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Ed Gavagan: Uma história sobre nós e cirurgiões


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    Sabe, nós acordamos de manhã,
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    nos vestimos, colocamos os sapatos,
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    e saímos para o mundo afora.
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    Planejamos voltar, tirar a roupa,
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    ir para a cama,
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    acordar, fazer tudo de novo,
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    e essa antecipação, esse ritmo,
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    nos ajuda a ter uma estrutura
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    para nos organizarmos e para organizar nossas vidas,
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    isso nos dá um caráter de previsibilidade.
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    Viver em Nova York, como eu,
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    é quase como se, com tantas pessoas fazendo tantas coisas
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    ao mesmo tempo, em um espaço tão confinado,
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    é quase como se a vida lhe tivesse dando cartas extras
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    daquele baralho.
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    Você nunca … essas justaposições não são possíveis
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    você não pensa que elas poderão acontecer.
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    E a gente nunca pensa que vai ser aquela pessoa,
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    andando nas ruas e,
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    pelo fato de você optar ir para um lado ou para o outro,
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    o resto da sua vida muda para sempre.
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    E uma noite, estou no metrô na área residencial.
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    Eu entro. Costumo estar um pouco vigilante
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    quando entro no metrô.
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    Não sou uma dessas pessoas com fones de ouvido, distraídas,
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    ou com um livro.
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    Eu entro no vagão e olho, e
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    noto esse casal,
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    jovens com cara de estudantes,
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    um jovem e uma jovem, sentados um perto do outro,
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    a a perna dela está sobre o joelho dele,
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    e eles estão – eles têm uma pequena engenhoca,
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    e estão amarrando esses nós,
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    e fazem isto com uma mão só,
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    fazem com a mão esquerda e a direita, tudo muito rápido
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    e depois ela passa a engenhoca para ele.
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    Eu nunca vi nada parecido.
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    É como se estivessem praticando truques de mágica.
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    E na estação seguinte, um cara entra no vagão,
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    com um aspecto de professor universitário.
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    Ele carrega uma pasta de couro abarrotada,
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    uma pasta retangular e uma bolsa de laptop
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    e o paletó de tweed com remendos de couro,
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    e – (Risos) –
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    ele olha para eles e
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    num piscar de olhos, ele se ajoelha diante deles,
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    e começa a dizer,
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    “Sabe, escuta, é assim que se faz isso. Olha,
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    se você faz assim –” e ele tira os cadarços das mãos deles,
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    e imediatamente começa a amarrar os nós,
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    e faz isso muito melhor do que eles, sensacional.
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    E se vê que são estudantes de medicina
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    indo para uma aula sobre as últimas técnicas
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    de sutura, e ele é o professor que vai dar essa aula.
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    (Risos)
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    Ele começa a falar assim com eles:
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    “Não, isso aqui é muito importante. Sabem
,
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    quando vocês precisarem destes nós,
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    tudo vai acontecer, sabe, tudo
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    ao mesmo tempo, vai ser –
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    vocês terão toda essas informações sendo dadas a vocês,
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    órgãos estarão obstruindo o caminho,
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    vai ser escorregadio,
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    e
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    é simplesmente muito importante que sejam capazes de fazer isso
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    como além de um reflexo natural, cada mão, mão esquerda, direita,
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    precisam fazer isso sem ver os seus dedos,”
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    E naquele momento, quando ouvi isso,
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    fui catapultado para fora do metrô para uma noite
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    em que era levado em uma ambulância, recolhido
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    da calçada onde tinha sido esfaqueado,
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    indo para a sala de trauma do Hospital St. Vicent em Manhattan,
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    porque
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    uma quadrilha tinha vindo do Brooklyn.
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    Como parte de uma iniciação de três dos seus membros,
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    eles teriam que matar alguém,
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    e eu por acaso era o cara andando na Bleecker Street
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    naquela noite,
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    e eles pularam em cima de mim sem dar uma palavra.
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    Minha sorte é que
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    quando estava em Notre Dame, eu fazia parte de um time de boxe,
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    então fui logo colocando minhas mãos para cima, instintivamente.
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    O cara no lado direito tinha uma faca com uma lâmina de 25cm,
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    e ele enfiou a faca por baixo do meu cotovelo,
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    e cortou a minha veia cava inferior.
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    Se você conhece um pouco de anatomia,
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    sabe que não é bom ela ser cortada,
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    e tudo, claro, dali para cima,
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    e então – minhas mãos ainda para cima –
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    ele retirou a faca e foi para o meu pescoço,
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    e enfiou a faca toda nele,
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    e eu consegui dar um bom golpe
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    e derrubei o cara do meio.
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    O outro cara continuava me atacando,
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    causando o colapso do meu outro pulmão,
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    eu consegui bater no outro cara e me soltar.
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    Corri para o final da rua e cai,
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    os paramédicos colocaram tubos em mim na calçada
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    e informaram ao hospital
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    que tinham uma emergência a caminho.
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    E um dos efeitos colaterais
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    da perda maciça de sangue
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    é a visão em túnel,
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    então eu me lembro de estar na maca
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    e ter um campo de visão minúsculo,
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    e eu movia minha cabeça
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    e chegamos ao hospital St. Vincent,
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    estamos correndo no corredor,
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    e eu vejo as luzes
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    e o efeito desse tipo de lembrança é estranho.
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    Elas na verdade não vão para o lugar de costume.
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    Elas parecem ficar trancadas em alta-definição em um cofre,
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    e George Lucas criou todos os efeitos sonoros. (Risos)
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    Então, às vezes, lembrando delas, é como se,
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    não é como qualquer outro tipo de lembrança.
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    Eu chego na sala de operação,
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    eles estão me aguardando e lá há luzes,
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    e agora eu consigo respirar um pouco mais,
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    porque meus pulmões estavam cheios de sangue
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    e isso me impedia de respirar,
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    mas o sangue acabou ficando todo na maca.
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    Eu disse: “Posso fazer alguma coisa para ajudar?”
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    e – (Risos) –
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    o enfermeiro deu uma gargalhada histérica e
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    eu viro minha cabeça tentando ver todo mundo,
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    e me vem essa lembrança esquisita de quando estava na faculdade
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    angariando,
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    angariando dinheiro para as vítimas das enchentes de Bangladesh,
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    e então eu olho para o meu anestesista que
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    está colocando a máscara em mim e penso,
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    “Ele parece bangladeshiano”, – (Risos) –
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    eu tenho apenas essas dois fatos e penso,
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    “Isso poderá dar certo.” (Risos)
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    Eu fico inconsciente
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    e eles me operam noite afora,
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    e precisei perto de 40 unidades de sangue para me manter vivo
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    enquanto operavam.
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    O cirurgião removeu quase um terço dos meus intestinos,
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    meu ceco, órgãos que eu nem sabia que tinha,
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    e depois ele me falou que uma das últimas coisas que fez
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    enquanto me operava, foi remover meu apêndice,
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    o que achei ótimo, sabe,
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    apenas um pequeno retoque no final . (Risos)
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    Acordei de manhã.
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    Não mais sob o efeito da anestesia, ele me disse
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    que queria estar presente, ele tinha me dado
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    uns dois por cento de chance de sobreviver.
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    Então ele estava presente quando acordei
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    e a dor quando acordei era como se eu
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    caísse através do gelo em um lago congelado de dor.
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    A dor era assim abrangente,
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    só não doía em um lugar e
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    era a pior coisa que já tinha sentido,
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    e era o peito do meu pé,
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    e ele segurava o arco do meu pé
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    e massageava o peito do pé com seu dedo polegar.
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    Eu olhei para ele e ele disse:
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    “É bom ver você”,
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    eu tentava lembrar o que havia acontecido
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    e tentava colocar minha cabeça em ordem,
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    a dor era esmagadora, ele disse,
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    “Sabe, não cortamos o seu cabelo. Eu pensei
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    que talvez sua força viesse dele, como Sansão,
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    e você iria precisar de toda força necessária.”
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    Nessa época, meu cabelo vinha até a cintura,
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    eu dirigia uma motocicleta, não era casado,
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    era dono de bar, eram tempos diferentes. (Risos)
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    Mas
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    fiquei ligado à máquina de suporte de vida por 3 dias
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    e todos receavam,
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    devido ao muito que tiveram que fazer em mim,
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    que eu não iria sobreviver,
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    então foram 3 dias em que
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    todos aguardavam eu morrer ou fazer cocô,
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    e – (Risos) –
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    quando eu finalmente evacuei, então aquilo,
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    cirurgicamente falando, é como se você tivesse atravessado uma linha boa,
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    e, um – (Risos) –
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    naquele dia, o cirurgião veio me ver
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    e tirou o lençol de cima de mim.
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    Ele estava acompanhado de uns amigos,
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    e ele faz assim, e todos eles olham,
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    não havia nenhuma infecção e
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    eles se inclinam sobre mim e me tocam e cutucam,
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    e falam assim: “Não há hematomas, blá, blá, blá,
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    vejam a cor”, e falam entre si
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    como se fosse esse carro restaurado
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    sobre o qual ele fala: “É, eu fiz isso”. (Risos)
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    Era simplesmente
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    fantástico porque esses caras fazem o gesto ‘toque aqui’ com o cirurgião
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    porque tudo tinha corrido bem comigo. (Risos)
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    E a cicatriz é minha, ainda tenho os grampos de sutura
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    e tudo mais.
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    E
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    depois, quando saí do hospital
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    e os ‘flashbacks’ e
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    os pesadelos me deixavam transtornado,
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    eu fui vê-lo novamente
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    e perguntei,
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    o que devo fazer?
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    E eu acho que, como um cirurgião, ele basicamente disse,
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    “Garoto, eu salvei a sua vida.
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    Agora você pode fazer o que quiser,
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    você tem que seguir em frente.
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    É como se eu tivesse lhe dado um carro novo
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    e você reclama porque não consegue encontrar um lugar para estacionar.
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    Simplesmente vai, sabe, e faça o seu melhor.
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    Mas você está vivo. Isso é o que importa.”
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    E aí ouço: ‘Bing-bong”, e as portas do metrô
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    estão se fechando e a minha estação é a próxima e olho para os jovens
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    e penso comigo mesmo,
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    “Eu vou levantar minha camisa
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    e mostrar a eles," – (Risos) –
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    mas penso: “Não, esse é o metrô de Nova York,
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    isso pode ser levado para um outro lado”. (Risos)
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    E penso, eles estão indo para a aula deles.
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    Eu saio, estou na plataforma,
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    e sinto meu dedo indicador
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    na
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    primeira cicatriz que tive na vida,
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    meu cordão umbilical,
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    e em torno dele, está traçada
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    a última cicatriz feita,
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    pelo meu cirurgião, e
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    sinto que aquele encontro casual
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    com aqueles jovens na rua com facas
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    me levou
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    a minha equipe de cirurgiões
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    e seu treinamento
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    e seu talento
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    e, como sempre, um pouquinho de sorte
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    me tiraram do caos.
  • 11:41 - 11:45
    Obrigado. (Aplausos)
  • 11:45 - 11:54
    (Aplausos)
  • 11:54 - 12:00
    Obrigado. Tenho muita sorte de estar aqui. Obrigado. (Aplausos)
Title:
Ed Gavagan: Uma história sobre nós e cirurgiões

Speaker:
Ed Gavagan
Description:

Um dia, Ed Gavagan estava sentado no metrô, observando dois jovens estudantes de medicina praticando como fazer nós. E uma lembrança forte tomou conta dele -- de um momento traumático que mudou sua vida para sempre. Uma história inesquecível de crime, talento e gratidão.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
12:21

Portuguese, Brazilian subtitles

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