Gostaria de compartilhar com vocês
a história de como me tornei a vilã
de um enorme jogo on-line, na vida real.
Nos últimos quatro anos,
tenho publicado uma websérie no YouTube
chamada "Feminist Frequency",
no qual desconstruo a representação
das mulheres na mídia.
Tento fornecer as ferramentas para dar
às pessoas o vocabulário para discutir
o machismo e as questões de gênero
utilizando a linguagem acessível
da cultura popular,
como das séries de TV e dos filmes,
quadrinhos e videogames.
Videogames são muito interessantes
porque são a forma de mídia de massas
que cresce mais rapidamente hoje em dia.
Esta é uma foto minha aos dez anos,
jogando "Super Mario World"
em um Super Nintendo.
Então, jogo videogames já há algum tempo.
Além de ser divertido jogá-los,
eles também possuem muitos benefícios.
Novamente, jogo videogames há algum tempo,
mas há algo que sempre
me incomodou um pouco.
Não é segredo que a indústria dos games
apresenta algumas das representações
femininas mais opressivas,
objetificadas sexualmente
e estereotipadas de qualquer mídia.
Com isso em mente,
decidi lançar uma campanha
de arrecadação de fundos no site
de financiamento coletivo Kickstarter
para criar uma série de vídeos abordando
especificamente como as mulheres
são representadas nos videogames.
A ideia era que, se você tivesse interesse
no projeto, poderia contribuir
e, se não tivesse interesse,
poderia não contribuir.
É bem simples, não?
O que poderia dar errado?
(Risos)
Pois é.
Acontece que havia vários jogadores por aí
que, digamos, não estavam muito
animados com esse projeto.
Eu sou crítica da cultura pop,
feminista e mulher.
E sou todas essas coisas
abertamente na internet.
Então tenho alguma experiência
com retaliações machistas.
Infelizmente, me acostumei
a xingamentos e insultos sexistas,
geralmente envolvendo
cozinhas e sanduíches.
Mas o que aconteceu dessa vez
foi um pouco diferente.
Eu me tornei o alvo de uma gigantesca
campanha de ódio on-line.
Os próximos slides representam apenas
uma pequena fração do assédio que sofri
e eles vêm com uma enorme advertência.
Todas as minhas páginas nas redes sociais
foram inundadas por ameaças de estupro,
violência, agressão sexual, morte.
E vocês vão perceber que todas
as ameaças e os comentários
miravam especificamente o meu gênero.
O artigo na Wikipédia sobre mim
foi vandalizado com sexismo,
racismo e imagens pornográficas.
Houve uma campanha para denunciar
todas as minhas contas em redes sociais,
inclusive meu Kickstarter,
meu YouTube e meu Twitter,
que eles denunciavam como fraude,
spam ou até mesmo terrorismo
para que fossem suspensas.
Tentaram tirar meu site do ar,
hackear meu e-mail e outras contas,
tentaram coletar e distribuir
minhas informações pessoais,
inclusive meu endereço
e número de telefone.
Fizeram imagens pornográficas
com minhas feições,
sendo estuprada por personagens
de videogames,
que me enviaram repetidamente.
Fizeram até um jogo,
em que os jogadores eram
estimulados a "espancar a vadia",
no qual, clicando na tela, uma foto minha
ficaria cada vez mais ferida.
Vocês entenderam; vamos em frente.
O que é ainda mais perturbador,
se isso for possível,
nessa demonstração explícita
de misoginia em grande escala,
é que os perpetradores
se referiam abertamente
a essa campanha de assédio
e violência como um "jogo".
Se referiam à sua violência como um jogo.
Então, na mente deles,
eles criaram essa grande ficção
em que eles são os jogadores heroicos
de um enorme jogo coletivo on-line,
trabalhando juntos
para derrotar um inimigo,
e aparentemente me escalaram
para o papel de vilã.
E qual era meu grande plano diabólico?
Fazer uma série de vídeos no YouTube sobre
a representação das mulheres nos games.
Então, se eles pensam em seu
assédio como um "jogo divertido",
vamos examinar isso.
Quem são os jogadores?
Frequentemente, quando falamos
sobre assédio on-line,
pensamos em garotos adolescentes
no porão da casa dos pais deles.
Embora tenha sido atacada
por adolescentes,
também fui atacada por milhares
de homens adultos.
E isso não é totalmente surpreendente
considerando que a média de idade
de jogadores nos EUA é de 30 anos.
Onde esse jogo é jogado?
Os perpetradores transformaram
a internet inteira em campo de batalha.
No meu caso, usaram tudo e qualquer coisa
que eu já tenha tido on-line.
Eles também têm um quartel general,
no qual se comunicam,
trabalham juntos
e coordenam suas incursões.
Isso geralmente se realiza
em comunidades e fóruns de discussão
majoritariamente anônimos e não moderados.
E esses são lugares sem nenhum
mecanismo real de responsabilização.
Então qual é o objetivo?
Bem, o objetivo exclusivo
imediato é impedir a vilã
e salvar os videogames de mim
e de minhas tramas feministas loucas.
E eles tentam fazer isso silenciando
e difamando meu projeto e eu.
Mas o principal objetivo implícito
deles, na verdade, é tentar
manter o status quo dos videogames
como uma área dominada por homens
e todos os privilégios e benefícios que
vêm de um inegável "clube do Bolinha".
Então, que tipo de jogo é esse?
É fundamentalmente social.
Não pensamos no assédio on-line
como uma atividade social,
mas sabemos pelas estratégias
e táticas que eles usaram
que não trabalharam sozinhos,
que havia, na verdade,
uma coordenação informal entre eles.
E esse componente social é
um fator motivacional poderoso
que age fornecendo incentivos
para jogadores participarem,
ou melhor, para os agressores participarem
e até para intensificarem os ataques
ao receberem o elogio
e a aprovação de seus pares.
É como se víssemos isso como
um sistema de recompensas informal
no qual os jogadores
recebem "pontos de internet"
por ataques cada vez mais
descarados e violentos.
Depois, eles documentam esses ataques
e os levam de volta para os fóruns
como evidência para exibirem aos outros,
como se fossem troféus ou conquistas.
Então, temos uma estrutura geral
de um jogo social, certo?
Temos os jogadores, temos a vilã.
Temos o campo de batalha.
Temos um sistema de recompensas informal.
Mas o problema é...
isso não é um jogo.
É uma manifestação explícita
de misoginia raivosa em escala massiva.
Não é só "coisa de garotos".
Não é só "como a internet funciona".
E não vai simplesmente
sumir se a ignorarmos.
Não é mesmo só um jogo.
O que é, então?
Bem, os termos que costumamos usar
para descrever assédio on-line,
como cyberbullying ou perseguição virtual,
ou até mesmo "trolagem",
não descrevem adequadamente
uma campanha de ódio nessa escala.
O que aconteceu comigo,
e com outras mulheres também,
pode ser melhor descrito
como uma turba virtual.
E, sendo uma turba virtual
ou um punhado de comentários de ódio,
o resultado final é a manutenção,
o reforço e a normalização
de uma cultura do sexismo,
no qual os homens que assediam
são apoiados pelos seus pares
e recompensados por atitudes
e comportamentos sexistas,
e as mulheres são caladas, marginalizadas
e excluídas da participação plena.
Um "clube do Bolinha" significa
que garotas são proibidas.
Como eles mantêm as mulheres
e garotas longe? Exatamente assim.
Criando um ambiente tóxico
e hostil demais para suportar.
Eu sei, é um assunto
bem sombrio e deprimente,
mas há um outro lado de tudo isso.
Querem saber o resultado da minha campanha
de arrecadação de fundos depois de tudo?
Primeiro, a turba virtual
não conseguiu me calar,
como fica claro por eu estar aqui hoje.
(Aplausos)
Obrigada.
Acontece que muitas pessoas
estão interessadas em um projeto
que busca desconstruir a representação
de mulheres nos games,
e ficaram completamente
revoltadas com o assédio
que flagela nossas comunidades
de games com tanta frequência.
Acabei conseguindo 25 vezes
o valor que pedi originalmente.
(Aplausos)
Quase 7 mil pessoas contribuíram
para tornar meu projeto
"Tropos vs. Mulheres nos videogames"
maior, melhor e mais abrangente
do que eu jamais teria imaginado.
Em vez de apenas 5 vídeos, agora são 13,
além de um material escolar
que professores podem usar de graça.
(Aplausos)
O "Feminist Frequency"
passou de um projeto paralelo
a um empreendimento em tempo integral.
Recebi inúmeras mensagens de apoio
e palavras de incentivo.
As pessoas expressaram sua solidariedade
comigo e meu projeto publicamente
por meio de vídeos, desenhos,
quadrinhos e publicações em blogs.
Fui convidada até para dar palestras
em estúdios de videogames internacionais.
O apoio esmagador que recebi
é apenas uma pequena manifestação
de uma mudança cultural maior
que paira no horizonte.
Uma crescente interseção de jogadores
e desenvolvedores de todos os gêneros
estão fartos com o tratamento
das mulheres na cultura dos games
e estão se manifestando
para exigir mudanças.
Essas mudanças estão vindo de forma lenta
e até dolorosa, mas estão acontecendo.
Diariamente sou encorajada pelas mulheres
que perseveram, continuam se engajando
e se recusam a serem silenciadas.
Realmente acredito que trabalhando juntos
podemos criar uma mudança cultural
na qual mulheres, sem medo
de intimidação, ameaças ou assédio,
podem ser participantes plenas
e ativas em nosso mundo digital.
Obrigada.
(Aplausos)