Christine Mayer: Na vida, você pode dizer: "O copo está meio vazio ou...?" Plateia: "Meio cheio!" CM: Mas vamos um pouco além de "meio cheio". Também posso me concentrar em seu precioso conteúdo e me perguntar: "O que posso fazer com isso?" Posso beber, oferecer a alguém, usar para aguar uma planta, lavar algo ou cozinhar. Ser positivo é o trampolim a partir do qual podemos optar por ir mais longe: optar por agir. Lembram-se do Dumbo, o bebê elefante? Ele nasceu com orelhas tão longas que o faziam tropeçar. O que ele poderia fazer com elas? Ele aprendeu a voar! Anos atrás, eu não percebia que tinha água no meu copo. Acreditava que meus outros filhos terem um desenvolvimento normal era algo natural, que acontecia automaticamente. Mas, quando meu quarto filho, Nicolas, nasceu, logo percebi que havia motivo para preocupação: nada de contato visual, ele sequer chorava demonstrando fome. Ele estava em estado "vegetativo". O que posso fazer com isso? Decidi fazer tudo que pudesse para ajudá-lo a melhorar. Aos seis meses, um famoso especialista confirmou o diagnóstico e disse que Nicolas nunca andaria ou falaria, e que seria um "vegetal" a vida toda. O que posso fazer com isso? Considerei aquilo um desafio. E eu adoro desafios! Quanto mais difícil mais me atrai. Perceberam que eu disse "desafio" e não "problema"? Qual o significado dessa palavra? Quando ouvimos "problema", é sempre uma catástrofe. Crianças ouvem os pais falarem sobre "problemas", com uma expressão apreensiva. E ficamos surpresos quando as crianças travam quando ouvem a palavra "problema" na escola. Para mim, as dificuldades de Nicolas eram um desafio a superar, não um problema. Mas eu não fazia ideia da magnitude do desafio. Felizmente. Mark Twain disse: "Não sabendo que era impossível, foi lá e fez”. Eu não sabia que era impossível, então eu fiz. Primeiro, separei o que era diagnóstico do que era prognóstico. Não podemos mudar um diagnóstico, mas um prognóstico, sim. E escolhi não acreditar num prognóstico se ele fosse desfavorável. Então, o primeiro prognóstico: ele jamais andaria. O que posso fazer com isso? Eu o ensinaria como andar. Dividi isso em etapas: nossa família o ensinou a mover os braços e as pernas, a se mover de costas flexionando as pernas, a rolar, a sentar, a engatinhar numa superfície inclinada, a engatinhar numa superfície horizontal, a andar de quatro e, então, a dar seu primeiro passo. Aprendi como definir metas e, para cada meta, os objetivos exatos a alcançar. Além disso, vocês não imaginam a alegria que senti cada vez que ele atingiu um objetivo. Da mesma forma, alegrei-me mais pelo progresso dos meus outros filhos. Aprendi a me alegrar com cada coisa à minha volta, a ter gratidão por tudo à minha volta. E ter gratidão é o segredo da felicidade. Segundo prognóstico: ele jamais falaria. De fato, quando tinha quatro anos, Nicolas não conseguia repetir o som "ah". Nenhum ortofonista em nossa região sentia-se capaz de trabalhar com ele. Poderia ter dito a mim mesma que era por causa da deficiência que ele não conseguia emitir nenhum som inteligível. Mas procurar desculpas é o mesmo que jogar a toalha. Agir é buscar um jeito. O que posso fazer com isso? Encontrei um ortofonista a 100 km de casa. que primeiro o ensinou a dizer "moto", depois "pai" e "mãe". Podem imaginar minha alegria? Sempre há caminhos. Só precisamos encontrá-los. Então aprendi Makaton, que usa linguagem de sinais. E ele entendeu que os sons que ouvia tinham significado. A seguir, a leitura, que ele aprendeu graças ao método de minha mãe, e que o permitiu conversar. E, à medida que ele tinha progressos físicos, Nicolas também gostava de jogar jogos estereotipados. Ele podia acender e apagar as luzes, acende, apaga, acende, apaga... por horas. Em um centro em que costumava ir, ele se divertia transferindo a água de um copo para o outro por horas, dias, semanas... Lá, um profissional me disse que ele realmente precisava disso. O que posso fazer com isso? Perguntei a mim mesma: necessidade de quê? E tive a melhor ideia de todas, quero dizer, para meu filho, mas acho que para aqueles que têm comportamento autista. Disse a mim mesma que ele tinha que aprender algo com aquela experiência. Então eu ensinei a ele "cheio", "vazio", e os significados de "mais", "menos", "tanto quanto" e "meio". Ele me olhou, e foi isso, ele nunca mais jogou esse jogo. Nós também repetimos experiências, também cometemos erros até entendermos algo, não é? Aquele especialista famoso disse que Nicolas jamais iria para a escola. O que posso fazer com isso? Eu o matriculei na escola. Aos cinco anos, ele ia à pré-escola por duas horas por semana. Por que uma criança com dificuldades precisa de menos horas na escola do que uma criança comum? Nunca entendi esta lógica que continua valendo hoje em dia. Gostaria que alguém me explicasse. Certo dia, ele estava brincando, esforçando-se para colorir um desenho, enquanto a professora conversava comigo. Ela disse que Nicolas nunca entendia ordens. Além disso, ela notou que ele era menos capaz do que outro aluno de 2 anos. Então, Nicolas rabiscou o desenho furiosamente, e amassou o papel. O que posso fazer com isso? Entendi algo essencial. Colocar-me no lugar da criança. Um adulto lhes diz: "Você é incapaz". Como se sentem sobre isso? O verbo "ser" indica uma identidade. Se alguém diz a uma criança que ela é incapaz, este rótulo será inerente a ela. A incapacidade será então uma parte de seu ser mais profundo. E esse rótulo impede a mudança. Isso a programa. Dirá a si mesma que ela é assim, que não pode mudar. Imagine o dano que pode ser causado quando uma criança ouve: "Ele é malcriado!" "Ele é insuportável!" "Ele é tímido!" Imagine o dano que pode ser causado quando se torna adulto, quando repete isso para si mesmo. Você já disse a si mesmo: "Oh, como sou estúpido!"? Para treinar-se a parar de rotular outros, você tem que começar por não rotular a si mesmo. [Sou preguiçoso.] No final do ano letivo, a professora confessou que alguns especialistas lhe disseram para não perder tempo com Nicolas, já que ele nunca aprenderia a ler, escrever ou contar, de qualquer forma. O que posso fazer com isso? Percebi que quando você não acredita em uma criança, especialmente quando ela é frágil, ela não achará recursos dentro de si. [Sonho em voar... És galinha e deve ficar no chão!] Além do mais, isso foi provado por Rosenthal e Jacobson, com o efeito Pigmaleão. Lembram do Dumbo? Ele aprendeu a voar porque os corvos acreditavam que ele poderia fazer isso. Aprendi a ver o potencial das pessoas. Aprendi a acreditar nas habilidades delas. E quando as pessoas percebem a fé que temos nelas, elas fazem milagres! Lembram-se que a professora disse que Nicolas não entendia ordens? O que posso fazer com isso? Eu precisava entender o porquê para ser capaz de ajudá-lo. Ele podia ouvir desde que fez uma cirurgia para a surdez, quando tinha quatro anos. Mas Nicolas não ouvia. Ele lia os lábios e era muito míope, então se a professora estivesse a mais de dois metros, ele não podia entender o que ela dizia. Aprendi a achar a verdadeira razão por trás de um problema, e não apenas aceitá-lo como fato. Aos seis anos, Nicolas foi retirado do sistema escolar. O que posso fazer com isso? Ótimo! Mas também, lá ele só aprendeu que era incapaz. Naquela época, eu ensinava ciências no ensino médio. E me vi em frente a uma criança que não sabia a diferença entre 1, 2 e 3. Que desafio enorme! Aprendi a meditar para encontrar um jeito. E concebi um método incrível para ensinar números e operações, que beneficia crianças até hoje. Aos sete anos, Nicolas foi rejeitado até pelo sistema de educação especial. Felizmente! Porque ele precisava de um jeito diferente. Decidimos educá-lo em casa. Não pense que foi fácil porque sou professora. Para mim, as coisas tem que ir rápido. Quanto tinha 4 anos, eu já sabia ler, aos 16, me formei no ensino médio; aos 18, me casei; aos 19, tive meu primeiro filho; aos 20, consegui uma certificação de professora de matemática; aos 21, outra certificação e o mais alto grau de ensino de matemática. Nada a ver com ensinar uma criança com dificuldades tão extremas! O que posso fazer com isso? Aprendi... a paciência. Aprendi a analisar cada aspecto do aprendizado. Trabalhei para saber em qual nível Nicolas estava, para fazê-lo progredir. É assim que devemos fazer com todos os alunos, certo? Eles estão lá para crescer. Mas quando uma criança tem tantas dificuldades, quando ela não entende, o que fazemos? Podemos dizer a nós mesmos que ela precisa trabalhar isso, ou, pior, que ela é incapaz. Escolhi perguntar a mim mesma: "O que posso fazer com isso?" E considerei isto minha responsabilidade. Sou eu quem tem que descobrir como ensiná-lo. E procurei por estratégias diferentes até ele entender. Então continuei a ensinar Nicolas. Mas quando ele chegou aos 10 anos, percebi que ele não estava mais progredindo em seu entendimento. Eu tentava descobrir os melhores métodos para o aprendizado dele e me senti travada. O que posso fazer com isso? Então saí sozinha em um "motorhome", até perto de Amsterdã. para participar de um workshop Feuerstein. Lá aprendi sobre as 29 funções cognitivas, e isso foi revelador. Elas são os blocos de montar do raciocínio. Se você constrói um casa sem alicerce, o que acontece? Ela não fica em pé! Da mesma forma, para construir o aprendizado, precisamos que as funções cognitivas estejam nos lugares corretos. Melhorei a forma de apresentá-las para que fossem acessíveis mesmo para crianças. É uma ótima ferramenta para se entender a origem dos problemas de aprendizagem. Inclusive me ajudaram com meus outros quatro filhos, que eram precoces. Uma criança precoce raciocina tão rápido que ela nem mesmo sabe como chegou ao resultado. Nem mesmo sabe o que faz para pensar. É comum uma criança precoce ir mal na escola porque se o resultado não aparece imediatamente, ela trava. O que posso fazer com isso? Eu os ajudei a aprender como analisar seus pensamentos de forma que seriam capazes de ter sucesso nos estudos e na vida. Então olhei ao redor, e percebi como as outras crianças estavam distantes de Nicolas. Nicolas não se aproximava das outras crianças porque tinha medo delas. Mantinha uma distância de dois metros delas. O que posso fazer com isso? Falei sobre o assunto com um professor e ele propôs ensinar sobre o autismo a seus alunos. Eles desenvolveram estratégias para se aproximar de Nicolas e envolvê-lo. Aquele ano na quinta série foi o melhor ano dele na escola. No pátio da escola, ele permitiu que os outros se aproximassem dele e o tocassem, e fez muitos amigos. Aprendi que, graças à boa vontade do professor, à informação, e ao preparo, milagres podem acontecer. Vi muitas crianças à minha volta que tinham dificuldades. O que posso fazer com isso? Numa ONG que criei, nós as ajudamos a superar as dificuldades, graças ao método que aprendi e depois aperfeiçoei. Os resultados foram tão incríveis que eu quis beneficiar outros. Mas eu não podia dar conta de todos. Então criei uma companhia chamada "Upbraining", para ter a oportunidade de ensinar pais e especialistas. Criamos ferramentas eficientes para desenvolver as funções cognitivas. Identificamos quais processos de aprendizado eram necessários. O jeito que ensinamos é chamado de "metapedagogia". É um método transversal às pedagogias existentes. Se aplica a todos, inclusive às pessoas sem deficiência. Lembrei que Nicolas tinha problemas para aprender a escrever. Então criamos aplicativos para tablets para aprendizado de como traçar linhas simples, depois letras, fazendo isso de forma divertida. Nicolas também tinha problemas para aprender a reconhecer e lidar com as emoções. O que posso fazer com isso? Criei ferramentas para reconhecer, entender e lidar com emoções, das quais todos podem se beneficiar. Mas inteligência emocional não diz respeito apenas a emoções. Também se trata da habilidade de comunicar da melhor forma possível. Muitas pessoas no espectro autista têm dificuldades nesta área. Mas você não precisa estar no espectro autista para ter dificuldades de comunicação. Em casa, Nicolas não suportava discussões. O que posso fazer com isso? Aprendemos a nos comunicar sem brigas. E criei ferramentas de aprendizado de como se comunicar e de como gerenciar conflitos. Graças à experiência com meu filho, tive a oportunidade de aprender, de criar, e de ajudar outros. Nicolas adora contar, usar o computador, tocar piano, esquiar, cavalgar e conhecer pessoas. Talvez não escolhamos o que nos acontece, mas podemos escolher agir como vítimas, esperando passivamente as coisas acontecerem, ou ser proativos e agir. Nós escolhemos. Podemos fazer isso. Para cada experiência, podemos agir, encontrar um jeito, e aprender algo. Graças a Nicolas e seus irmãos e irmã, minha vida se tornou fascinante. Então, a deficiência? O que posso fazer com isso? Posso dizer: "Sim". E: "Obrigada". (Aplausos)