitar A.B.
  • 8:01 - 8:04
    Tal como Musu, A.B. tinha tido
    a sorte de ir para a escola.
  • 8:04 - 8:08
    Estava no 8.º ano do ensino,
  • 8:08 - 8:09
    quando os pais morreram.
  • 8:09 - 8:12
    Ficou órfão e teve que desistir.
  • 8:13 - 8:18
    No ano passado, contratámo-lo
    e formámos A.B., como assistente de saúde.
  • 8:19 - 8:21
    Quando ele andava a fazer visitas
    porta a porta,
  • 8:21 - 8:23
    encontrou um bebé chamado Prince,
  • 8:24 - 8:27
    cuja mãe tinha tido problemas
    em amamentá-lo
  • 8:27 - 8:30
    e aos seis meses, Prince
    tinha começado a definhar.
  • 8:30 - 8:33
    A.B. tinha sido ensinado a usar
    esta fita métrica com códigos de cores
  • 8:34 - 8:37
    que se enrola no braço duma criança
    para diagnosticar subnutrição.
  • 8:37 - 8:40
    A.B. reparou que Prince
    se encontrava na zona vermelha,
  • 8:40 - 8:42
    e tinha que ser hospitalizado.
  • 8:42 - 8:44
    A.B. levou Prince e a mãe para o rio,
  • 8:44 - 8:45
    meteu-se numa canoa,
  • 8:45 - 8:48
    remou durante quatro horas
    para chegar ao hospital.
  • 8:48 - 8:51
    Depois, quando Prince teve alta,
  • 8:51 - 8:55
    A.B. ensinou a mãe a alimentar o bebé
    com um suplemento alimentício.
  • 8:56 - 8:58
    Aqui há uns meses,
  • 8:58 - 9:02
    A.B. levou-me a visitar Prince,
    que está um miúdo rechonchudo.
  • 9:01 - 9:02
    (Risos)
  • 9:02 - 9:05
    Está a cumprir as metas,
    já se põe de pé
  • 9:06 - 9:07
    e até já começou a dizer
    algumas palavras.
  • 9:07 - 9:10
    Estes trabalhadores comunitários
    inspiram-me imenso.
  • 9:10 - 9:13
    Pergunto-lhes amiúde porque é
    que fazem o que fazem.
  • 9:13 - 9:15
    Quando perguntei a A.B., ele disse:
  • 9:15 - 9:18
    "Doutor, desde que abandonei a escola,
  • 9:18 - 9:22
    "é a primeira vez que tenho hipótese
    de agarrar numa caneta para escrever.
  • 9:22 - 9:24
    "O meu cérebro está rejuvenescido".
  • 9:26 - 9:30
    As histórias de A.B. e de Musu
    ensinaram-me uma coisa fundamental
  • 9:30 - 9:32
    sobre o ser humano.
  • 9:32 - 9:35
    A nossa vontade de servir os outros
  • 9:35 - 9:39
    pode ajudar-nos a transformar
    as nossas situações.
  • 9:40 - 9:41
    Há uns anos, fiquei emocionado
  • 9:41 - 9:45
    como pode ser poderosa a vontade
    de servir o nosso próximo,
  • 9:46 - 9:48
    quando enfrentámos uma catástrofe global.
  • 9:49 - 9:50
    Em dezembro de 2013,
  • 9:51 - 9:54
    aconteceu uma coisa na floresta tropical
    na fronteira com a Guiné.
  • 9:54 - 9:58
    Um bebé chamado Émile adoeceu
    com vómitos, febre e diarreia.
  • 9:59 - 10:01
    Vivia numa área
    em que as estradas eram raras
  • 10:01 - 10:04
    e havia uma grande falta
    de trabalhadores de saúde.
  • 10:05 - 10:06
    Émile morreu.
  • 10:06 - 10:08
    Umas semanas depois, a irmã dela morreu
  • 10:08 - 10:10
    e umas semanas depois, morreu a mãe.
  • 10:10 - 10:13
    Esta doença iria espalhar-se
    de uma comunidade para outra.
  • 10:13 - 10:15
    Só três meses depois
  • 10:15 - 10:18
    o mundo a reconheceu como o Ébola.
  • 10:18 - 10:21
    Quando todos os minutos contam,
    tínhamos perdido meses,
  • 10:21 - 10:23
    e, nessa altura,
    já o vírus se tinha espalhado
  • 10:23 - 10:27
    por toda a África Ocidental e, por fim,
    para outras partes do mundo.
  • 10:27 - 10:30
    Fecharam empresas, as companhias
    de aviação começaram a cancelar voos.
  • 10:30 - 10:31
    No auge da crise,
  • 10:31 - 10:36
    quando nos disseram que podiam
    estar infetadas 1,4 milhão de pessoas,
  • 10:36 - 10:39
    quando nos disseram
    que a maior parte delas iria morrer,
  • 10:39 - 10:42
    quando quase tínhamos perdido
    todas as esperanças,
  • 10:44 - 10:47
    lembro-me de estar com um grupo
    de trabalhadores da saúde
  • 10:47 - 10:49
    na floresta tropical onde
    tinha ocorrido um surto.
  • 10:49 - 10:52
    Estávamos a treiná-los
    e a equipá-los para usarem máscaras,
  • 10:52 - 10:54
    luvas e batas, de que precisavam
  • 10:54 - 10:56
    para se resguardarem do vírus
  • 10:56 - 10:58
    enquanto cuidavam dos doentes.
  • 10:59 - 11:01
    Recordo o medo nos olhos deles.
  • 11:02 - 11:07
    Recordo estar acordado, a meio da noite,
    com medo de ter feito o pedido certo
  • 11:09 - 11:10
    para eles se manterem no terreno.
  • 11:11 - 11:15
    Quando o Ébola ameaçava
    pôr a humanidade de rastos,
  • 11:15 - 11:19
    os trabalhadores de saúde comunitários
    não cederam ao medo.
  • 11:20 - 11:22
    Fizeram o que sempre tinham feito:
  • 11:22 - 11:25
    responderam à chamada
    para servir os seus vizinhos.
  • 11:26 - 11:29
    Os membros da comunidade na Libéria
    aprenderam os sintomas do Ébola,
  • 11:29 - 11:33
    alinharam com enfermeiros e médicos
    e foram porta a porta procurar os doentes
  • 11:33 - 11:35
    e prestar-lhes cuidados.
  • 11:35 - 11:38
    Despistaram milhares de pessoas
    que tinham estado expostas ao vírus
  • 11:38 - 11:40
    e ajudaram a quebrar
    a cadeia de transmissão.
  • 11:40 - 11:44
    Uns dez mil trabalhadores de saúde
    comunitários arriscaram a vida
  • 11:44 - 11:47
    para ajudar a despistar o vírus
    e a detê-lo no seu caminho.
  • 11:48 - 11:51
    (Aplausos)
  • 11:55 - 11:58
    Hoje, o Ébola está sob controlo
    na África Ocidental
  • 11:58 - 12:00
    e aprendemos umas coisas.
  • 12:00 - 12:03
    Aprendemos que pontos mortos
    nos cuidados de saúde rurais
  • 12:04 - 12:06
    podem levar a pontos quentes de doenças
  • 12:05 - 12:08
    o que nos coloca a todos em grande risco.
  • 12:08 - 12:10
    Aprendemos que o sistema
    de emergência mais eficaz
  • 12:10 - 12:13
    é, na verdade, um sistema de todos os dias
  • 12:13 - 12:15
    e que esse sistema tem que chegar
    a todas as comunidades,
  • 12:15 - 12:18
    incluindo as comunidades rurais
    como a de Émile.
  • 12:19 - 12:20
    E, sobretudo, aprendemos
  • 12:20 - 12:23
    com a coragem dos trabalhadores
    de saúde comunitários da Libéria,
  • 12:23 - 12:27
    que as pessoas não se definem
    pelas situações que enfrentam,
  • 12:27 - 12:29
    por mais desesperadas que pareçam.
  • 12:30 - 12:33
    Definem-se pela forma
    como lhes respondemos.
  • 12:34 - 12:36
    Durante os últimos 15 anos,
  • 12:37 - 12:39
    tenho visto o poder desta ideia
  • 12:39 - 12:43
    para transformar cidadãos vulgares
    em trabalhadores da saúde comunitários,
  • 12:44 - 12:46
    em verdadeiros heróis.
  • 12:46 - 12:48
    Tenho visto isso por toda a parte,
  • 12:48 - 12:50
    nas comunidades das florestas
    da África Ocidental,
  • 12:50 - 12:53
    nas aldeias piscatórias do Alasca rural.
  • 12:53 - 12:54
    É verdade,
  • 12:54 - 12:57
    estes trabalhadores da saúde
    não fazem neurocirurgia,
  • 12:57 - 12:59
    mas tornam possível
  • 12:59 - 13:02
    prestar cuidados de saúde
    ao alcance de todos, em qualquer local.
  • 13:04 - 13:06
    Então, e agora?
  • 13:06 - 13:10
    Sabemos que ainda há
    milhões de pessoas que morrem
  • 13:10 - 13:11
    de causas que podiam ser evitadas
  • 13:12 - 13:13
    em comunidades rurais em todo o mundo.
  • 13:14 - 13:16
    Sabemos que a grande maioria
    dessas mortes
  • 13:16 - 13:19
    ocorre nestes 75 países
    sombreados a azul.
  • 13:20 - 13:21
    Também sabemos
  • 13:21 - 13:24
    que, se formarmos um exército
    de trabalhadores de saúde comunitários
  • 13:24 - 13:28
    para aprender nem que sejam
    30 competências que salvam vidas,
  • 13:29 - 13:33
    podemos salvar a vida de quase
    30 milhões de pessoas até 2030.
  • 13:34 - 13:38
    Trinta serviços podem salvar
    30 milhões de vidas até 2030.
  • 13:38 - 13:40
    Isto não é só um plano,
  • 13:40 - 13:42
    estamos a provar que pode ser feito.
  • 13:42 - 13:43
    Na Libéria,
  • 13:43 - 13:47
    o governo está a formar milhares
    de trabalhadores como A.B. e Musu
  • 13:47 - 13:49
    depois do Ébola,
  • 13:49 - 13:52
    para levar cuidados de saúde
    a todas as crianças e famílias do país.
  • 13:52 - 13:54
    Temos a honra de trabalhar com eles
  • 13:54 - 13:57
    e estamos a fazer equipa
    com uma série de organizações
  • 13:57 - 13:59
    que estão a trabalhar noutros países
  • 13:59 - 14:01
    a tentar ajudá-los a fazer o mesmo.
  • 14:02 - 14:05
    Se pudéssemos ajudar esses países,
  • 14:06 - 14:07
    podíamos salvar milhões de vidas
  • 14:07 - 14:09
    e, ao mesmo tempo,
  • 14:09 - 14:11
    podíamos criar milhões
    de postos de trabalho.
  • 14:12 - 14:15
    Mas não podemos fazer isso
    sem tecnologia.
  • 14:15 - 14:18
    As pessoas preocupam-se
    que a tecnologia nos roube empregos,
  • 14:18 - 14:21
    mas, no que diz respeito
    a trabalhadores da saúde,
  • 14:21 - 14:24
    a tecnologia tem sido fundamental
    para criar postos de trabalho.
  • 14:24 - 14:26
    Sem tecnologia,
    sem estes Smartphones,
  • 14:26 - 14:29
    sem este teste rápido,
  • 14:30 - 14:34
    teria sido impossível
    poder utilizar A.B. e Musu.
  • 14:35 - 14:38
    Penso que é a altura
    de a tecnologia nos ajudar
  • 14:38 - 14:42
    a formar pessoas, mais rapidamente,
    e melhor do que nunca.
  • 14:43 - 14:44
    Enquanto médico,
  • 14:44 - 14:47
    uso a tecnologia para me manter
    atualizado e certificado.
  • 14:47 - 14:50
    Uso Smartphones, uso aplicações,
    uso cursos online.
  • 14:50 - 14:52
    Mas quando A.B. quer aprender,
  • 14:52 - 14:54
    tem que saltar para a canoa
  • 14:55 - 14:57
    e ir ao centro de formação.
  • 14:58 - 14:59
    Quando Musu aparece para formação,
  • 15:00 - 15:01
    os instrutores só dispõem
  • 15:01 - 15:04
    de folhas de papel em cavaletes
    e marcadores.
  • 15:04 - 15:09
    Porque é que eles não têm o mesmo acesso
    à aprendizagem que eu tenho?
  • 15:10 - 15:13
    Se queremos que os trabalhadores
    de saúde comunitários
  • 15:13 - 15:16
    dominem estas e outras técnicas
    que salvam vidas
  • 15:16 - 15:20
    temos que alterar
    este modelo antiquado de ensino.
  • 15:20 - 15:22
    A tecnologia pode ser um fator de mudança.
  • 15:22 - 15:26
    Tenho uma grande admiração
    pela revolução do ensino digital
  • 15:26 - 15:29
    como a revolução liderada
    pela Khan Academy e os edX.
  • 15:30 - 15:33
    Tenho andado a pensar
    que chegou a altura
  • 15:33 - 15:36
    de um encontro entre
    a revolução do ensino digital
  • 15:36 - 15:39
    e a revolução da saúde comunitária.
  • 15:39 - 15:43
    Isso traz-me ao meu desejo
    do Prémio TED.
  • 15:44 - 15:45
    Desejo...
  • 15:46 - 15:48
    desejo que nos ajudem a recrutar
  • 15:48 - 15:51
    o maior exército de trabalhadores
    da saúde comunitários
  • 15:51 - 15:52
    que o mundo já viu
  • 15:52 - 15:55
    criando a Academia de Saúde Comunitária,
  • 15:55 - 15:59
    uma plataforma mundial
    para formar, ligar e responsabilizar.
  • 15:59 - 16:00
    (Aplausos)
  • 16:00 - 16:01
    Obrigado.
  • 16:02 - 16:05
    (Aplausos)
  • 16:05 - 16:06
    Obrigado.
  • 16:08 - 16:09
    A ideia é esta:
  • 16:09 - 16:12
    vamos criar e manter
  • 16:12 - 16:16
    os melhores recursos em ensino digital.
  • 16:17 - 16:21
    Vamos levá-los aos trabalhadores de saúde
    comunitários de todo o mundo,
  • 16:21 - 16:23
    incluindo A.B. e Musu.
  • 16:23 - 16:26
    Vão receber lições por vídeo,
    sobre vacinar as crianças
  • 16:26 - 16:29
    e ter cursos online
    sobre como detetar o próximo surto,
  • 16:29 - 16:31
    para não ficarem presos
    ao uso de papel em cavaletes.
  • 16:31 - 16:35
    Vamos ajudar esses países
    a qualificar esses trabalhadores,
  • 16:35 - 16:39
    para que eles sejam reconhecidos,
    não sejam subavaliados,
  • 16:39 - 16:42
    mas se tornem numa profissão
    reconhecida e responsável,
  • 16:42 - 16:44
    tal como os enfermeiros e os médicos.
  • 16:45 - 16:49
    Vamos criar uma rede
    de empresas e empresários
  • 16:49 - 16:51
    que criaram inovações
    que podem salvar vidas
  • 16:51 - 16:54
    e ajudá-los a ligarem-se
    a trabalhadores como Musu,
  • 16:54 - 16:57
    para ela poder ajudar melhor
    a servir a sua comunidade.
  • 16:57 - 17:00
    E vamos trabalhar sem descanso
    para convencer os governos
  • 17:00 - 17:04
    a fazer dos trabalhadores de saúde
    comunitários um pilar dos planos de saúde.
  • 17:06 - 17:10
    Planeamos testar um protótipo
    da academia na Libéria
  • 17:10 - 17:11
    e noutros países parceiros
  • 17:11 - 17:13
    e depois lançá-lo a nível mundial,
  • 17:13 - 17:16
    incluindo a América do Norte rural.
  • 17:16 - 17:18
    Com o poder desta plataforma,
  • 17:18 - 17:20
    cremos que podemos convencer
    melhor os países
  • 17:20 - 17:24
    de que é possível uma revolução
    nos cuidados de saúde.
  • 17:24 - 17:29
    O meu sonho é que esta academia
    possa contribuir para a formação
  • 17:29 - 17:31
    de centenas de milhares
    de membros comunitários
  • 17:31 - 17:34
    para ajudar a levar os cuidados de saúde
    aos seus vizinhos
  • 17:34 - 17:35
    — as centenas de milhões
  • 17:35 - 17:38
    que vivem nas comunidades rurais
    mais distantes,
  • 17:38 - 17:41
    desde as comunidades
    das florestas da África Ocidental
  • 17:41 - 17:43
    às aldeias piscatórias do Alasca rural;
  • 17:43 - 17:47
    desde os montes Apalaches
    às montanhas do Afeganistão.
  • 17:47 - 17:50
    Se esta visão está alinhada com a vossa,
  • 17:50 - 17:53
    visitem communityhealthacademy.org,
  • 17:54 - 17:56
    e juntem-se a esta revolução.
  • 17:57 - 18:01
    Digam-nos se a vossa organização
    ou alguém que conheçam pode ajudar-nos
  • 18:01 - 18:05
    enquanto tentamos criar esta academia
    durante o próximo ano.
  • 18:06 - 18:08
    Quando olho para esta sala,
  • 18:08 - 18:11
    dou-me conta de que os nossos percursos
    não são feitos por nós,
  • 18:11 - 18:13
    são modelados por outras pessoas.
  • 18:13 - 18:16
    Há aqui muita gente
    que fez parte desta causa.
  • 18:16 - 18:20
    Temos muita honra de fazer parte
    desta comunidade,
  • 18:20 - 18:22
    uma comunidade que está disposta
    a apoiar uma causa
  • 18:22 - 18:24
    tão ousada como esta.
  • 18:24 - 18:27
    Por isso, para terminar,
    quero oferecer uma reflexão.
  • 18:28 - 18:31
    Penso muito mais
    no que o meu pai me ensinou.
  • 18:32 - 18:34
    Atualmente, também passei a ser pai.
  • 18:34 - 18:36
    Tenho dois filhos
  • 18:36 - 18:40
    e a minha mulher e eu acabámos de saber
    que ela está grávida do nosso 3.º filho.
  • 18:40 - 18:41
    (Aplausos)
  • 18:41 - 18:42
    Obrigado.
  • 18:42 - 18:44
    (Aplausos)
  • 18:44 - 18:47
    Eu estive há pouco tempo
    a tratar duma mulher na Libéria
  • 18:47 - 18:50
    que, tal como a minha mulher,
    estava na terceira gravidez.
  • 18:50 - 18:52
    Mas, ao contrário da minha mulher,
  • 18:53 - 18:56
    não teve cuidados pré-natal
    com os dois primeiros bebés.
  • 18:58 - 19:00
    Vivia numa comunidade isolada
    na floresta,
  • 19:00 - 19:04
    que, durante cem anos
    não tivera quaisquer cuidados de saúde
  • 19:05 - 19:07
    até que, no ano passado,
  • 19:07 - 19:10
    um enfermeiro a treinou,
    juntamente com alguns vizinhos,
  • 19:10 - 19:12
    para serem trabalhadores da saúde.
  • 19:12 - 19:13
    Ali estava eu,
  • 19:14 - 19:17
    a observar aquela mulher
    que estava no segundo trimestre.
  • 19:17 - 19:21
    Puxei da sonda ultrassons
    para observar o bebé
  • 19:21 - 19:24
    e ela começou a contar histórias
    sobre os dois primeiros filhos.
  • 19:24 - 19:27
    Eu tinha a sonda ultrassons
    em cima da barriga dela
  • 19:27 - 19:30
    e ela parou a meio duma frase.
  • 19:31 - 19:33
    Virou-se para mim e disse:
  • 19:33 - 19:35
    "Doutor, que som é esse?"
  • 19:37 - 19:41
    Era a primeira vez que ela ouvia
    o bater do coração do bebé.
  • 19:42 - 19:47
    Os olhos dela brilharam,
    como os olhos da minha mulher e os meus
  • 19:47 - 19:50
    quando ouvimos o bater do coração
    do nosso bebé.
  • 19:52 - 19:54
    Durante toda a história da humanidade,
  • 19:54 - 19:58
    a doença tem sido universal,
    mas os cuidados de saúde não.
  • 19:58 - 20:01
    Mas um homem sábio
    disse-me um dia:
  • 20:02 - 20:04
    "Nenhuma situação é permanente".
  • 20:05 - 20:07
    Chegou a altura.
  • 20:07 - 20:09
    Chegou a altura de ir
    o mais longe possível
  • 20:09 - 20:11
    para alterarmos juntos esta situação.
  • 20:12 - 20:13
    Obrigado.
  • 20:13 - 20:16
    (Aplausos)
Title:
Ninguém devia morrer por viver longe de um médico
Speaker:
Raj Panjabi
Description:

A doença é universal, mas o acesso aos cuidados de saúde não é. O médico Raj Panjabi tem uma visão arrojada para levar os cuidados de saúde a toda a gente, em qualquer lugar. Com o Prémio TED 2017, Panjabi está a criar a Academia de Saúde Comunitária, uma plataforma mundial que tem como objetivo modernizar a forma como os trabalhadores da saúde aprendem competências fundamentais, criando simultaneamente postos de trabalho.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
20:18

Portuguese subtitles

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