Imaginem isso:
você acabou de ganhar
US$10 milhões na loteria.
Parabéns.
(Risos)
Você acabou de comer o brownie
de chocolate mais delicioso e quentinho
que já foi assado.
(Risos)
Você...
acabou de fazer sexo.
(Risos)
E você...
acabou de fazer os três ao mesmo tempo.
Parabéns pra você também.
(Risos)
Nessas situações, nosso cérebro produzem
substâncias chamadas neurotransmissores
que provocam esses sentimentos
de energia, entusiasmo e felicidade.
Sem essas substâncias dentro de nós,
não sentiríamos essas emoções
durante essas situações prazerosas.
Agora, imaginem isso:
você acabou de ser demitido.
Você vai fazer uma prova.
Você tem depressão.
Nessas situações, nosso cérebro
produz substâncias diferentes,
nos fazendo sentir estressados e ansiosos.
Os altos e baixos da vida são
controlados pelas nossas emoções
e por essas substâncias no nosso cérebro,
esse órgão vital dentro de nós,
que controla tudo o que sentimos,
pensamos e fazemos.
Como biólogo, sempre
achei estranho entender
que cada sentimento, pensamento
e ação são controlados
por um pedaço encharcado de células
de 1,5 kg dentro da nossa cabeça,
até descobrir que pode
não ser bem assim.
A história que quero contar hoje
revela uma novidade fascinante
no entendimento de fisiologia humana.
Cada um de nós tem um segundo cérebro,
outro órgão no corpo
que controla tanto das nossas
funções físicas e mentais
quanto o cérebro na nossa cabeça
e que pode ser a conexão chave
entre epidemias modernas no mundo,
desde obesidade a doenças
cardiovasculares, e talvez à saúde mental.
Para fazer uma pequena introdução,
vou lhes contar sobre a minha experiência.
Fui criado numa família de psicólogos.
Minha mãe é psicóloga clínica,
meu pai é professor de psicologia
em uma universidade,
minha irmã até tem
doutorado em psicologia.
Quando foi a minha vez de ir à
universidade, quis estudar algo diferente.
Já tinha ouvido muito sobre o cérebro
e seu funcionamento em casa,
então queria estudar algo novo.
Pensei no que me interessava,
e descobri que desde cedo
eu tinha um grande interesse em comida.
Amava comer.
Decidi estudar nutrição humana.
Foi ótimo porque pude estudar a comida,
como ela afeta nosso corpo,
como contribui com doenças,
e principalmente, como usá-la
para combater e prevenir doenças.
Essa história começa em 1845,
com o nascimento de um jovem
curioso na Rússia,
que se tornou um homem incrível,
mas que foi esquecido
pela história e pela medicina.
Ilya Mechnikov era fascinado
por tudo na natureza.
Quando tinha oito anos, ele tomava notas
sobre todos os seres vivos em seu jardim.
Ele se tornou tão bom em ciência
que descobriu o papel dos fagócitos,
células cruciais no nosso sistema imune,
o que lhe rendeu o Prêmio Nobel em 1908.
Mas sua ciência depois da vitória
foi muito mais crucial para o nosso
entendimento da saúde humana,
através de um conto sobre descoberta,
morte e autoexperimentação.
Todos nessa sala têm algo em comum:
passamos os nove primeiros
meses da nossa existência
dentro do útero de nossas mães.
Esse é um ambiente essencialmente estéril
onde outros seres
vivos não existem, só você.
Quando chegamos nesse mundo,
somos sufocados em um revestimento
invisível de micróbios amigáveis
do canal de parto da sua mãe.
Essas bactérias cresceram para formar
um órgão invisível de 1,5 kg
dentro do intestino grosso,
o mesmo peso do cérebro,
e que é conhecido como a nossa
microbiota ou microbioma.
Esse órgão invisível cresceu tanto,
que agora, 90% das células
no seu corpo são bacterianas.
Somente 10% são células humanas próprias.
Você é mais bactéria do que humano.
(Risos)
Esse ecossistema microbiano intestinal
é tão diverso quanto a floresta Amazônica.
São milhares de espécies
com funções diferentes,
e sua saúde incrivelmente depende
da vida e vibração dessa floresta.
As bactérias do seu intestino
digerem alguns alimentos,
produzem vitaminas essenciais e hormônios,
respondem a remédios e infecções,
controlam os níveis
de açúcar e colesterol.
Isso significa que os tipos
de bactéria no intestino
podem controlar o risco a certas doenças,
como obesidade e diabetes,
ou talvez até osteoporose.
Elas estão envolvidas em quase
todos os processos no nosso corpo,
funcionando como um segundo cérebro.
Ilya Mechnikov pode ter
descoberto isso sobre ele em 1892.
Ele vivia na França, em Paris,
onde uma epidemia mortal
de cólera eclodiu com milhares de mortes.
Como cientista, decidiu que
a melhor maneira de estudar isso
era ele mesmo beber uma sopa de cólera.
Incrivelmente, ele não ficou doente.
Como um bom cientista, ele precisava
aumentar o tamanho de sua amostra,
então recrutou um colega a fazer o mesmo.
Esse rapaz também não ficou doente.
Mas quando ele pediu a um outro colega,
o pobre coitado ficou
muito doente e quase morreu.
Estudando a cólera no microscópio,
Metchnikov descobriu que algumas
espécies de bactéria do intestino humano
suportavam e estimulavam o crescimento
da cólera, enquanto outras o preveniam.
Ele ainda afirmou que a nossa microbiota
era essencial para a saúde humana,
e que o equilíbrio dos micróbios dentro
de nós poderia ajudar a combater doenças.
Porém, o entendimento popular da época,
foi que o intestino humano era
um reservatório nocivo de toxinas.
Cirurgiões até começaram a remover
pedaços inteiros de intestino humano,
de pacientes com desconforto intestinal.
A morte de Mechnikov em 1916
significou que sua ideia de que bactérias
intestinais eram boas, foram esquecidas.
Uma década depois,
antibióticos foram descobertos,
e foram drasticamente superutilizados.
Cesarianas se tornaram comuns.
Dietas se tornaram ocidentalizadas.
Guerra foi declarada aos micróbios
e passamos um século tentando matá-los,
o que tornou nosso intestino
em um terreno baldio estéril.
As ideias desse vencedor
do Prêmio Nobel foram perdidas.
Algumas das implicações disso
foram identificadas recentemente.
Hoje, uma em três crianças
nos Estados Unidos nasce de cesária,
e portanto, não passam por esse
revestimento inicial de bactérias
desenvolvido pela evolução
para estar no canal do parto.
Os bebês acabam revestidos primeiro
com outras bactérias na pele
ou no ambiente hospitalar,
o que contribuiu com um risco
até 25% maior de obesidade,
asma, deficiências imunológicas
e mais tarde, doenças
inflamatórias intestinais.
Felizmente, agora percebemos
que precisamos restaurar
nosso relacionamento
com micróbios intestinais
para nossa saúde física.
Porém, ainda subestimamos
seu papel como segundo cérebro,
e isso é algo que estou pesquisando.
Aprendi isso pela intrigante
história de um camundongo.
Se camundongos são colonizados
pelo micróbio Toxoplasma gondii,
algo incrível acontece:
eles perdem seu medo de gatos.
(Risos)
Eles até se sentem atraídos por gatos.
(Risos)
Eles ficam meio loucos,
e infelizmente para eles,
acabam virando jantar de gato.
(Risos)
Esse micróbio ingerido pelo
animal controla o seu cérebro,
e muda o jeito como ele pensa e age.
Investigando a floresta intestinal
de bactérias do nosso intestino,
fomos descobrindo coisas incríveis
que estão mudando a nossa
apreciação das bactérias para sempre.
Nossas barrigas e cérebros
são fisicamente e bioquimicamente
conectados de várias maneiras.
Primeiro, nosso intestino
é fisicamente ligado ao cérebro
através do nervo vago
que manda sinais nas duas direções.
Mesmo que isso seja danificado,
o intestino continua
a funcionar normalmente
sem a conexão com o cérebro,
sugerindo que ele tem uma mente própria.
Segundo, nosso cérebro é feito
de 100 milhões de neurônios
que continuamente mandam mensagens dizendo
ao nosso corpo como trabalhar e agir.
Curiosamente, nosso intestino
tem 100 milhões de neurônios.
Terceiro, nosso microbioma é o ponto
central do nosso sistema imune,
qualquer distúrbio ali embaixo
pode causar sutis reações
imunes pelo corpo,
que se prolongadas podem
afetar a saúde do cérebro.
Finalmente, se lembram do nosso
chocólatra, ganhador da loteria,
e namoradeiro da primeira fila?
(Risos)
Ele demonstrou que neurotransmissores
são esse químicos que podem mudar
como pensamos, agimos e sentimos.
A maioria desses neurotransmissores
é produzida no intestino.
Inclusive a serotonina,
o antidepressivo da natureza,
90% dela é produzida no intestino,
menos de 10%, no cérebro.
Os tipos de bactéria dentro de você
podem controlar o modo
como você pensa e se comporta.
O estresse já mexeu com você por dentro?
Você já teve um pressentimento?
Ou borboletas no estômago?
Talvez seja melhor
pensar de novo sobre isso.
Apesar da minha relutância
ingênua na adolescência,
comecei a estudar não apenas
um cérebro, mas dois.
No Instituto de Microbiota APC,
na Irlanda,
ficamos fascinados com essa
relação entre a barriga e o cérebro,
pesquisamos como dietas
modernas e estilo de vida
têm impacto na relação intestino-cérebro,
e como podemos desenvolver
intervenções com foco na microbiota
para prevenir e tratar doenças crônicas.
Por exemplo, demonstramos
que os tipos de gordura
que você consome durante a vida
podem mudar drasticamente
os tipos de bactérias
que decidem habitar seu intestino.
Demonstramos também que alimentar-se
de certas cepas de bactéria, pode melhorar
a memória, comportamento de estresse, e os
níveis de hormônio do estresse em animais.
Junto com outros pesquisadores
ao redor do mundo,
identificamos listas de alimentos
que podem agir como prebióticos,
que estimulam o crescimento de bactérias
saudáveis no nosso intestino.
É fascinante para mim
que nossa saúde dependa não
apenas de alimentar a nós mesmos,
mas também de nutrir outros
microrganismos vivos dentro de nós,
indicando que estratégias
futuras para tratar doenças crônicas,
incluindo saúde cerebral, podem
depender em focar ou alimentar
nosso micróbio intestinal.
Parece que Ilya Mechnikov
pode ter sabido disso,
pois muito antes em sua vida, ele casou,
mas sua esposa ficou doente
e morreu de tuberculose.
O estresse e trauma disso
levaram Mechnikov a sofrer
uma overdose de ópio.
Ele sobreviveu, ainda bem.
Ele casou de novo,
e quando sua segunda esposa
ficou doente com febre tifoide,
ele se injetou com uma doença fatal
transmitida por carrapatos.
Ainda bem, ele sobreviveu de novo.
Só depois disso,
Mechnikov começou a estudar
e apreciar a microbiota.
Ele se mudou para Paris para
trabalhar no Instituto Pasteur
onde levantou a hipótese de que o balanço
correto de micróbios no intestino
poderia ajudar a evitar doenças.
Ele publicou vários livros e aulas
descrevendo como alcançar
isso e prolongar a vida humana.
Apesar do estresse e agitação mental
experienciados por ele no início,
ele passou o resto da sua vida
dedicado e obcecado com a pesquisa
em prolongar a vida humana.
Ele começou estudando um grupo
interessante de pessoas no Leste Europeu
que tinham uma vida
excepcionalmente longa.
Ele notou que elas bebiam leite
fermentado por bactérias diariamente
e sugeriu que isso contribuía
para a longevidade delas.
Ele começou a beber esse leite fermentado,
e aparentemente, teve um vida saudável
sem o estresse e a agitação
mental experimentados antes.
Talvez tenha sido apenas coincidência.
Ele descreveu sua época em Paris
como a mais feliz de sua vida.
Mechnikov morreu na França
em 1916 com 71 anos,
quando a expectativa
de vida lá era de 40 anos.
Como humanos, precisamos
adotar uma apreciação maior
pelos micróbios dentro de nós.
A guerra incidental que travamos
contra as bactérias no último século
levou à extinção bacteriana e deu início
a uma epidemia de pragas modernas.
Tenho uma bolsa de estudos
para pesquisar como restaurar
nossa relação com os micróbios,
e como isso pode ser usado para
prevenir e tratar doenças crônicas.
Acredito que todos nós temos
a responsabilidade e o potencial
de seguir os passos de Ilya Mechnikov.
Não apenas de reviver suas ideias
científicas perdidas no tempo,
mas de adotar o seu desejo
de prolongar a vida humana saudável.
Seja nos informando sobre os riscos
e benefícios da cesariana,
evitando o uso
desnecessário de antibióticos,
ou adotando uma dieta e estilo de vida
benéficos ao intestino,
podemos apoiar a vida dos micróbios,
pois fomos feitos para conviver juntos.
Então, imaginem isso:
você acabou de comer chocolate,
ou ganhar na loteria,
fez uma prova ou foi demitido.
Pensem que as suas ideias, emoções,
comportamento, e a sua saúde
podem ser controlados por um órgão
escondido que você mal conhecia.
Ilya Mechnikov não lutou apenas para
prolongar a vida saudável humana,
mas também a vida saudável microbiana.
Todos podem contribuir
com essa luta valiosa
pela nossa própria saúde
e pela saúde das futuras gerações
restaurando a relação
entre micróbios e humanos.
Eis alguns motivos para reflexão.
Muito obrigado.
(Aplausos)