O mundo faz com que você seja algo que não é, mas você sabe no fundo o que você é, e essa questão arde em seu coração: como você vai se tornar aquilo? Talvez eu seja um tanto única nisso, mas não estou sozinha, absolutamente não. Então, quando me tornei modelo, Eu senti como se finalmente tivesse alcançado o sonho que eu sempre quis desde criancinha. O meu eu exterior finalmente condizia com minha verdade interna, o meu eu interno. Por razões complicadas, das quais vou falar mais tarde, quando olho para esta imagem, naquela época eu pensava: "Geena, você conseguiu, você conseguiu, você chegou lá". Mas em outubro, eu percebi que só estou começando. Todos nós somos colocados em caixas por nossas famílias, pela nossa religião, pela nossa sociedade, nosso momento na história, até mesmo nosso próprio corpo. Algumas pessoas têm a coragem de se libertar, de não aceitar as limitações impostas pela cor de sua pele ou pelas crenças daqueles que as rodeiam. Essas pessoas sempre são uma ameaça ao status quo, ao que é considerado aceitável. No meu caso, nos últimos nove anos, alguns dos meus vizinhos, alguns dos meus amigos, colegas e até meu agente não sabiam da minha história. Acho que, no mistério, isso se chama revelação. Aqui vai a minha. Eu fui definida como menino ao nascer com base na aparência do meu órgão sexual. Lembro-me de quando eu tinha cinco anos, nas Filipinas, andando pela nossa casa. Eu sempre usava essa camiseta na minha cabeça. E minha mãe perguntou: "Por que você sempre veste essa camiseta na sua cabeça?" Eu disse: "Mãe, esse é meu cabelo. Sou uma menina." Eu já sabia como me autoidentificar. O gênero sempre foi considerado um fato, imutável, mas agora sabemos que é, na verdade, mais fluido complexo e misterioso. Por causa do meu sucesso, eu nunca tive coragem de compartilhar minha história, não porque eu achasse que é errado o que sou, mas pelo jeito como o mundo trata pessoas como nós, que querem se libertar. Todo dia, eu agradeço por ser uma mulher. Eu tenho uma mãe, um pai e uma família que me aceitaram como eu sou. Muitos não têm a mesma sorte. Há uma antiga tradição na cultura asiática que celebra o mistério fluido do gênero. Há uma deusa budista da compaixão. Há uma deusa hindu, a deusa hijra. Então quando eu tinha oito anos, eu estava numa fiesta nas Filipinas comemorando esses mistérios. Eu estava em frente ao palco, e me lembro de uma bela mulher surgindo bem na minha frente, e eu me lembro, foi ali que percebi: "É esse tipo de mulher que eu quero ser". Então, quando eu tinha 15 anos, ainda me vestindo como menino, conheci uma mulher chamada T. L. Ela era gerente de um concurso de beleza transexual. Naquela noite ela me perguntou: "Por que você não se inscreveu no concurso de beleza?" Ela me convenceu de que, se eu me inscrevesse, ela cuidaria das taxas de inscrição e dos trajes. E, naquela noite, eu venci na roupa de banho e venci no vestido longo e fui vice-campeã entre mais de 40 candidatas. Aquele momento mudou minha vida. De repente, eu tinha sido apresentada ao mundo dos concursos de beleza. Poucas pessoas podem dizer que seu primeiro emprego é rainha de concurso para mulheres transexuais, mas eu assumo. Dos 15 aos 17 anos, eu participei desde o concurso mais prestigiado até aquele que acontece na caçamba de um caminhão, literalmente, ou, às vezes, seria numa estrada próxima a um campo de arroz, e quando chovia... Chove muito nas Filipinas. Os organizadores tinham que mudar o local para dentro da casa de alguém. Também vivenciei a bondade dos estranhos, especialmente quando viajávamos nas províncias remotas nas Filipinas. Mas o mais importante foi que conheci alguns dos meus melhores amigos nessa comunidade. Em 2001, minha mãe, que tinha se mudado para São Francisco, e me ligou dizendo que o meu pedido do green card tinha sido aprovado, que agora eu poderia me mudar para os Estados Unidos. Eu resisti. Disse a minha mãe: "Mãe, estou me divertindo. Estou aqui com meus amigos, adoro viajar, ser rainha do concurso de beleza." Mas, duas semanas depois, ela me ligou e disse: "Sabia que, se você se mudasse para os Estados Unidos, você poderia mudar seu nome e seu gênero?" Aquilo era tudo que eu precisava ouvir. Minha mãe também me disse para colocar dois E's no meu nome. Ela também estava lá quando fiz minha cirurgia na Tailândia, com 19 anos. É interessante. Em algumas das cidades mais rurais da Tailândia, eles realizam algumas das cirurgias mais prestigiadas, seguras e sofisticadas. Naquela época, nos Estados Unidos, era preciso fazer a cirurgia antes de poder mudar seu nome e gênero. Então, em 2001, eu me mudei para São Francisco, e me lembro de olhar a minha carteira de motorista da Califórnia com o nome Geena e gênero feminino. Aquele foi um momento poderoso. Para algumas pessoas, seu documento é sua licença para dirigir ou mesmo para comprar uma bebida, mas para mim, era minha licença para viver, sentir-me digna. De repente, meus medos foram minimizados. Eu sentia que podia conquistar meu sonho e mudar-me para Nova Iorque e ser modelo. Muitos não têm a mesma sorte. Lembro-me desta mulher, chamada Ayla Nettles. Ela é de Nova Iorque, uma moça jovem, que corajosamente vivia sua verdade, mas o ódio acabou com sua vida. Para a maioria da minha comunidade, é essa a realidade em que vivemos. Nossa taxa de suicídio é nove vezes maior do que a da população em geral. Todo ano, no dia 20 de novembro, nós temos uma vigília global para Comemoração do Dia do Transexual. Estou aqui no palco porque há uma longa história de pessoas que lutaram e não abaixaram a cabeça à injustiça Estas são Marsha P. Johnson e Sylvia Rivera. Hoje, neste exato momento, é minha verdadeira revelação. Não podia mais viver minha verdade para e por mim mesma. Quero dar o meu máximo para ajudar os outros a viverem suas verdades sem vergonha e terror. Estou aqui, exposta, para que um dia não haja mais necessidade de uma vigília no dia 20 de novembro. Minha verdade mais profunda me permitiu aceitar quem eu sou. Vocês vão aceitar? Muito obrigada. (Aplausos) Obrigada. Obrigada. Obrigada. (Aplausos) Kathryn Schulz: Geena, uma pergunta rápida. o que você diria, especialmente aos pais, mas de maneira mais ampla, aos amigos, à família, a qualquer um que conheça uma criança ou uma pessoa que está desconfortável com o gênero que lhes foi atribuído? O que você diria aos membros da família dessa pessoa, para ajudá-los a serem bons membros da família e carinhosos e gentis com eles? Geena Rocero: Claro. Primeiro, sou mesmo abençoada. O sistema de apoio, especialmente com minha mãe, e minha família, isso por si só é tão poderoso. Lembro que toda vez que eu preparava jovens moças transexuais, eu as orientava, e às vezes quando elas me ligavam e diziam que seus pais não aceitavam, eu pegava o telefone e dizia a minha mãe: "Mãe, pode falar com ela?" Às vezes funciona, às vezes não, então... Mas a identidade de gênero está no centro de nosso ser, certo? Todos nós recebemos um gênero ao nascer. O que estou tentando fazer é ter essa conversa de que às vezes essa atribuição de gênero não está certa, e deveria haver um espaço que deixasse que as pessoas se autoidentificassem, e essa é uma conversa que deveríamos ter com pais, com colegas. O movimento transexual está bem no começo, em comparação com o início do movimento gay. Ainda há muito trabalho a ser feito. Deveria haver um entendimento. Deveria haver um espaço de curiosidade e de perguntas, e espero que todos vocês sejam meus aliados. KS: Obrigada. Foi encantador. GR: Obrigada. (Aplausos)