Boas tardes.
Quando a organização TEDxLaLaguna
me fez a proposta
para eu participar neste evento,
disseram-me que era muito importante
eu ter uma ideia muito clara,
expô-la, transmiti-la e defendê-la.
A ideia que temos é muito clara,
o que não sabemos é se vamos saber
defendê-la e transmiti-la,
mas vamos tentar.
A ideia é esta:
Os algoritmos das quatro
operações aritméticas
morreram, mas não foram enterrados!
O que é um algoritmo?
Um algoritmo é uma sequência de passos
em que, quando os fazemos sempre,
obtemos o mesmo resultado.
Por exemplo:
O algoritmo para ligar o telefone.
Aqui far-me-ia muito jeito
o telefone do Dr. Maynard,
que apareceu há bocado na fotografia.
Primeiro, levanto o auscultador,
segundo, marco,
terceiro, espero o sinal,
quarto, falo,
quinto, desligo.
O algoritmo para vocês estarem
hoje aqui sentados
pode ter mais passos pelo meio:
um, levantaram-se de manhã;
dois, tomaram o pequeno-almoço;
três, fizeram as vossas atividades;
quatro, regressaram, almoçaram,
tomaram banho;
quinto, vieram para aqui
e sexto, sentaram-se.
Quando numa escola,
um professor diz aos meninos:
"Vamos lá! Põe as unidades
por baixo das unidades,
"as dezenas por baixo das dezenas
e as centenas por baixo das centenas.
"Agora soma todas as unidades.
"se der mais de 10, passas uma
e somas na coluna das dezenas,
"agora soma todas as dezenas.
"Se der mais de dez,
juntas uma na coluna das centenas
"e assim, sucessivamente",
esse professor não está a ensinar a somar,
a diminuir, a multiplicar ou a dividir,
mas nem ele próprio sabe.
Como eu sempre o fiz durante muitos anos
e não sabia que o que estava
a ensinar eram algoritmos.
Somar, diminuir, multiplicar
é uma questão diferente.
O que se tem vindo a ensinar há séculos
tem sido estes algoritmos tradicionais
que já não são úteis
que ninguém utiliza,
que ninguém emprega em parte alguma
mas que ocupam a maior parte do tempo
nas aulas de matemática.
Claro que, se passas uma, tens que
a trazer amanhã para não a perderes.
(Risos)
Vamos ver um vídeo:
(Vídeo) Porque é que isto dá 620?
Explica-me lá.
Porque eu digo: 200+300 são 500;
e 10+90 são 100; já tenho 600;
7+7 são 14, já tenho 614;
mais 6, já tenho 4 + 6 são 10;
e o outro 10 que faltava, são 620.
Muito bem, menina, e tu Elmi?
A mim dá-me 190
porque 6+4 são 10, 7+3 são 10,
já tenho 20,
Mais 20 são 40, mais os outros 20 são 60,
60+30 são 90; mais 100 são 190.
O vídeo passou adiantado
porque estou nervoso, mas enfim...
Tinha que ter dito, antes do vídeo,
que esses algoritmos
em que fomos ensinados, cem por cento
dos que aqui estamos, já não são úteis
porque ninguém os utiliza.
Ainda por cima, não desenvolvem
o cálculo mental,
como o que acabamos de ver no vídeo.
Mas são necessários
outros tipos de algoritmos.
Observem.
Estes algoritmos,
porque lhes chamamos tradicionais?
Para sermos depreciativos?
Nada disso.
Olhem para aqui e observem bem as datas.
Onde estava cada um de nós
que aqui estamos, nesse ano?
Esta é a prova de exame
de Federico García Lorca.
Parece que vão estar na moda outra vez
estas provas de exame.
Estas práticas que vemos copiadas aqui
estão vivas nas escolas
mas não é por maldade dos professores;
mas porque repetimos
o que vimos fazer toda a vida.
Se um vosso filho ou filha,
que são sempre os que mais nos afetam,
faz um grande golpe
e o levamos ao hospital,
e o tratam com a medicina deste ano,
como é que vocês reagiriam?
Mas não se percam.
Esta é a prova de exame
de Menéndez Pelayo,
reparem no ano: 1865
Ninguém que aqui está pediria
para os seus filhos a medicina deste ano
mas é o que está a encher
os quadros negros por toda a parte.
Muitas vezes são as famílias,
por ignorância,
que pedem isso como qualidade.
"Olha que nesta escola
o nível é muito baixo
"porque já não fazem as divisões assim".
As divisões fazem-se com as calculadoras.
Em parte alguma se fazem
com um papel e uma esferográfica.
Muito bem.
Porque lhes chamamos tradicionais?
Para sermos depreciativos? Não.
Vamos fazer uma viagem
através da história da matemática.
Acompanhem-me.
Entre os séculos VIII e IX,
um matemático viaja para a Índia
e vê que os hindus
não trabalhavam com os algarismos
e os símbolos que ele conhecia
nem utilizavam os números romanos.
Talvez porque os romanos
não andaram por lá.
Não usavam o ábaco, que era
o que predominava na Europa,
por influência do Império Romano.
Então, ele aprende
o que aqueles hindus faziam,
— estou a falar dos séculos VIII a IX —
e regressa a Bagdade.
Em Bagdade havia uma universidade
conhecida por "Casa do Saber"
e Bagdade era a cidade
onde estava a maior parte
do império político e intelectual
do Império Muçulmano.
E ele leva esses documentos
para a universidade.
A partir do ano 825 começa
a difundir-se um livro chamado
"O cálculo com numerais hindus".
A forma que ele trouxe da Índia
começa a estender-se pelo mundo árabe.
Esse matemático árabe que foi à Índia
e recolheu todas aquelas formas
que os hindus tinham de trabalhar,
chamava-se Al Juarismi.
Já perceberam de onde vem
o termo algoritmo, não é?
Começa a estender-se pelo mundo árabe
durante muitos séculos.
Séculos mais tarde, no século XII,
outro matemático italiano
viaja para o norte de África — Argélia —
porque o pai era mercador.
Esse matemático italiano chamava-se
Fibonacci, Leonardo de Pisa,
e começa a ver que
os árabes do norte de África
não utilizavam os rabiscos,
os algarismos que ele conhecia,
que eram os números romanos e o ábaco,
que era o que imperava em toda a Europa.
Então, começa a tomar nota,
a recolher tudo e regressa a Itália.
Quando regressa a Itália, publica um livro
que se chama "Livro do ábaco".
É o livro onde aparecem
pela primeira vez os algoritmos
que vimos ao princípio,
aqueles a que chamamos tradicionais.
Esse livro é publicado no ano de 1202.
Repito o ano
para que vejam como estamos atualizados,
1202.
Bem.
Começam a estender-se pela Europa,
mas há uma resistência.
Toda a inovação provoca uma oposição
e não foi uma coisa
que se aceitou rapidamente.
Aqui neste quadro
está refletida a luta que existia
entre os partidários dos números romanos,
à direita,
e os partidários dos novos algoritmos,
que são os que chegaram aos nossos dias.
Até ao ponto que se diz que demoraram
quatro séculos para serem aceites.
Quatro séculos!
Mas cuidado porque, por causa do zero,
houve polémicas terríveis.
Como iam aceitar o zero,
uma coisa que não representava nada?
Era uma coisa diabólica.
Bom...
Essa luta foi bastante intensa até que,
por fim, conseguiram impor-se
os partidários dos algoritmos tradicionais
que chegaram aos nossos dias.
Esses algoritmos foram úteis
até princípios dos anos 70.
Recordo que eu ia à loja
e a senhora da loja dizia:
"E vai um, e vão dois" e passava.
Já não se faz isso em parte alguma.
Mas a escola continua a fazê-lo.
São necessários outro tipo de algoritmos,
porque os algoritmos tradicionais
têm efeitos negativos.
Que efeitos negativos têm?
Não desenvolvem
o pensamento matemático das crianças,
impõem maneiras de pensar,
não deixam que se desenvolva
o significado numérico
nem o valor da posição.
As práticas repetidas
desses algoritmos tradicionais
não desenvolvem nada conceptualmente
e o que é ainda mais terrível:
acabam por impedir o cálculo mental.
Sim, são necessários outros algoritmos,
outros algoritmos
que ajudem a pensar, a raciocinar,
a fomentar a solução de problemas.
Mas vamos trabalhar muitos algoritmos
para a soma,
muitos para a subtração,
muitos diferentes para a divisão,
e muitos diferentes para a multiplicação.
Aqui vemos alguns.
Quando é que esta situação vai mudar?
Quando é que esta situação vai mudar?
Esta situação vai mudar
quando vocês, a família,
o público em geral,
comecem a exigir, de modo intenso,
às autoridades educativas,
que alterem os currículos
e que substituam
os algoritmos tradicionais
por outros algoritmos que ajudem a pensar,
a raciocinar,
a dar significado numérico
a tornar as crianças mais críticas,
a estimular que as crianças inventem
os seus próprios algoritmos.
Só quando vocês se mentalizarem
e o exigirem com insistência,
talvez as coisas comecem a mudar.
Vão mudar
quando vocês, no final deste curso,
o vosso filho do 1.º ano da primária,
o vosso sobrinho, primo, neto,
que acabe o 1.º ano da primária,
tenham que perguntar porque é
que não são capazes de fazer
o que vamos ver que fazem
estas meninas do 1.º ano.
[Precisamos de algoritmos
que desenvolvam o cálculo mental]
(Vídeo)
20 e 20... 40.
70.
E aqui já tenho 100.
Já tenho 100.
Depois... dois e dois são quatro,
três e três são seis,
quatro e seis são...
dez.
E... o 10... 100 + 10 são 110.
Eu disse...
"7 e 7 são 14, 8+8 são 16, 9 e 9 são 18.
"agarro em todos os 10, que são 30, não é?
Fico com um 4, um 6 e um 8, não é?
Vou buscar 10 no 4 e no 6,
que dá 10, não é?
junto o 10 aos 30, são quarenta... e oito.
Muito bem...
Isto é possível, esta estratégia
de pensamento é possível
porque estes meninos não foram instruídos
nos algoritmos tradicionais.
Estas meninas já estão na universidade e,
quando andam de um lado para o outro,
sabem quanto vão pagar a um grupo,
sabem quanto é o troco.
Mas as companheiras que foram instruídas
nos algoritmos tradicionais
não são capazes.
É necessário outro tipo de ferramentas,
de ideias, de trocar os algoritmos
por outros mais racionais
para que se mudem os resultados positivos.
E, para rematar,
algumas ideias:
A primeira, as famosas provas PISA
que nos põem malucos.
A Finlândia, a melhor do mundo.
A nível da Europa, dentro da Europa,
os que têm melhores resultados
na matemática
são os Países Baixos.
É curioso!
Nem a Finlândia, nem os Países Baixos
utilizam os algoritmos tradicionais.
Porque é que não investigam isso?
Para ver qual é a correlação.
A segunda, 80% do tempo
nas aulas de matemática...
— vocês que têm filhos,
primos, sobrinhos, netos —
... à segunda-feira estão a ensiná-los.
Mas não é porque o professor seja mau,
porque eu também ensinava essas coisas,
eu ensinava porque
não sabia fazer outra coisa,
até que fui aprendendo
com outros professores.
Colocas unidades por baixo de unidades,
dezenas por baixo de dezenas,
estão a ensinar-lhes
os algoritmos tradicionais.
E 80% do tempo das aulas de matemática
são dedicados exclusivamente a isso.
E no secundário, quando passamos
para o secundário,
são limites, derivadas,
integrais, matrizes,
todas essas questões que acabamos,
lá conseguimos passar a matemática,
mas não sabemos
para que serve um integral,
nem uma derivada, nem nada disso.
Que tristeza, não é?
Por último, perguntar quantos de vocês
seguiram os estudos para letras,
para ciências sociais.
E vocês dirão... Porquê?
Por causa da matemática!
Por causa da matemática?
Gostava muito dela?
Não! Para fugir da matemática!
Eu pertenço a um movimento de professores
que lutamos para que a matemática
seja uma ferramenta
para a igualdade social
e não para a seleção intelectual.
Para finalizar, repetir
que o problema só vai mudar
quando vocês exigirem veementemente
às autoridades educativas
uma mudança radical.
Volto a repetir.
Radical nos métodos de ensino
e de aprendizagem
desde a infantil, a primária,
o secundário e a universidade.
Na universidade por vezes
continua-se a dar aulas de matemática
como quando Platão subia a uma pedra,
quando eram cem,
e o professor preenchia a ardósia.
Com 100 alunos
é o que eu posso fazer aqui.
Mas há aulas na universidade
que têm três alunos.
Estão os três sentados e
é a mesma aula que para os 100!
E nunca mais vão mudar de método?
É tudo.
Muito obrigado.
(Aplausos)