Há quase um ano, a minha tia começou a ter dores nas costas. Foi ao médico e ele disse-lhe que era um problema normal para uma pessoa que tinha jogado ténis durante quase 30 anos. Recomendou-lhe que fizesse terapia mas, passado um tempo, ela não se sentia melhor. Então, os médicos decidiram fazer mais exames. Fizeram um raio X e descobriram uma lesão num pulmão. Então, julgaram que a lesão era uma tensão nos músculos e tendões entre as costelas mas, depois dumas semanas de tratamento, a saúde dela continuava a não melhorar. Por fim, decidiram fazer uma biópsia. Duas semanas depois, chegaram os resultados da biópsia. Era um cancro do pulmão na fase 3. A vida dela tinha sido uma vida quase isenta de riscos. Nunca fumara um cigarro. Nunca bebia álcool. Praticara desporto praticamente durante metade da vida. Talvez por isso mesmo, tenham demorado seis meses, a fazer-lhe um diagnóstico correto. Infelizmente, a minha história deve ser familiar para muita gente. Uma em cada três pessoas, presentes nesta audiência virá a ser diagnosticadas com qualquer tipo de cancro e uma em cada quatro morrerá por causa disso. Aquele diagnóstico de cancro mudou a vida da nossa família. Ainda por cima, aquele processo de andar dum lado para o outro com novos exames, vários médicos a descrever sintomas, afastar doenças umas atrás das outras, foi desgastante e frustrante, especialmente para a minha tia. É assim que o diagnóstico do cancro tem sido feito desde o início da história. Temos tratamentos médicos e drogas do século XXI para tratar o cancro. Mas continuamos a ter procedimentos e processos para diagnóstico do século XX , se é que os há. Atualmente, temos que esperar pelos sintomas que nos indicam que há qualquer coisa de errado. Hoje, a maioria das pessoas continua a não ter acesso a métodos de deteção precoce do cancro, apesar de sabermos que detetar o cancro precocemente é a coisa mais favorável que temos para a sua cura. Sabemos que é possível alterar isto na nossa geração. Por isso, a minha equipa e eu decidimos começar esta jornada, esta jornada para tentar detetar o cancro na sua fase inicial e monitorizar a resposta adequada, a nível molecular, dum modo mais fácil, mais barato, mais inteligente e mais acessível do que nunca. Claro, que o contexto é que vivemos numa época em que a tecnologia perturba o nosso presente a um ritmo exponencial e o domínio biológico não é exceção. Diz-se que a biotécnica está a avançar seis vezes mais depressa do que o ritmo de crescimento do poder de processamento dos computadores. Mas o progresso na biotécnica, além de estar a ser acelerado, também está a ser democratizado. Tal como os computadores pessoais ou a Internet ou os Smartphones nivelaram o campo de ação para o empreendedorismo, a política ou o ensino, os recentes avanços têm-no nivelado também para o progresso da biotécnica. Isso está a permitir que equipas multidisciplinares como a nossa tentem enfrentar e observar esses problemas com novas abordagens. Somos uma equipa de cientistas e tecnólogos do Chile, do Panamá, do México, de Israel e da Grécia. Com base em recentes descobertas científicas, cremos que descobrimos uma forma segura e rigorosa de detetar vários tipos de cancro em fases muito precoces, através duma amostra de sangue. Fazemos isso, detetando um conjunto de moléculas muito pequenas que circulam livremente no nosso sangue, chamadas microARNs . Para explicar o que são os microARNs e o seu papel importante no cancro, preciso de começar pelas proteínas, porque, quando o cancro está presente no corpo, observa-se uma modificação da proteína em todas as células cancerosas. Como talvez saibam, as proteínas são grandes moléculas biológicas que executam diferentes funções no interior do nosso corpo, como catalizar reações metabólicas ou reagir a estímulos ou reproduzir o ADN. Mas, antes de uma proteína ser expressa ou produzida, partes relevantes do seu código genético presentes no ADN são copiadas para o mensageiro ARN. Assim, este mensageiro ARN fica com instruções sobre como produzir uma proteína específica e, potencialmente, pode produzir centenas de proteínas. Mas aquelas que lhe dizem quando as produzir e quantas produzir são os microARNs. Assim, os microARNs são pequenas moléculas que regulam a expressão dos genes. Ao contrário do ADN, que está fixo, os microARNs podem variar, consoante as condições internas e ambientais, em qualquer altura, informando-nos quais os genes que são expressos ativamente num dado momento. É isso que torna os microARNs um promissor marcador para o cancro, porque, como sabem, o cancro é uma doença de expressão de genes alterados. É a regulação descontrolada de genes. Outra coisa importante a considerar é que não há dois cancros iguais, mas a nível do microARN, há padrões. Vários estudos científicos demonstraram que os níveis anormais de expressão do microARN variam e criam um padrão único e específico para cada tipo de cancro, mesmo nas fases precoces, refletindo a progressão da doença, se esta está a reagir à medicação ou está em remissão, tornando os microARNs um marcador biológico perfeito, altamente sensível. No entanto, o problema com os microARNs é que não podemos usar a atual tecnologia com base no ADN para os detetar de forma fiável, porque são sequências muito curtas de nucleótidos, muito mais pequenas do que o ADN. Também, todos os microARNs são muito parecidos uns com os outros, com diferenças mínimas. Imaginem tentar distinguir duas moléculas, extremamente semelhantes, extremamente pequenas. Cremos que encontrámos uma forma de o fazer. É a primeira vez que mostramos isto em público. Vou fazer uma demonstração. Imaginem que, na próxima vez que forem ao médico e fizerem as análises de rotina ao sangue, um técnico do laboratório extrai um ARN total, que hoje é uma coisa muito simples, e o coloca numa microplaca vulgar de 96, como esta. Cada um dos "poços" destas placas tem a bioquímica específica que definimos, e que pesquisa um microARN específico, agindo como uma ratoeira que se fecha apenas quando o microARN está presente na amostra. Quando o faz, fica a brilhar com uma cor verde. Para provocar a reação, colocamos a placa dentro de um aparelho como este, e depois podemos pôr o Smartphone por cima. — se puderem virar uma câmara para aqui, poderão ver o meu ecrã — Um Smartphone é um computador ligado e é também uma câmara, muito boa para este efeito. O Smartphone está a captar imagens. Quando a reação terminar, vai enviar as imagens para a nossa base de dados "online" para processamento e interpretação. Todo este processo dura cerca de 60 minutos. Quando o processo termina, os "poços" que brilham são comparados com os microARNs específicos e analisados em termos da intensidade e da velocidade a que brilham. Depois, quando todo este processo termina, o que acontece é isto. Este gráfico está a mostrar os microARNs específicos presentes nesta amostra e como é que eles reagiram com o tempo. Se agarrarmos neste padrão específico de microARN das amostras desta pessoa e o compararmos com a documentação científica existente que correlaciona padrões de microARN com a presença específica duma doença, é este o aspeto dum cancro do pâncreas. O que está aqui dentro é uma amostra real em que detetámos um cancro do pâncreas. (Aplausos) Outro aspeto importante desta abordagem é a reunião e a obtenção de dados na nuvem, para obtermos resultados em tempo real e analisá-los com as nossas informações contextuais. Se queremos compreender melhor e descodificar doenças como o cancro, precisamos de deixar de as tratar como episódios agudos, isolados e considerar e medir tudo o que afeta a nossa saúde numa base permanente. Toda esta plataforma é um protótipo funcional. Utiliza biologia molecular do mais alto nível, uma impressora 3D, de baixo custo e ciência de dados, para tentar enfrentar um dos desafios mais difíceis da humanidade. Como entendemos que a deteção precoce do cancro deve ser democratizada, toda esta solução custa, no mínimo, 50 vezes menos do que os atuais métodos disponíveis. Sabemos que a comunidade pode ajudar-nos a acelerar ainda mais. Por isso, estamos a fazer o projeto do aparelho em sinal aberto. (Aplausos) Digo muito claramente que estamos numa fase muito inicial mas, até agora, já conseguimos identificar com êxito o padrão do microARN do cancro do pâncreas, do cancro do pulmão, do cancro da mama e do cancro do fígado. Atualmente, estamos a fazer um teste clínico em colaboração com o Centro de Investigação Alemão do Cancro com 200 mulheres, para o cancro da mama. (Aplausos) Este é um teste não invasivo, rigoroso e acessível que tem o potencial de alterar drasticamente a forma como os procedimentos e diagnóstico do cancro têm sido feitos. Como andamos à procura de padrões do microARN no vosso sangue, em qualquer altura, não é preciso saber que cancro procuramos. Não é preciso ter quaisquer sintomas. Só é preciso um mililitro de sangue e um conjunto relativamente simples de utensílios. Atualmente, a deteção do cancro surge principalmente quando aparecem sintomas. Ou seja, na fase 3 ou 4. Considero que isso é tarde demais. É demasiado caro para as nossas famílias. É demasiado caro para a humanidade. Não podemos perder a guerra contra o cancro. Custa-nos milhares de milhões de dólares, mas também nos custa as pessoas que amamos. Hoje, a minha tia está a lutar corajosamente e a passar por este processo com uma atitude muito positiva. No entanto, eu quero que lutas destas sejam cada vez mais raras. Quero ver o dia em que o cancro seja tratado facilmente por poder ser diagnosticado rotineiramente em fases muito precoces. Tenho a certeza de que, num futuro muito próximo, por causa disto e de outras descobertas que observamos todos os dias nas ciências da vida, a forma como vemos o cancro vai-se alterar radicalmente. Vai dar-nos a hipótese de detetá-lo precocemente, de compreendê-lo melhor e de encontrar uma cura. Muito obrigado. (Aplausos)